Andei até a mesa, onde o Sr. Fairchild já me esperava. Ao seu lado, Amélie sorria com a inocência de quem nada desconfiava.
O reconheci no mesmo instante: era o homem com quem havia me esbarrado horas antes na trilha. Agora, à luz clara do salão, pude vê-lo melhor. Era bonito de uma forma imponente. Olhos azuis, penetrantes, pele clara, barba bem aparada e cabelos castanhos claros caídos sobre a testa. Alto, de ombros largos e postura firme, parecia preencher todo o espaço ao redor.
Não demonstrou surpresa nem satisfação ao me ver. Seu semblante permanecia duro, fechado. Indecifrável.
— Sente-se, Srta. Wilson. — disse, sem cerimônia. — Lia Wilson... L-i-a ou L-e-a-h? — perguntou, soletrando.
— L-i-a, senhor. — respondi, soletrando com calma.
Ele franziu o cenho.
— Diferente... Por que não Leah?
— Não sei ao certo, senhor. Talvez porque minha mãe fosse brasileira... e preferisse escrever da mesma forma que se pronuncia no Brasil.
— Sua mãe é brasileira?
— Era, senhor. — corrigi, sentindo um aperto no peito.
— Era? — ele replicou, a voz grave ecoando pela mesa.
Engoli em seco. Não era assunto que eu desejasse expor, mas já que havia começado, parecia educado terminar.
— Sim. Ela faleceu junto com meu pai em um acidente de carro... há oito anos.
Ele me encarou em silêncio por um momento, como se me medisse por dentro.
— Então é órfã?
— Sim, senhor.
— E nasceu no Brasil?
— Absolutamente.
Sr. Fairchild estreitou os olhos, analisando-me.
— Não parece brasileira, senhorita. É pequena demais... franzina.
Como alguém pode questionar a nacionalidade de outra pessoa pela aparência? — pensei, mas mantive o tom firme.
— Mas sou, senhor. Apenas não me encaixo no estereótipo da mulher brasileira criado ao longo dos anos.
— E como aprendeu a falar inglês tão bem? Quase sem sotaque.
— Meu pai era britânico. — expliquei. — Falo inglês e português desde pequena.
Ele apoiou os braços sobre a mesa, ainda me examinando.
— Interessante... Me conte mais sobre você, Srta. Wilson.
— O que exatamente o senhor gostaria de saber?
— Não sei. Sua vida... qualquer coisa. Quero ouvir de você.
Fiquei em silêncio, hesitando.
— Senhor, acredito que tudo o que precisava saber sobre mim... o senhor já sabe.
Seu olhar se estreitou por um instante.
— Não quer falar mais, não é?
— Não quero, senhor.
Um breve silêncio pesou no ar. Ele então se recostou na cadeira, como quem aceitasse aquela barreira que eu erguia.
— Muito bem, senhorita... — disse, num tom firme, mas sem hostilidade. — Vou pedir que nos sirvam o jantar.
O Sr. Fairchild mal tocava na comida em seu prato. Seus olhos permaneciam fixos em mim, e eu não conseguia entender o que nele havia: incômodo, interesse(provável que não) ou simples desdém. Seu semblante era impenetrável, indiferente a tudo o que eu dizia. Aquele olhar sombrio e profundo começava a me deixar intimidada.
— Da próxima vez que decidir perambular pelos arredores, faça isso antes do anoitecer. É perigoso sair sozinha. — advertiu.— O que pretendia, fugir por acaso?
Senti o rosto ruborizar.
— De forma alguma, senhor... saí apenas para espairecer e acabei me perdendo na trilha, apenas isso.
— Me diga, senhorita: O que fez uma garota tão jovem aceitar trabalhar como babá? Por acaso não tem nenhuma formação acadêmica?
— Sou formada em pedagogia, senhor. Me Vi-merigada a aceitar esse emprego, pois acabei de chegar no país e preciso me sustentar de alguma forma. Quando surgiu essa proposta eu não pude desperdiçar.
— É pedagoga... tem mesmo cara de pedagoga. —
Ele disse me encarando. — Então suponho que não tem nenhum parente no país.
— Acredito que sim, senhor, mas não os conheço.
— E o que veio fazer num país onde não conhece ninguém? Onde não tem amigos e parentes? Por acaso está fugindo de algo ou de alguém?
Percebi o olhar analítico do Sr. Benjamin Fairchild, mas mantive a postura.
— Não estou fugindo de ninguém, senhor... só decidi que não queria mais viver no Brasil.
— Simples assim? Você decidiu e fez?
— Sim, senhor!
Notei que seu olhar se suavizou.
— Isso é admirável, Srta. Wilson. É muito corajosa para uma jovenzinha de vinte e dois anos.
Permaneci calada e só falei quando me era perguntado. Eu não fazia qualquer ideia do porquê o Sr. Fairchild me chamou para aquele jantar. Estar sentada ali ao seu lado era no mínimo estranho e constrangedor para mim. Talvez, após nos esbarramos na trilha ele achou que uma perturbada mental era a babá de sua filha e quis comprovar isso. Haviam tantas dúvidas dentro de mim. Tanto receio de não lhe agradar.
Amélie mal terminou de jantar e logo começou a cochilar, debruçou-se sobre a mesa, adormecendo.
— Senhor, peço licença para acompanhá-la. — pedi.
— Não. Fica. A Sra. Allen pode cuidar disso.
Fiquei sozinha no salão , apenas eu e ele. Nesse momento eu quis fugir. Sair correndo.
— Você é, no mínimo, uma criatura curiosa, Srta. Wilson... Vamos, conte-me mais sobre a sua vida.
— Já lhe disse que tudo o que precisa saber o senhor já sabe — respondi firme.
— Pois eu quero ouvir aquilo que não preciso saber.
Não estava disposta a me expor ainda mais, então tentei inverter a situação:
— E por que não me conta o senhor sobre a sua vida, Sr. Fairchild?
Pela primeira vez, vi um sorriso ameaçar surgir em seus lábios.
— Você venceu, criaturinha diminuta e atrevida... pode se retirar.
— Sim, senhor... com licença.
Já me virava para sair quando ele chamou meu nome. Não Srta. Wilson, mas apenas:
— Lia!
Virei-me de imediato.
— Volte amanhã. No mesmo horário. — ordenou.
— Sim, senhor.
Subi a escada com um sorriso teimoso que ameaçava escapar, embora eu mesma não compreendesse o motivo. Um calor inusitado percorria meu corpo, trazendo uma sensação diferente de tudo o que já havia experimentado. Antes de chegar ao topo, arrisquei um olhar de relance para trás. Ele ainda estava lá, parado, olhando-me de baixo. Indecifrável. Impossível adivinhar o que se escondia por trás daquele semblante.
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(Pessoal, assim que terminarem de ler cada capítulo deixem sua curtida e se puder um comentário. Isso ajuda na obra e da mais incentivo ao autor para a continuação.)
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Atualizado até capítulo 84
Comments
Francélia Maria
Muito bom
2025-10-18
0
Iracy Abreu
amando❤️
2025-10-14
1
kiwi
Tá ficando bom 🤭👏👏
2025-09-24
1