Meu coração acelerava a cada segundo que Trevor demorava. O quarto silencioso parecia menor, como se o ar estivesse sendo sugado pela angústia que me consumia. Muron organizava algumas ervas sobre uma bandeja de madeira, mas meus olhos não desgrudavam da porta. Eu precisava de respostas. Precisava saber se o bebê ainda estava bem.
Quando Trevor finalmente entrou, o alívio bateu de encontro ao peito, mas não foi o suficiente para dissipar o medo que me corroía por dentro.
— Desculpa a demora… — disse, ofegante. — Iasmin teve dificuldade em encontrar algumas das ervas que Muron pediu.
— Mesmo assim, obrigado, Trevor. — Muron pegou as ervas de suas mãos, já concentrado.
Trevor se aproximou devagar, seus olhos analisando meu rosto com preocupação.
— Você está se sentindo melhor, meu amor? — murmurou, acariciando meus cabelos com tanta delicadeza que quase me desmanchei.
— A dor física está suportável… mas o que está me matando é o que não sei. — minhas palavras saíram trêmulas. — O que está acontecendo com o nosso bebê?
Muron se aproximou com um aparelho nas mãos, e sua expressão grave fez meu estômago revirar.
— Agora que Trevor está aqui, precisamos conversar. — sua voz cortou o ar como uma lâmina.
Ele ligou o ultrassom e apontou para a tela. A imagem borrada começou a se formar sob o gel frio que ele espalhou em meu abdômen.
— Aqui está seu estômago… estes são os rins, e aqui, o pâncreas. Observe — ele circulou uma área com o dedo — seus órgãos estão comprimidos… comprometidos. O sangramento que você teve foi causado pela ruptura de vários vasos sanguíneos. Felizmente, sua capacidade regenerativa conteve algo pior.
Senti a mão de Trevor apertar a minha. Eu não queria ouvir o restante. Mas precisava.
— Mas… então por que você disse que eu teria que tomar uma decisão?
Muron me fitou com os olhos sérios, pesados.
— Porque, Sophie, o feto está te matando. Literalmente. Seu corpo está entrando em colapso. A falência dos órgãos já começou.
Senti meu peito gelar.
— Lembra quando mencionei que parecia que o bebê estava drenando algo de você?
— Sim, eu lembro… — sussurrei, com a garganta seca.
— Pois bem. Não é só energia. Ele está consumindo sua força vital. Seu coração está sobrecarregado, seu sangue está fraco… você está severamente anêmica. Pela lógica, era para você estar desmaiada — mas você continua lutando. O que é, no mínimo, um milagre.
Trevor se inclinou, ainda segurando minha mão com força. Sua testa encostou na minha por um segundo, como se quisesse me passar força pelo toque.
— E qual é exatamente essa decisão que ela precisa tomar? — sua voz saiu tensa, carregada de medo.
Muron respirou fundo antes de responder.
— Ela terá que escolher: continuar com a gestação e colocar a própria vida em risco… ou interrompê-la agora. Um parto neste momento seria fatal. O feto tem apenas cinco meses. Não sobreviveria.
O mundo parou por um instante.
— Não. Eu não ouvi isso direito… — minha voz tremeu. — Eu não vou tirar meu filho. Não posso. Não quero.
Virei o rosto para Trevor, desesperada, buscando nos olhos dele qualquer centelha de alternativa. Mas ele estava estático. Silencioso. Perdido em pensamentos que eu não conseguia alcançar.
— Deve haver outra forma… — insisti, implorando com o olhar.
— Sophie… — Muron sussurrou com pesar — …não há. Eu sinto muito.
Trevor finalmente se pronunciou, sua voz grave e densa:
— Se ela continuar com a gestação… o que pode acontecer?
Muron não hesitou:
— Diversas complicações podem surgir… — murmurou Muron com seriedade. — Os órgãos dela podem falhar completamente. O feto está drenando a força vital da Sophie, crescendo num ritmo anormal. Se continuar assim, o útero pode não suportar e se romper.
— Eu já disse que não vou interromper. — minha voz saiu firme, sem hesitação. — Minha decisão está tomada.
— Meu amor… — Trevor sussurrou com os olhos marejados. — Eu não vou aguentar te perder outra vez.
Voltei-me para ele com um sorriso sereno, mesmo que por dentro estivesse uma tempestade.
— Você não vai. Eu sei que consigo levar até o fim… meu corpo está se regenerando, vou aguentar.
— É justamente aí que eu queria chegar, Sophie. — Muron interveio, preocupado. — Com o feto drenando suas forças, temo que chegue um momento em que seus poderes simplesmente… parem de funcionar.
Fechei os olhos por um instante, mordendo os lábios com força. O silêncio pesou.
— Eu dou um jeito. Não importa o que aconteça. Eu e o bebê vamos ficar bem.
Muron desviou o olhar para Trevor, como se esperasse que ele assumisse o controle. E ele o fez.
— Se essa é a decisão dela, Muron… então eu vou apoiá-la. — disse Trevor com voz baixa, mas firme. — Com uma única condição, Sophie.
— Qual?
— Se em algum momento eu perceber que você está fraca demais, que está perdendo a consciência ou se o menor sinal de colapso aparecer… nós vamos fazer o parto. Sem discussão. — ele segurou meu olhar com os dele. — Sem objeções, ok?
Suspirei fundo, sentindo o peso da decisão cair sobre meu peito como um cobertor frio.
— Fazer o quê? Parece que eu não tenho muita escolha, não é?
Ele me puxou para perto e depositou um beijo na minha testa.
— Eu só não quero te perder de novo, querida. — sussurrou, com o rosto escondido no meu pescoço. — Você é muito mais importante do que imagina.
— Se essa é a escolha de vocês, não há muito o que eu possa fazer. — disse Muron, entregando-me um pequeno pacote com ervas. — Tome isso todos os dias pela manhã. Acredito que possa te dar mais vigor.
— Obrigada. Eu vou tomar.
✧
Saímos da casa e caminhamos até o carro. Trevor dirigiu todo o caminho em silêncio, imerso em seus próprios pensamentos. O modo como mantinha os olhos fixos na estrada me deixava inquieta. Eu sabia que ele estava preocupado, mas... algo mais pesava em seu silêncio.
Quando estacionamos em frente à casa, ele não se moveu. Permanecia com as mãos firmes no volante, os ombros tensos.
— Trevor… eu sei que está preocupado, e… — comecei a dizer, mas ele me interrompeu.
— Não é só preocupação, Sophie. — sua voz falhou por um segundo, e quando me encarou, havia medo em cada traço do seu rosto. — Eu nunca estive tão apavorado com a possibilidade de perder alguém… como estou com você.
— Você não vai me perder, Trevor. — tentei sorrir, mas a dor em seu olhar me fez querer chorar.
Um táxi parou logo à nossa frente. Ele virou-se novamente para mim, os olhos opacos.
— Você vai contar à sua mãe o que está acontecendo. A decisão foi toda sua.
Assenti levemente.
— Eu vou conversar com ela. Mas… não quero que isso consuma você. — toquei sua mão, tentando trazê-lo de volta a mim. — Vamos seguir com tudo como planejamos. Nosso casamento é depois de amanhã e eu quero que tudo seja perfeito.
Ele riu, mas sem humor.
— E até lá você espera que eu fique tranquilo?
— Sim. Depois do casamento eu converso com minha mãe e contamos aos outros. Até lá, isso fica entre nós. Por favor.
Trevor respirou fundo, mas assentiu.
— Como quiser. Preciso resolver umas coisas. Mais tarde eu volto pra te ver. — ele se aproximou e beijou minha testa com ternura. — Cuida de você.
— Pode deixar.
Desci do carro e, ao longe, vi Ágata vindo em nossa direção. Trevor não esperou. Apenas arrancou com o carro, deixando um rastro de silêncio no ar.
— O que ele tem? — ela perguntou, franzindo o cenho.
— Está só preocupado com os preparativos. Nada demais. — abracei-a, escondendo a verdade por trás do meu sorriso.
— Resolvi tudo. Agora posso ficar de vez em MistFalls.
— Que bom, irmã. Já estava com saudade. Dois meses fora é tempo demais.
— Vamos entrar. Trouxe algumas coisas pro meu sobrinho.
✧
Já no quarto, Ágata desfazia as malas com empolgação enquanto eu a observava em silêncio, sentada na beirada da cama. O quarto parecia menor com a presença dela — talvez fosse o peso das verdades que eu precisava dividir.
— Achei sua mãe muito preocupada. O que aconteceu enquanto eu estive fora?
— Hoje de manhã eu tive um pequeno sangramento, mas está tudo bem agora.
Ela parou, me encarando com seriedade.
— Sophie… não me esconda nada. Primeiro Trevor, agora sua mãe. Tem algo errado. Fala logo.
Respirei fundo. O nó na garganta apertava.
— Se eu te contar, promete não contar a ninguém? Pelo menos até depois do casamento?
Ela se sentou ao meu lado e pegou minha mão com delicadeza.
— Eu prometo. Agora fala. Estou aqui.
Conto tudo a Ágata. Cada detalhe, cada incerteza. Ela escuta em silêncio, os olhos fixos nos meus, sem pronunciar uma única palavra. Apenas absorve — como se não quisesse interferir até o fim.
— Eu sei que consigo… — respiro fundo, sentindo o peso da minha própria convicção. — E se acontecer alguma coisa, você e Sarah podem lançar um feitiço para me trazer de volta, certo?
Ágata balança a cabeça lentamente, o olhar tingido de pesar.
— Sophie… pelo que você me contou e pelas experiências que viveu… acho que não funcionaria.
Sua resposta ecoa em mim como um veredito.
— Então essa… não é uma solução viável. Azrael também não pode me ajudar, ele não possui mais o dom da vida.
Inclino a cabeça, olhando para minhas próprias mãos, vazias de poder e alternativas.
— É isso, então… estou sem opções.
— Eu sinto muito por não poder fazer mais. — Ágata abaixa os olhos, visivelmente tocada.
— Então me promete uma coisa. — minha voz falha, e levo um segundo para conseguir encará-la. — Se eu não conseguir… você vai cuidar dele. Como se fosse seu.
— Sophie, não fala assim… — ela sussurra, o tom quebrado.
— Promete! — insisto, meu coração se partindo entre amor e medo.
Ela fecha os olhos por um instante, e o silêncio que paira carrega mais do que palavras jamais conseguiriam expressar.
— Tudo bem… eu prometo. Prometo cuidar do seu filho como se fosse meu.
Sorrio com ternura, lutando para conter as lágrimas que ardem nos cantos dos olhos. Me aproximo e a envolvo num abraço apertado.
— Obrigada, irmã. Eu amo você.
— Eu também te amo… mas, por favor, não pense assim. Ainda há esperança. — ela me segura pelos ombros, como quem tenta ancorar alguém à beira do abismo.
— Vai ficar tudo bem — sussurro, mais para mim mesma do que para ela. — Vai sim… tudo vai sair perfeito.
Mesmo que eu não esteja mais aqui para ver.
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Atualizado até capítulo 85
Comments
Sara Niziato
posha com a visão da Luara tá ficando difícil... mas ela é a pronta né não dá pra deixar ela morrer please!
2025-04-02
0
Silvia Araújo
nem ela,nem o bebê não pode morrer, por favor
2022-11-08
3
Débora Ramos
acho q o certo não seria a morte de Sophia até pq ela q da vida a história
2022-04-26
4