O Fim do "Apocalipse Zombie"

O Fim do "Apocalipse Zombie"

Capítulo 1: O Eco da Risada no Fim do Mundo

O som não era um grito. Era um ruído seco e úmido, um estalo de osso e um jorro de líquido que manchou para sempre a alma de May Otsuki. Ele via o machado que suas próprias mãos seguravam cravado no crânio daquela que o trouxera ao mundo. Os olhos dela, outrora cheios de uma doçura cansada, agora eram opacos, vidrados, sem um pingo de humanidade. A doença, aquele maldito vírus que transformava pessoas em monstros, levara sua mãe horas antes. Agora, levava a última migalha de sanidade de May.

Ele não chorou. Um riso escapou de seus lábios, um som agudo e quebrado que ecoou na sala silenciosa e sombria. Era um riso de puro desespero, a primeira de muitas piadas de mau gosto que ele faria sobre a morte.

— Você sempre disse que eu ia ser a sua morte, mamãe — sussurrou ele, a voz trêmula. — Que piada… que piada horrível.

Ele deixou o machado cair no chão com um baque metálico. Sem olhar para trás, pegou uma mochila já semi-abastecida e saiu de casa, deixando a porta aberta para o mundo podre entrar.

A cidade era um cadáver em decomposição. O cheiro de morte era tão pesado que dava para sentir o gosto na boca. May, movido por uma energia maníaca que brotava do seu trauma, parecia uma mariposa atraída pela chama do perigo.

— Olha só, galera! Fila única para o abraço grátis! — gritou ele, correndo em direção a um pequeno grupo de zumbis que arrastavam os pés em sua direção. Com uma faca de cozinha em cada mão, ele dançava entre eles, seus movimentos imprevisíveis e cheios de uma agilidade sobrenatural, uma mistura do estilo descontraído de Gojo Satoru com a tendência autodestrutiva de Osamu Dazai.

Foi em um beco, enquanto despachava o último zumbi com um golpe preciso (e desnecessariamente teatral), que ele sentiu uma presença. Não era a presença pesada e animalesca dos mortos-vivos. Era algo mais denso, mais silencioso. Mais perigoso.

May se virou, um sorriso largo e insano ainda estampado no rosto, e o viu.

Era alto, muito alto, talvez 1,95m. Seus cabelos castanhos com longos cachos balançavam suavemente sobre os ombros. A pele era negra como ébano, e seus olhos… eram olhos de lobo, de um amarelo intenso e penetrante que parecia ver através da fachada de loucura de May. O olhar era pesado, calado, carregado de uma dor tão profunda quanto a dele, mas congelada em gelo, não queimando em fogo.

O desconhecido — Matheus Shinu — simplesmente fitou May por um longo momento, sem dizer uma palavra. Seu rosto era uma máscara de impassibilidade. Então, como havia aparecido, ele se virou e começou a sair do beco, seus passos absolutamente silenciosos.

— Ei! Gritinho! — chamou May, sua voz ecoando contra as paredes de concreto. — Nem um "obrigado por limpar o beco"? Que falta de educação!

Matheus nem hesitou. May, sentindo uma faísca de interesse naquele vazio que era o seu peito, decidiu segui-lo. A noite foi passada nas traseiras de um supermercado abandonado. May falou sem parar, contando piadas mórbidas, teorias conspiratórias absurdas e falando sobre doces que ele sentia falta. Matheus permaneceu em silêncio, sentado de costas para a parede, seus olhos de lobo vigilantes, observando May com desconfiança. Ele estava com a guarda alta, seu corpo um fio de aço pronto para se romper.

Ao amanhecer, a discussão veio.

— Você não pode me seguir — a voz de Matheus era surpreendentemente suave, mas firme como pedra. — Eu vou sozinho.

— Tá, mas isso é muito chato! — reclamou May, balançando os pés como uma criança. — Dupla é mais divertido! Além do mais, você é forte. Eu vi. E eu também sou! Água e óleo, nós vamos ser a dupla mais irada do apocalipse!

— Eu não quero uma dupla. Não quero ninguém. Perder pessoas… é uma dor que não vale a pena.

May olhou para ele, e pela primeira vez desde a morte da mãe, seu sorriso desapareceu por um segundo. Ele entendeu. Entendeu perfeitamente.

— Tudo bem — disse May, a voz um pouco mais baixa. — Mas o mundo lá fora é grande e cheio de zumbis. Vamos na mesma direção pelo menos? Prometo não ser um incômodo!… Muito.

Matheus olhou para aqueles olhos animados, que escondiam um abismo de culpa, e algo dentro dele — um instinto de proteção que ele pensava ter matado — cedeu. Ele não disse sim. Mas quando começou a caminhar pela estrada fora da cidade, onde carros abandonados criavam ferrugem, ele não protestou quando May começou a pular e cantarolar ao seu lado.

O dia estava quase acabando quando viram, no meio do nada, uma estrutura improvisada: um barracão de metal ao lado de um prédio baixo e fortificado. Parecia um oásis de ordem no caos.

Foi então que uma voz calma, mas inquestionável, veio de cima.

— Parem aí. Movam-se devagar e mostrem as mãos.

No telhado do barracão, um jovem segurava um rifle com a precisão de um atirador de elite. Seus cabelos eram de um loiro natural e seus olhos, verdes como esmeraldas, os observavam com uma inteligência calculista. Era Andier Benser.

— Uau! Um francês! — exclamou May, ignorando completamente a arma. — Ou é canadense? Tudo bem, nós somos super legais e, o mais importante, vivos!

Andier baixou o rifle, um leve suspiro escapando de seus lábios.

—Kaio, são humanos. Dois jovens. Podemos oferecer abrigo por hoje.

Dentro do bunker, que era na verdade a parte subterrânea do prédio, eles conheceram Kaio Rioko Sumaru. Ruivo, com cabelos longos até o quadril e olhos inteligentes que pareciam catalogar cada detalhe deles em segundos. Sua prótese no braço esquerdo era tão bem feita que realmente era difícil de distinguir.

— Prazer — disse Kaio, com um sotaque leve. — Meu pai era cientista. Este lugar era o laboratório dele.

— Ele estava trabalhando numa cura — explicou Andier, suas duas katanas repousando contra a parega. — Kaio está continuando o trabalho.

— E está quase pronto! — disse Kaio, animado. — Uma amostra está em estágio final de maturação. Dois dias, talvez.

Nos dois dias seguintes, o bunker se tornou um microcosmo do mundo. May quebrava a tensão constante com suas brincadeiras, sempre observado de longe por Matheus, cujos olhos de lobo agora perdiam um pouco da frieza quando pousavam no garoto energético. Em uma noite, durante seu turno de vigia, May sentou-se ao lado de Matheus, que estava olhando para as estrelas através de uma fenda.

— Você não precisa carregar tudo sozinho, sabe? — disse May, sua voz incomumente séria.

Matheus não respondeu, mas não se afastou. Era um começo.

Enquanto isso, a dinâmica entre Kaio e Andier era de uma dança silenciosa. Andier era a sombra protetora de Kaio, sempre presente, sempre atento. Kaio, por sua vez, confiava cegamente no francês, seus olhos verdes seguindo Andier pela sala com uma admiração que beirava algo mais.

— Você deveria descansar, Kaio — disse Andier, trazendo-lhe uma xícara de chá. — Você está há horas nisso.

— Só mais um pouco, Andier. É promissor — Kaio sorriu, e um leve rubor subiu às faces de Andier, que rapidamente se afastou para continuar sua vigilância.

No segundo dia, o que deveria ser um teste de rotina deu horrivelmente errado. Um dos sistemas de contenção de um zumbiu usado para testes falhou. A criatura, mais rápida e agressiva que as outras, se libertou, indo direto para Kaio, que estava distraído com seus frascos.

— KAIO! — O grito de Andier foi de puro terror.

Mas antes que ele pudesse sacar suas katanas, um vulto escuro passou por ele. Matheus, silencioso e mortal como uma sombra, agarrou o zumbi pelos braços, contendo-o com uma força brutal.

— May! — gritou Matheus, sua voz comandando.

— Já tô indo, gritinho! — May, com um sorriso maníaco, pegou um pesado extintor de incêndio e, com um movimento amplo e carregado de adrenalina, atingiu a cabeça da criatura, esmagando-a com um golpe único e eficaz.

A amostra de cura, milagrosamente, estava intacta. Kaio a segurou com mãos trêmulas, respirando fundo. Ele olhou para Andier, depois para May e Matheus.

— Está pronta — ele anunciou, uma centelha de esperança em seus olhos. — É só uma amostra, mas… é um começo.

Naquela noite, enquanto Kaio e Andier conversavam em voz baixa em um canto, um compartilhando o alívio e o outro o medo que sentiu, May se aproximou de Matheus.

— Viu só? — disse May, seu sorriso agora mais genuíno, menos forçado. — Ter alguém não é tão ruim assim.

Matheus olhou para ele, para aquele idiota completo que todo mundo amaria, e pela primeira vez, um micro-sorriso, quase imperceptível, tocou seus lábios.

— Não — ele sussurrou. — Não é.

E no coração do bunker, cercado pela escuridão do mundo exterior, quatro vidas dançavam no fio da navalha, seus destinos agora inextricavelmente ligados pela promessa de uma cura, pela ameaça da morte e pelos primeiros e tímidos fios de um romance que florescia no solo árido do apocalipse.

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