Coragem Ana!
O corredor estava tranquilo, com o som das vassouras ecoando nas paredes de pedra. Ana varria com cuidado, perdida em seus pensamentos, quando ouviu a voz firme de sua avó Dandara ecoar pela casa.
— Ana, venha para a cozinha! O príncipe Felipe chegou com os soldados de uma caçada e quer comemorar.
Ana ergueu a cabeça, sentindo o peso da noite de trabalho que se aproximava. Ela suspirou, ajeitando a vassoura.
— Sim, vó, já estou indo. Parece que teremos muito serviço essa noite.
Ao entrar na cozinha, o cheiro de ervas e temperos já dominava o ar. O ambiente era um turbilhão de atividades: várias mulheres trabalhavam apressadamente, cortando, mexendo e assando, enquanto o chefe de cozinha, Alceu, dava instruções com sua voz autoritária.
— Ana, coloque esses temperos naquela panela — disse ele, sem sequer olhar para ela.
Ana seguiu as instruções com precisão, sabendo que sua habilidade na cozinha a mantinha afastada das tarefas mais ingratas. Sua amiga Lina, que havia acabado de servir os pratos, aproximou-se com uma expressão desconfortável.
— Aqueles soldados são uns nojentos, Ana. Por favor, vai servir eles no meu lugar — sussurrou Lina, com os olhos implorando.
Ana hesitou, olhando para o senhor Alceu, que ainda precisava de sua ajuda na cozinha. “Por ser a melhor ajudando o senhor Alceu, eu me livro desses infortúnios”, pensou, “mas fico com dó de Lina, ela é tão fofa e meiga.”
Antes que pudesse responder, a voz severa de sua avó cortou o ar.
— Ei, deixe minha neta trabalhar! Eles estão pedindo mais vinho, vá servir para eles — ordenou Dandara, rígida.
Ana engoliu em seco e fez o que foi mandada. No salão principal, a atmosfera era completamente diferente. A luz das tochas refletia nos móveis de madeira maciça e nos rostos animados dos soldados. Dalila, com seu sorriso encantador, tentava flertar com o general Herbert, mas ele parecia indiferente, seus olhos fixos na jovem Lina, que agora, com apenas 15 anos, já atraía olhares por sua beleza e doçura.
— Ei, moça, quero que você me sirva — ordenou o general com uma postura imponente, seus olhos perscrutando Lina.
Lina caminhou até ele, tentando manter a compostura, mas a ansiedade era palpável em seus movimentos rígidos.
— A jovem tem olhos tão bonitos, quero que olhe para mim — disse Herbert, sua voz suavizando.
Lina começou a soluçar involuntariamente, tentando segurar as lágrimas que ameaçavam cair.
— Senhor, e-eu… — ela gaguejou.
— Vai tomar uma água — disse o general, desconcertado com a reação dela.
De volta à cozinha, Dalila, com uma expressão de desdém, se aproximou de Lina, suas palavras carregadas de veneno.
— Não quero te ver de volta ao salão, fica se insinuando para o general Herbert.
Lina, aliviada por ser dispensada, mas irritada com as insinuações, baixou a cabeça, mordendo os lábios para não responder. Já tarde da noite, quando a casa estava silenciosa e a lua alta no céu, Ana estava em seu pequeno quarto, escuro e apertado, quando sua avó Dandara entrou, sentando-se ao lado dela na cama de palha.
— Ana, você já tem 17 anos e é o meu anjo. Sempre me ajudando... Eu só lhe desejo o melhor — Dandara começou, sua voz carregada de preocupação.
Ana entendeu o que sua avó queria dizer, mas sorriu para tranquilizá-la.
— Não se preocupe, vó. Estou feliz com a vida que tenho, sem problemas nem incertezas. Não penso que o casamento seja uma necessidade. Vamos viver nossas vidas da melhor forma possível.
Na manhã seguinte, enquanto varria as folhas caídas em frente ao castelo, Lina apareceu ao seu lado, ainda nervosa pelos acontecimentos da noite anterior.
— E pensar que é ela a oferecida — disse Lina, furiosa.
Ana olhou para a amiga, uma preocupação suave em seu olhar.
— Quais são seus planos para o futuro, Lina?
— Eu gostaria de me apaixonar, viver um grande amor! — respondeu Lina, com os olhos brilhando.
Ana, porém, ficou em silêncio, lembrando-se de sua própria mãe, uma mulher que havia sido destruída por um amor que não deu certo. A imagem da mãe, sempre amarga e cheia de desprezo, ainda assombrava suas memórias.
— Ah, não, Ana, me ajude! O general Herbert está vindo para cá. O que eu faço? — Lina se encolheu, desesperada.
O general Herbert era conhecido por sua crueldade, mas também por seu excelente comando das tropas. Ana pensou rápido e respondeu:
— Corre para longe. Eu sei o que dizer se ele perguntar por você.
Lina obedeceu, desaparecendo entre as árvores, enquanto o general Herbert chegava, com o cenho franzido.
— Aquela moça é muito grosseira, saiu correndo ao me ver — comentou ele, intrigado.
Ana inclinou a cabeça, humildemente.
— Me desculpe, senhor. Ela já estava reclamando de dor de barriga antes de sua chegada.
Herbert a olhou por um momento, desconcertado.
— Ah, entendi. Ela sempre é assim?
— Sim, senhor — respondeu Ana, com um olhar de pena ensaiado. — Ela passa por muitos momentos constrangedores, a pobrezinha.
O general ficou visivelmente desconfortável com a situação.
— Tudo bem. Com sua licença — disse ele, antes de se afastar.
Ana voltou ao seu trabalho, satisfeita por ter protegido Lina. “Ela ficará em paz por um tempo”, pensou.
Mais tarde, junto ao rio, as mulheres lavavam roupas, o sol brilhando sobre elas enquanto conversavam. Zélia, desanimada, comentou: — Hoje ainda teremos muito serviço, pois ainda haverá festa.
Dalila, sempre pronta para contradizer, rebateu: — Eu gosto de estar na presença dos soldados. O pior é ter que fazer este trabalho aqui.
Zélia resmungou, irritada.
— Fala isso, mas sempre fica de corpo mole.
Carmen, que adorava um drama, sussurrou animada: — Nossa, vai começar uma briga!
Dalila se exaltou, pronta para responder, mas Ana, sempre conciliadora, interveio.
— Senhora Zélia, não vale a pena. Seja superior — disse Ana, calma.
Zélia bufou, mas recuou. Ana, rapidamente, mudou de assunto.
— Ouvi dizer que o circo está para se apresentar na cidade.
As mulheres logo se animaram, esquecendo a discussão.
— Onde ouviu isso? — perguntou Selena, curiosa.
— No mercado, outro dia, quando fui comprar mantimentos.
O clima entre elas se aliviou, e até Carmen, apesar de gostar de um conflito, não pôde deixar de admitir que Ana tinha um jeito especial de apaziguar as tensões. Mesmo que, às vezes, ela fosse considerada chata por isso.
***Faça o download do NovelToon para desfrutar de uma experiência de leitura melhor!***
Atualizado até capítulo 79
Comments
Rosania Silva Freitas
o começo a gente demora a pegar o jeito da história mas já dá para perceber que a garota e esperta
2023-04-04
8