🔴A Noite da Lua de Sangue🔴
Em uma pequena vila de Morlóvia, esquecida pelas eras e envolta em densas sombras de montanhas enevoadas, os moradores de Kelyla se preparavam para uma noite que, de acordo com as mais antigas lendas, era temida por todas as gerações: a chegada da lua de sangue.
Os anciãos falavam desse evento como se fosse uma tempestade inevitável, algo que trazia terror profundo, capaz de silenciar até os corajosos Lycans.
Era quando o sobrenatural se mesclaria com o real, e as fronteiras entre os vivos e os mortos seriam apagadas.
A noite anterior à lua de sangue sempre despertava histórias antigas, contadas ao redor de fogueiras apressadamente apagadas logo após o último suspiro das palavras.
Diziam que, em tempos imemoriais, um feiticeiro havia selado um pacto nefasto com uma entidade das sombras, oferecendo o sangue de sua linhagem pelos dons da imortalidade.
O sacrifício era devastador, culminando em mortes traumáticas e na condenação eterna da vila.
Desde então, a cada lua vermelha e tempestuosa, essa maldição voltava para cobrar mais almas, como um pagamento sem fim de uma dívida que ninguém ousava esquecer.
A jovem Marjara, no entanto, sempre foi diferente. Ela não temia as histórias e acreditava que eram apenas isso: meros contos para amedrontar os desavisados e conservar a ordem.
Filha de uma poderosa bruxa cujo nome era sussurrado com reverência e temor, Marjara era feita de outra fibra. Armando-se com um livro antigo de feitiços e sua lanterna de luz rubra, ela decidiu enfrentar de peito erguido o que muitos evitavam.
Isso lhe custaria mais do que ela poderia prever.
Naquela noite, sob uma lua tingida de um vermelho quase vivo, Marjara encontrou-se diante de um altar esquecido pelo tempo, estranho e coberto de runas que pulsavam sob o brilho da lua.
O frio que percorreu seu corpo e os sussurros das sombras anunciavam sua chegada.
As histórias eram reais, mas a jovem bruxa estava determinada a desafiá-las.
Recitando palavras arcanas como havia aprendido, sua voz ecoou na floresta sombria.
Mas ela não estava só.
Dos rastros da escuridão, uma criatura ergueu-se diante dela.
Rugindo não apenas ódio, mas uma ligação profunda, revelada em uma frase que faria sua espinha gelar: "Você ousa desafiar o pacto? Só porque carrega meu sangue em suas malditas veias?"
Este foi o momento em que Marjara compreendeu o seu destino. O sangue do maldito feiticeiro fluía nela, e a própria entidade estava diante de seus olhos.
Seu triunfo não era garantido, mas armada de forças que ela nem sabia possuir, lançou o feitiço final, selando o destino da criatura e purificando os céus de Kelyla.
Por um breve instante, Marjara foi saudada como uma heroína.
A vila acreditou que ela havia quebrado a maldição e, por um tempo, a paz prevaleceu.
Mas a ingratidão, traição silenciosa que rasteja nas entrelinhas da história humana e sobrenatural, viria a cobrar seu preço.
Poucos anos após sua bravura, aqueles que antes a aplaudiam passaram a vê-la como uma ameaça.
A lua de sangue, tão antiga e implacável, teria o seu retorno, e a narrativa da destruição precisaria de um novo culpado.
Marjara, a salvadora, foi traída por aqueles que ela havia protegido. Condenada pela superstição e pelo medo, ela foi levada à fogueira, uma prática cruel adotada até mesmo pelos seres sobrenaturais.
Os Lycans, que haviam se beneficiado de sua coragem, agora acreditavam que ela representava uma maldição.
Eles a queimaram na segunda lua de sangue, na ingênua crença de que eliminando a bruxa, restaurariam sua antiga glória perante os demais sobrenaturais.
Às vezes, as criaturas que mais ajudamos são as que mais nos decepcionam. A lição de Marjara ficou marcada como ironia cruel nos corações da vila que ela salvou, um lembrete dolorido de que nem todo heroísmo é reconhecido e que a gratidão é, muitas vezes, efêmera diante do medo.
O que ninguém poderia ter previsto sobre Marjara, contudo, era sua verdadeira natureza. Sob a fachada de jovem bruxa destemida, ela carregava em suas veias algo muito mais profundo e devastador: ela era uma híbrida, filha de duas criaturas místicas rivais.
Sua mãe, uma poderosa Lycan com raízes ancestrais que remontavam ao princípio das noites escuras, havia rompido a ordem natural ao se entregar ao amor perigoso e proibido por um vampiro original.
Esse amor condenara Marjara desde o nascimento a carregar dentro de si a dualidade de duas raças inimigas.
Mesmo após sua execução brutal, que deveria ter extinguido seu corpo e alma, o sangue híbrido de Marjara clamava por vingança.
O sacrifício feito na fogueira, longe de a destruir, ativou uma fúria ancestral presa dentro dela.
Quando a segunda lua de sangue retornou, uma força incontrolável trouxe-a de volta à vida, e com ela, a sede por justiça e sangue se intensificou. Sua morte não a libertou do sofrimento, mas a transformou em algo muito além de uma bruxa ou uma mistura de Lycan e vampiro.
Ela era agora um espírito vingativo, uma força implacável que se elevava sobre a alcatéia Lycan.
A partir daquele momento, toda lua de sangue trazia não apenas a lembrança amarga de sua traição, mas também a morte certa para os Lycans que antes a haviam condenado.
A cada renascer da lua vermelha, Marjara caçava, destrinchava e derramava o sangue da alcatéia, sem piedade, sem remorso.
Apenas os filhotes eram poupados, crias inocentes que ainda não haviam sido corrompidas pela crueldade de seus ancestrais. Contudo, essa era uma misericórdia temporária. Todos sabiam que o dia da justiça chegaria, e nem os filhotes estariam a salvo quando a sede de vingança de Marjara finalmente se saciasse.
A pergunta que ecoava nas montanhas de Kelyla e nas florestas assombradas era sempre a mesma: até quando?
Até quando Marjara prosseguiria com essa caçada sangrenta?
Até quando sua ira continuaria a consumir seus inimigos, repetindo esse ciclo de violência a cada lua de sangue?
A resposta permanecia incerta, tão nebulosa e aterrorizante quanto a própria lua vermelha.
O único indício que restava era que a vingança de Marjara só cessaria quando a última gota de injustiça fosse derramada, quando sua dor ancestral fosse totalmente aplacada.
Mas até lá, a lua de sangue continuaria a nascer, trazendo consigo a sombra da morte e o flagelo de uma híbrida invencível.
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Atualizado até capítulo 55
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