Paris – dezembro 1819
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A noite estava abafada, o ar carregado de um calor peculiar que se arrastava pelos corredores da mansão Bonnet. Dentro da sala de estar, um grupo de homens se encontrava reunido em torno de uma mesa baixa, onde copos de cristal e garrafas de whisky estavam dispostos com a casualidade típica de quem já havia se familiarizado com a riqueza e o luxo.
Mattheo Bonnet, o filho mais novo da família, estava mais uma vez em seu lugar habitual, um tanto isolado dos demais. Seus irmãos mais velhos estavam em grande conversa, rindo das conquistas da noite anterior, enquanto Mattheo se mantinha distante, seus pensamentos um pouco mais sombrios.
— Eu normalmente vou apenas para beber, não fico com as mulheres do Rêves de Minuit. – Mattheo falou com indiferença, o tom suave, mas firme.
Tomou um gole do whisky, sentindo o líquido escorregar quente pela garganta, enquanto seus irmãos mais velhos, Mark e Henri, riam de maneira debochada. Todos, exceto Nicolas. O único que não parecia compartilhar da diversão era Nicolas, o mais velho, e o único casado e, o mais sério do grupo. Ele mantinha os olhos fixos em sua esposa, Chloé, que conversava animadamente com Annabelle, a caçula dos Bonnet, do outro lado da sala.
— Vocês riem? Mas se lembram que têm irmãs? – Mattheo acrescentou, com um tom sério. As risadas se dissiparam instantaneamente, e o ambiente, que antes estava repleto de descontração, começou a se tornar mais tenso. A observação causou desconforto imediato entre os irmãos. Eles olharam um para o outro, incomodados com a provocação.
Mattheo se inclinou um pouco para frente, deixando seu olhar se arrastar pelos irmãos mais velhos. Ele queria que compreendessem, ou pelo menos refletissem sobre o que havia de errado no comportamento deles.
— Gostariam que elas fossem tratadas como vocês tratam as pobres moças do Rêves? – Ele encarou os mais velhos, que, sem palavras, tentaram desviar o olhar.
A sala caiu em silêncio. Os risos haviam se apagado como uma chama que se extingue no escuro. Henri e Oliver – os que mais frequentavam o Rêves – trocaram olhares rápidos, desconfortáveis. Eles sabiam que, de certa forma, Mattheo tinha razão. E, ao mesmo tempo, sabiam que essa conversa nunca aconteceria se não fosse por ele, o mais novo dos Bonnet, sempre tão diferente dos outros, sempre questionando, sempre desconstruindo o que os mais velhos achavam ser natural.
Lohan, no entanto, permaneceu quieto por um momento, como se estivesse ponderando as palavras do irmão. Ele não era o tipo de homem que tomava decisões impulsivas. Era calculista, ponderado. E, mais importante, sabia muito bem o que significava ser responsável pela honra da família. Ele levantou os olhou para Mattheo com seriedade.
— Você deve entender também que o que fazemos não é algo para ser julgado sem saber. A vida do homem não é simples como a de uma mulher, e o mundo em que vivemos exige certos comportamentos. O Rêves de Minuit... não é o nosso mundo, é outro, e você sabe disso. – Disse Lohan, um dos gêmeos.
Mattheo olhou para Lohan, seu irmão mais velho, e percebeu o conflito interno que ele estava enfrentando. Ele não era tão ingênuo a ponto de não saber que os Bonnet, com suas riquezas e poder, tinham seus próprios caminhos, mas a verdade não podia ser ignorada: tudo o que eles faziam tinha consequências. E mais tarde ou mais cedo, as mulheres ao redor deles também seriam afetadas por essas escolhas.
— Eu sei, Lohan. – Mattheo respondeu, sua voz mais suave agora. Ele ainda não se levantara, seus ombros ainda tensos, mas sua expressão era firme. — Mas o que quero dizer é que o simples fato de tratarmos as mulheres do Rêves como objetos descartáveis não faz de nós homens melhores, apenas mais arrogantes. E se nos esquecermos disso, um dia pode ser tarde demais para corrigir. Não estou pedindo que mudem, sei que nós temos nossas necessidades, mas poderiam pensar um pouco que seja não possas com quem dormem no Rêves, o Yohann mesmo. – Mattheo olhou seriamente para o gêmeo de Lohan. — Você sabe o que a Butterfly sente por Serpent, e lhe dá esperança que ela é especial pra você, que vai desposa-la.
O silêncio se arrastou por mais alguns instantes, e a conversa na sala pareceu ter parado por completo, como se todos estivessem absorvendo o peso das palavras de Mattheo. Anna, que antes estava ocupada com sua conversa com Chloé, lançou um olhar atento para o irmão – que chamara sua atenção e de Chloé ao exaltar a voz –, impressionada, mas também incomodada. Ela conhecia Mattheo o suficiente para saber que ele falava de coração. Nicolas foi o primeiro a quebrar o silêncio novamente, seus olhos mais suaves agora, como se tivesse chegado a uma conclusão. Ele olhou para seus irmãos mais novos e, com um suspiro, falou:
— Talvez você tenha razão, Mattheo. Talvez seja hora de refletirmos sobre o que fazemos e como nossas escolhas afetam os outros. Vamos conversar mais sobre isso depois. Mas agora, vamos mudar de assunto. Nos exaltamos um pouco, Anna e Chloé podem acabar escutando.
Mattheo assentiu. Enquanto ele tomava mais um gole do whisky, seus olhos se perderam na distância, observando ao redor. A luta pela honra e pelas escolhas certas estava longe de ser resolvida, mas ele sabia que, aos poucos, as sementes da mudança estavam sendo plantadas. E, por mais difícil que fosse, ele estava pronto para continuar a luta.
— De que clube eles falam? – Annabelle perguntou a Chloé, sua cunhada.
— O Clube Rêves de Minuit. – Respondeu em um sussurro, olhando os cunhados e o marido conversarem.
Chloé Bonnet - nascida Aubinet - se casará com o irmão mais velho de Annabelle, Nicolas Bonnet, a pouco mais de um ano. Chloé era uma mulher muito bela, seus cabelos loiros-mel, e olhos azuis, tinha estatura mediana, era um pouco mais alta que Annabelle. Usava sempre vestidos em tons claros, a maioria em tons pasteis, o que a deixava ainda mais bela. Chloé era sem dúvidas sua cunhada preferida. A loira era simpática e inteligente, e sempre falava uma coisa ou outra que sua mãe não lhe contava, eram de fato boas amigas.
— É um clube onde as mulheres usam pouca vestimenta e máscara para se encontrarem com homens e preservar suas identidades. Bom, pelo que ouvi os homens também usam máscaras, mas usam ternos com a mesma coloração de suas máscaras e os que usam orelha de animais são aqueles mais cobiçados e experientes, todos distintos. – Chloé evitou dar um gritinho. — Deve ser deveras excitante.
— Nicolas frequenta esse clube? – A ruiva perguntou, era curiosa demais.
— Por Deus, não! Ele sempre está em casa à noite… – A loira corou repentinamente. — Está sempre ocupado. – Se abanou com a mão. — Com toda certeza frequentava, antes de nos casarmos, claro. Em outro tempo, talvez tenha frequentado, mas agora tenho certeza que não
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Atualizado até capítulo 25
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