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Vibradores de diferentes cores, tamanhos e texturas, cremes que esfriavam e esquentavam, com ou sem fricção, roupas íntimas comestíveis dos mais diversos gostos, fantasias femininas e masculinas costuradas com pouquíssimo pano, variadas edições do Kama Sutra, calendários que mostravam imagens picantes, levemente eróticas e completamente pornográficas, ampulhetas preenchidas com líquidos coloridos que borbulhavam quando você as tocava, dvds e mais dvds de filmes eróticos de todos os tipos, livros, revistas, e algo que me perturbou muito:

uma coleção em pop-up de contos de fadas recontados de modo que alguém sempre transava com alguém. Em pop-up!

Escolhi um vibrador simples e prateado com três velocidades. Era modesto, nem muito grande nem muito grosso. Engoli a vergonha e fui até o balcão. A atendente era uma jovem de uns vinte e poucos anos que, sem dúvida, estava muitíssimo acostumada com o trabalho. Informou o preço de modo bastante casual e não me encarou por mais do que dois segundos – o que me deixou muitíssimo agradecida. Mas, ainda assim, era constrangedor. Tratei de me ocupar com os itens ao redor do caixa para evitar olhar na direção da jovem vendedora.

Dei-lhe meu cartão de crédito. Digitei a senha.

– Esse daqui é do mostruário – ela balançou o item fálico no ar. – Vou pegarum na caixa pra você.

– Tudo bem – eu concordei com a cabeça baixa e as mãos ocupadas com osprodutos ao meu alcance. Lembro que estava verificando a encadernação de uma edição particularmente enfeitada de um Kama Sutra enquanto segurava um vibrador longo e azul com sete velocidades e um led que piscava colorido quando a ouvi dizer:

– Ah! Senhor Kioujin! As revistas do senhor estão aqui. Vou buscá-las, só umminuto.

– Tudo bem, Ankie. Não tenho pressa.

A voz masculina e profunda atrás de mim fez com que eu tremesse dos pés à cabeça. Olhei para trás rapidamente e lá estava o meu vizinho oriental. Ele me cumprimentou com um aceno rápido e sorriu. Eu me virei pra ele e sorri timidamente de volta. Ele olhou para as minhas mãos e alargou um sorriso, como se estivesse achando muita, muita graça da situação. Alguma coisa dentro de mim gritou que eu ainda estava segurando um manual de sexo e um pênis de borracha. Voltei a encarar o caixa e ele continuou em seu lugar na fila bem atrás de mim. Eu juro que podia sentir seu sorriso. Levantei os olhos e notei um longo espelho atrás de onde a atendente estava sentada. Ele estava atrás de mim, tinha as mãos entrelaçadas na frente do corpo e um sorriso divertido na boca. Nunca tinha visto esse tipo de sorriso antes. Acho que é como sorriem os homens que encontram suas tímidas vizinhas em um sex shop segurando um guia ilustrado de posições sexuais e um item fálico artificial para ser introduzido na vagina.

Respirei fundo, coloquei os itens de volta nas prateleiras. Ajeitei a alça da bolsa no ombro e fui cuidadosamente em direção à saída. Mais uma vez, ele me cumprimentou com um aceno, enquanto dava um passo à frente na fila. Se a situação permitisse uma conversa de elevador, seu sorriso deixou claro que ele diria algo como “É, garota. A noite vai ser boa, hein?”.

Segui para casa em um estado de torpor robótico e só recuperei o fôlego quando estava novamente na segurança do meu elevador, a poucos segundos da minha casa.

– Bom dia.

Olhei para o lado. Ele tinha os cabelos escuros e lisos caindo até as orelhas.

Era alto e forte e tinha algo estranhamente familiar em sua fisionomia.

– Qual andar? – perguntei, já com a mão no painel.

– Oitavo.

Olhei de volta para ele. O oitavo andar era o meu andar. Ou melhor, meu e do…

– Você é o garoto do Nathan – concluí.

– Quando você diz assim eu sinto como se ainda devesse estar usando fraldas– sorriu. – Mas sim, o Nathan é o meu pai.

– Ah – minha mente ainda estava confusa com o constrangimento no sexshop, mas senti que minha boca estava falando sem minha autorização. – Legal você vir ver o seu pai. Já conhece bem a cidade?

– Um pouco.

– Se precisar de ajuda, qualquer dia. É só avisar.

Senti seus olhos passeando em mim.

– Ah, com certeza – ele afirmou.

Sorri de volta sem muita cordialidade. Tinha a sensação de que algo estava horrivelmente errado. As portas se abriram e eu segui para o meu apartamento.

Assim que tranquei a porta atrás de mim, compreendi o meu problema.

– Filha da puta! – exclamei para mim mesma.Tinha esquecido meu vibrador na loja.

***

Fiquei andando de um lado para o outro esperando o tempo passar. Tinha que ter certeza de que, quando voltasse, não haveria a menor possibilidade do meu vizinho ainda estar lá. Cheguei a pensar em abandonar o meu item recémadquirido. Podia comprar outro, em alguma loja bem longe da vizinhança. Mas a voz de Amadeo estava lá, consumindo minha sanidade, gritando que ele ficaria furioso se eu desistisse diante de um empecilho bobo. Sua voz era tão coerente que eu comecei a ficar com raiva de mim por ter ido embora da loja. Ora, ele também estava lá, não estava? E era um cliente fixo, aparentemente. Eu é que deveria ter rido dele. Não é?

Não… Amadeo suspirou no fundo da minha mente. Você não poderia ter rido dele porque, ao contrário de você, ele não estava com vergonha. Ele não estava nem aí…

Quatro batidas na minha porta e meu coração parou. Levantei do sofá e enfiei a cara no olho mágico. Quem poderia ser?

Claro… Mas é claro… Lá estava o meu vizinho oriental. Que tipo de inferno era esse em que eu tinha me enfiado? Será que ele queria se desculpar por ter rido? Será que queria se desculpar por ter bisbilhotado minha vida? Será que…

… ele quer tirar sua roupa e te jogar na cama como ele viu você fazendo com o Nick?

Ah, cala a boca, Amadeo. Não preciso disso. Não agora.

Certo, Nahia. Afaste-se da porta bem devagar e fique em absoluto silêncio.

Ele vai desistir. Ele vai embora.

– Ahn… – ele estava falando. – Você esqueceu sua sacola na loja. Só passeipra entregar. Não sei se você está aí, então só vou deixá-la aqui na porta, certo?

Ah, ótimo! Um vibrador em uma sacola de sex shop para o filho do Nathan ver. Ótimo.

Fui até a porta, decidida a me livrar dele o mais rápido possível.

Girei a chave.

– Ah! – ele sorriu. – Olá. Acho que você estava com pressa – esticou a sacolaem minha direção.

Fingi que estava falando com a moça do Elite Escorts.

– Obrigada. Posso ser meio atrapalhada – peguei a sacola. Eu não podia dizerque não era minha, podia? Acho que era um pouco tarde para me fazer de desentendida. Talvez colasse antes de eu ter rebolado no pau de um cara enquanto o encarava e piscava para ele… Agora, não mais.

– Sinto muito pelo outro dia – ele continuou. Tinha uma voz doce e um sorrisosensual. Era como se ele estivesse preparando o caminho para algo que inevitavelmente aconteceria. – Não quis… – ele passou as mãos no cabelo. – Ah, diabos, quis sim – sorriu. – Mas foi impossível não olhar.

– Você quer entrar? – perguntei um pouco rápido demais. Como estavavirando tradição na minha vida, ficou claro que ele entendeu errado. Ele entendeu meu convite como algo mais, enquanto tudo que eu queria era que ele parasse de falar sobre sua experiência voyeur no meio do hall.

– Ah, sim. Claro – deu de ombros e eu saí do caminho.

Fechei a porta atrás dele. Era melhor esclarecer logo a situação antes que a coisa toda tomasse o caminho errado.

Que caminho errado, Nahia? Você acha ele gostoso, não acha? Qual o problema?

Ora, cale-se, Amadeo, não quero que ele pense que eu sou uma pervertida.

– Olha… – pus as mãos na cintura e tentei parecer o mais formal que umapessoa podia parecer tendo um vibrador nas mãos. – Obrigada por ter vindo até aqui só pra me devolver isso, mas apreciaria se não conversássemos sobre ontem na frente dos meus vizinhos.

– Nossa, perdão. Claro, claro. Só quis ter certeza que você não tinha ficadoofendida. Se ficou, não foi minha intenção.

– Isso foi um pedido de desculpas?

– Desculpas? – ele sorriu – Não, de forma alguma. Acha que eu devia medesculpar?

– Por estar bisbilhotando minha vida? Talvez… – mantive as mãos na cinturaem uma tentativa de recuperar o controle. Fazê-lo se sentir mal pela sua intrusão era o primeiro passo.

– Estava só olhando pela minha janela. E, se não me engano, você pareciabastante satisfeita.

Como ele ousa? Enchi o peito de ar.

– Tem razão, fiquei ofendida, senhor… senhor…– Kioujin. Pode me chamar de Kio.

– Senhor Kioujin, acho melhor o senhor ir embora.

– Você é muito contraditória, não é?

– Com licença? – perguntei, agressiva, já com a mão na maçaneta.

– Quero dizer: você é tímida. Fica me olhando quando eu ando de toalha pelacasa, mas se esconde quando eu percebo. Aí você transa com o seu amigo me encarando como se fosse eu que estivesse com você na cama e depois sai correndo de um sex shop porque ficou constrangida por eu ter te visto com um Kama Sutra e um vibrador? Aí você me chama pra dentro do seu apartamento porque não quer conversar sobre isso no hall, mas quando eu converso sobre isso, você me manda pra fora. Você não tem dupla personalidade, tem? – sorriu.

– O senhor não me conhece para estar falando comigo com tanta intimidade.

Ele colocou as mãos espalmadas em minha direção em um claro sinal de rendição.

– Foi só uma brincadeira, senhorita…?

Mordi o lábio. Ora, vamos… Não seja infantil.

– Nahia – respondi de qualquer jeito.

– Senhorita Nahia, só quis ter certeza de que não estava ofendida e que não iamorrer sufocada aqui com todas essas cortinas fechadas porque estava com vergonha de mim. Juro solenemente nunca mais observar sua vida. Tudo bem?

Algo dentro de mim estava choramingando.

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Amanda

Amanda

🤪🤪🤪

2023-08-23

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