Porém, o silêncio não durou muito mais. Quando terminamos a refeição e Emily recolhia as louças, esperei que o Sr. Fairchild me dispensasse. Mas não, claro que não.
— Me acompanhe até a biblioteca, Srta. Wilson. — disse ele, quebrando o silêncio.
Senti o coração acelerar dentro do peito, mas me esforcei para não demonstrar nada. Ou, pelo menos, achei que não. Segui-o em passos contidos até a biblioteca.
O ambiente parecia tirado de outro tempo. As paredes eram revestidas de madeira escura e polida, cobertas por prateleiras que se erguiam até o teto, repletas de volumes encadernados em couro e tecidos envelhecidos. Entre eles, obras mais recentes se destacavam, contrastando com os clássicos — era como se o passado e o presente coabitassem em perfeita harmonia. Um lustre de cristal moderno pendia do teto, lançando reflexos dourados sobre os móveis, enquanto duas altas janelas de vidro deixavam entrar a luz prateada da lua. No centro, um tapete persa cobria o chão de mármore, e duas poltronas de couro preto, de linhas sóbrias e contemporâneas, ladeavam uma mesa baixa de madeira maciça. Havia, ainda, um globo antigo de metal escuro e uma escultura abstrata de aço, em contraste com os detalhes clássicos. Aquele espaço exalava sofisticação, mas também imponha respeito.
— Vou deixar a porta aberta... para que se sinta mais segura. — disse ele, fitando-me com intensidade. — Posso ver o desespero em seus olhos, Lia.
A respiração me falhou por um instante.
— Sente medo de mim? — perguntou.
Ainda que fosse verdade, neguei. O tom frio, a curiosidade insistente e a arrogância autoritária de suas palavras me intimidavam profundamente.
— Não, senhor. Não sinto medo algum.
Ele arqueou uma sobrancelha, cético.
— Não me parece tão convicta, Lia.
Sentei-me numa das poltronas de couro no centro da biblioteca, tentando aparentar calma.
— O que quer de mim, senhor? Eu não entendo a pretensão que o senhor tem com tudo isso. — perguntei, sustentando o olhar.
Sr. Fairchild se acomodou na poltrona ao lado, inclinando-se levemente. Sua voz saiu baixa, firme.
— Você, criaturinha, tem algo que muito me intriga... e eu ainda não sei o que é. Preciso descobrir.
Por um instante, cheguei a pensar que o Sr. Fairchild fosse louco... ou apenas um homem tomado pelo tédio. Sua expressão, sempre impenetrável, não deixava escapar um único sinal do que poderia estar sentindo. Talvez quisesse apenas brincar comigo, se divertir às minhas custas — mas não. Ele estava sério demais, e aquilo me fazia acreditar que não se tratava de uma brincadeira.
— Sou apenas uma babá... uma pessoa comum como qualquer outra, senhor.
— Não, Lia. — retrucou, firme, quase num sussurro. — Você não é comum. É diferente... de um modo que ainda não sei explicar.
“Talvez seja devido aos meus traumas”, pensei, abafando o impulso de sorrir de nervoso.
— Emily, traga-nos um chá! — ordenou ele de repente, interrompendo meus pensamentos.
O silêncio que se seguiu pareceu eterno. Eu desviava os olhos, tentando não encarar aquele olhar persistente que me atravessava como uma lâmina. Meus olhos vagavam pela biblioteca, suplicando em silêncio para que aquele momento terminasse logo. Foi então que notei um livro sobre a mesa, aberto e com uma página marcada. Peguei-o instintivamente, apenas para ter algo onde fixar meu olhar.
— Charlotte Brontë... já ouviu falar? — perguntou o Sr. Fairchild, a voz baixa e quase irônica.
— Sim, senhor. Esse é, sem dúvida, uma escritora excepcional. É o senhor que está lendo?
— Não. — respondeu, sem pestanejar. — Acredito que alguma das criadas tenha se aventurado por ele... e o largou aí.
— É claro... — murmurei.
Senti o rosto aquecer, envergonhada por sequer ter cogitado que aquele homem fosse capaz de se perder em páginas de um romance clássico. Que tolice a minha. Porém logo a seguir comprovei o que pensei.
— Já leu este livro, Srta. Wilson?
— Sim, senhor.
— E o que achou?
— Achei interessante.
— Acha que Jane Eyre fez uma boa escolha ao aceitar casar-se com Mr. Rochester?
— Se levarmos em conta que ela era muito jovem e sem muita experiência sobre amor e casamentos, talvez encontremos aí a problemática. Além disso, o fato de ela não ter autoestima e nunca ter recebido qualquer demonstração de afeto antes do Mr. Rochester... talvez a tenha levado a acreditar que era uma boa escolha.
O Sr. Benjamin Fairchild levantou uma das sobrancelhas.
— Então acha que foram as conveniências da vida que fizeram Jane Eyre se apaixonar por Mr. Rochester?
— Acredito que sim, senhor. Afinal, somente a carência e a pouca experiência fariam uma mulher apaixonar-se por um homem rude, inseguro e com tantos desvios de caráter — que ele mesmo confessou a ela inúmeras vezes.
Vi o Sr. Fairchild franzir o cenho e levantar uma de suas sobrancelhas, como se se sentisse pessoalmente atacado.
— Talvez tenha sido justamente nessas confissões que nasceu o amor dela por ele — interrompeu o Sr. Fairchild, encarando-me com intensidade.— Afinal, ninguém é perfeito.
— É... talvez.
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(Pessoal, assim que terminarem de ler cada capítulo deixem sua curtida e se puder um comentário. Isso ajuda na obra e da mais incentivo ao autor para a continuação.)
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Atualizado até capítulo 84
Comments
Erivanya Silva
Ai Meu Deus!
a cada capítulo eu fico mas angustiada querendo saber o desfecho 🤭
2025-10-17
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