Casamento por Contrato, Amor Nao Incluso
Capítulo 1 — O Sol Me Encontrou Primeiro
> Eu sempre achei que ser feliz é um estado de espírito.
Às vezes vem com um sorriso, às vezes com um café quente.
No meu caso, é quando o sol entra no quarto antes mesmo do despertador tocar.
Acordei com a luz da manhã batendo direto no rosto, atravessando a cortina bege do meu quarto. Eram seis e pouco. O despertador ainda tinha uns bons minutos de descanso, mas o sol sempre me acorda antes.
Levantei devagar, sentindo o chão gelado nos pés, e fui direto pra varanda. Lá de cima, o mundo parecia mais calmo. O mar lá no fundo, os coqueiros balançando com aquele vento gostoso e o cheiro do café subindo de algum lugar... provavelmente do apartamento da minha avó, Dona Maria, que mora no prédio da frente.
Aliás, não existe outro ser humano mais importante que ela.
Acho que eu sou quem sou por causa dela. Sempre firme, sempre doce. Foi quem me ensinou a sorrir nos dias ruins e a levantar quando o mundo empurrava. Ela e o Lucas, meu sobrinho. O maior presente que meu irmão já deu sem querer. O menino tem só cinco anos, mas já tem opinião pra tudo e mais fome do que três adultos juntos.
Sou a Lara. Tenho 25 anos, sou loira, baixinha (com muito orgulho dos meus 1,50), olhos claros, coração leve e cabeça cheia de sonhos — e de contratos.
Dona de uma das maiores redes de academia do Brasil, a Corpo em Dia. Personal trainer, empresária e professora. E mesmo assim, ainda arranjo tempo pra cuidar da pele, dar risada com as minhas amigas e visitar a vovó sempre que dá.
Moro sozinha num apê de dois quartos com suíte, em Maceió. Um dos melhores condomínios da cidade, com piscina, segurança 24h e uma vista que parece de cartão-postal. Meu apartamento é a minha bolha. Cheio de plantinhas, cheirinho de baunilha e música leve tocando o tempo todo.
Mas eu não sou só isso.
Tenho duas amigas que são minha fortaleza. A Julia e a Bianca. Julia trabalha comigo na academia, é minha parceira de treino e de vida. A gente se entende só no olhar. Já a Bianca ainda tá na faculdade — quer ser médica. Ela é mais nova, tem 22, e é o coração em pessoa. Sabe aquele tipo de amiga que manda mensagem só pra dizer "tô com saudade"? Então, é ela.
Enquanto preparava meu shake matinal, escutei o toque do WhatsApp:
[Grupo: As Três Patetas]
👵 Julia: “Vai demorar pra descer, princesa do nordeste?”
👩 Bianca: “Se ela atrasar, eu como o pão de queijo da mochila dela 😒”
Ri sozinha. É nessas horas que eu tenho certeza que a vida vale a pena.
Tomei meu shake, arrumei o cabelo num coque alto, peguei minha garrafinha, conferi a mochila e desci. O porteiro me cumprimentou com aquele sorriso de quem já sabe que eu sou a “menina do sorriso fácil”.
Lá fora, o dia estava radiante. Típico de Maceió. O céu azul, o calor chegando de leve, e aquela sensação boa de que o dia ia render.
Eu entrei no carro com Julia dirigindo e Bianca de passageira, mesmo sem trabalhar na academia.
— Hoje o dia vai ser bom, viu? Tô sentindo! — eu disse, animada.
— Isso me dá medo — Bianca respondeu, rindo — Toda vez que você fala isso, alguma bomba estoura.
Eu gargalhei, sem me preocupar. Eu estava leve. Estava feliz. O mundo podia esperar.
Só que não esperou.
Chegamos na academia com aquele cheiro de limpeza misturado com perfume de eucalipto, música ambiente tocando pop leve, e o pessoal da recepção com aquele “bom dia” ensaiado, mas sincero.
Mas foi só eu entrar na minha sala que a coisa começou a desandar.
A gerente da unidade principal, Marcela, estava sentada na minha mesa, com o notebook aberto e uma cara que eu já conhecia.
— Aconteceu alguma coisa? — perguntei, tirando os óculos escuros.
— Aconteceu sim. A empresa da parceria de roupas e suplementos... rescindiu o contrato.
Pisquei. Respirei. E sentei.
— Como assim? Ontem a gente ainda estava programando o evento de lançamento.
— Pois é. E hoje eles mandaram o jurídico. Dizem que não vão seguir com a parceria. Problemas de logística interna, segundo eles. Mas o que parece mesmo é que conseguiram um contrato com a concorrente.
Fiquei em silêncio por um segundo. Peguei a pasta com os documentos que estavam em cima da mesa.
Nada no mundo dos negócios é certo. Mas eu não estava esperando isso logo hoje, quando eu tava achando que o universo tava me abraçando.
— E agora? — perguntei, respirando fundo.
— Agora a gente precisa de outro parceiro. E rápido. Porque o plano de expansão envolve essa integração de suplemento + vestuário fitness. Se não tiver isso, os novos estúdios perdem parte do conceito.
Era isso. A parte que ninguém vê no Instagram.
Atrás dos vídeos bonitos, do feed todo padronizado, da aula de funcional que termina com palmas, tem isso: cancelamentos, contratos rompidos, decisões emergenciais, reuniões fora de hora e uma mulher de 1,50 precisando segurar uma rede nacional com o próprio braço.
Mas tudo bem. A gente dá um jeito. Eu sempre dou.
— Liga pro jurídico. Pede pra revisar o contrato e ver se a quebra foi legal mesmo. E começa a listar empresas que se encaixam no nosso perfil. Eu quero um novo parceiro fechado até sexta.
— Isso dá três dias, Lara.
— Então começa agora. Eu vou fazer isso funcionar. Nem que eu tenha que vender whey na porta.
Marcela sorriu, aliviada.
Porque ela sabe. Quando eu digo que vai funcionar... vai.
Peguei meu celular e fui direto pra lista de contatos.
Eu conhecia gente. Muita gente. E eu ia fazer esse negócio acontecer.
Mas antes...
Respirei fundo, olhei pela janela da minha sala envidraçada, vi o povo treinando lá embaixo, correndo na esteira, sorrindo com os instrutores...
> O dia ainda podia ser bom.
Só ia dar um pouco mais de
Desci até o térreo depois da conversa com Marcela. Estava com a mente a mil, mas tentando manter o sorriso. Meus alunos não têm culpa das minhas tretas empresariais.
Encontrei Julia na recepção, com o tablet na mão e cara de quem já sabia que o dia tinha virado de cabeça pra baixo.
— Marcela te contou, né? — perguntei, me encostando no balcão.
— Contou. E eu já fiz o que você faria: mandei e-mail pra algumas empresas do setor, aqui e fora do país. Inclusive... — ela virou o tablet pra mim — tem uma que respondeu.
Arqueei uma sobrancelha, surpresa.
— Já? Quem?
— Uma tal de VitalShape México. Nunca ouvi falar, mas eles são gigantes lá fora. Mandaram mensagem dizendo que estavam de olho na expansão da sua marca, e que seria uma honra conversar.
— Que?
Julia riu.
— “A honra é toda nossa”, provavelmente eles esperavam que você dissesse isso.
— E eu vou dizer. — falei, pegando o tablet — Mas como assim empresa mexicana querendo negociar com a Corpo em Dia?
— Globalização, baby — ela piscou — E talvez, sorte.
Ou destino. Ou só mais uma loucura da minha vida.
— E a reunião? Remota?
— Não. Eles querem que você vá até o México. Conhecer a sede, o ambiente, os produtos, tudo. Eles vão bancar passagem e hospedagem.
— Já assim? Sem nem uma call?
— É. Eu também achei rápido demais. Mas eles foram bem diretos. Disseram que pra fechar com alguém como você, o CEO faz questão de conhecer pessoalmente. Segundo eles, “há um conceito por trás da marca que precisa ser compreendido ao vivo”.
— Traduzindo: o bonitão quer me ver de perto.
— Ou ele é só um velho mexicano metódico que gosta de ver o brilho nos olhos do parceiro de negócios. — ela disse, rindo.
— Pior ainda.
Sentei ali mesmo, no sofá da recepção. Peguei o tablet, reli o e-mail umas três vezes. Tava tudo certo: a empresa existia, tinha redes internacionais, uma base sólida no México e unidades na Colômbia, Argentina e até Espanha. Eles estavam em expansão no Brasil e queriam uma marca sólida pra “fusão de imagem e estrutura”.
E ali estava meu nome. Lara Mendes. Destacada.
Queriam negociar comigo.
— Aceita, né? — Julia perguntou, sentando ao meu lado.
— Você duvida?
— Nunca.
Peguei meu celular e respondi o e-mail com toda a elegância que a situação pedia.
Meu espanhol era afiado. Sempre foi. Não precisava de tradutor, nem de ajuda. Conseguia me virar perfeitamente — e até mais do que isso.
Falei com segurança, sem medo, como se fosse minha segunda língua.
Assim que cliquei em "Enviar", senti aquela coisa no peito.
Não era medo.
Era... alguma coisa entre ansiedade e curiosidade.
> Uma viagem. Uma reunião. Uma chance de reconstruir o que parecia perdido.
— Então é isso — eu disse, me levantando — Vou pro México.
— A gente vai, né? — Julia rebateu, com aquele olhar malicioso.
— Claro que vai. Eu não viajo sem minha secretária, minha guia emocional e minha caixa de calmantes natural.
— Ainda bem que você me ama.
— Mais do que amo meu whey de baunilha.
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Alguns dias se passaram. Correria com os contratos, ajustes com o jurídico, reserva de passagem e preparação da apresentação da Corpo em Dia. Tudo nos trinques.
O embarque tava marcado pra quinta. E eu tava tentando me convencer que ia ser só uma reunião. Só uma negociação como tantas outras.
Mas dentro de mim...
Eu sentia que isso não era só mais uma página.
Talvez fosse o começo de outro livro inteiro.
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Atualizado até capítulo 40
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