Capítulo 5 - Vozes nos Corredores

O confronto com Eduardo alterou a órbita de Cecília dentro da Geo-Solutions. Antes, ela era uma novata anônima, uma sombra exótica deslizando pelos corredores cinzentos. Agora, era uma anomalia. Quando caminhava pelo 34º andar, as conversas paralelas diminuíam, os olhares a seguiam. Havia uma mistura de curiosidade, medo e, em alguns poucos rostos, uma centelha de admiração. Ela se tornara a mulher que desafiou o Executor e sobreviveu para contar a história.

As vozes vinham em fragmentos, sussurros captados perto da máquina de café ou no silêncio do elevador.

— ...ela o chamou de suicida, na frente de todo mundo...

— ...dizem que o Bastos quase teve um infarto. Ninguém nunca fala com o Eduardo daquele jeito.

— ...ela é corajosa, ou completamente louca. Ainda não decidi.

— ...ele a fez reavaliar o projeto. Isso nunca aconteceu. Nunca.

Essas vozes eram o ecossistema da torre reagindo a um corpo estranho. Cecília aprendeu a ignorá-las, focando em sua vitória tática. Eduardo, fiel à sua palavra, havia de fato paralisado a mobilização em Carajás. Os engenheiros, agora com uma relutância respeitosa, a procuravam para validar rotas alternativas. Ela estava sobrecarregada, exausta, mas sentia pela primeira vez que sua presença ali fazia diferença. Ela havia enfiado uma alavanca na engrenagem da máquina.

Foi numa tarde de quinta-feira, enquanto almoçava sozinha no refeitório da empresa, remexendo uma salada sem gosto e lendo um relatório no tablet, que Ana, sua gerente, se aproximou com uma bandeja.

— Este lugar está vago? — perguntou Ana, com o mesmo sorriso genuíno do primeiro dia.

— Claro — respondeu Cecília, surpresa. Era a primeira vez que alguém se sentava com ela voluntariamente desde o "incidente".

Por alguns minutos, comeram em um silêncio confortável. Ana era uma presença calmante, uma mulher na casa dos cinquenta anos com olhos gentis e uma eficiência discreta que a tornava respeitada, embora não temida.

— Você sabe que virou uma espécie de lenda, não sabe? — disse Ana, finalmente, quebrando o silêncio.

Cecília deu um sorriso cansado.

— Lenda ou o próximo nome na lista de demissões?

Ana riu, um som agradável e raro naquele ambiente.

— Com Eduardo, nunca se sabe. Mas o que você fez... foi necessário. Muitos de nós pensamos as mesmas coisas que você disse, mas... bem, temos famílias, hipotecas. O medo é um bom gestor de carreiras — Ela suspirou, empurrando um pedaço de brócolis pelo prato — Mas obrigada. Por falar por nós.

A sinceridade de Ana desarmou Cecília.

— Eu não falei por ninguém, Ana. Falei porque não podia ficar calada.

— É por isso que funcionou — disse Ana, com convicção — Cecília, preciso que você entenda com quem está lidando. As 'vozes nos corredores' não contam a história toda. Por que acha que todos aqui têm tanto medo dele?

Cecília pousou o garfo, dando a Ana sua total atenção.

— Eu estou na Geo-Solutions há quinze anos — continuou Ana, em voz baixa — Eu vi Eduardo chegar. Ele entrou como trainee, um garoto brilhante e ambicioso recém-saído de Stanford. Ninguém lhe deu muita atenção no início. Mas ele subiu na hierarquia mais rápido do que qualquer pessoa que eu já vi. Ele não faz amigos, não participa de jogos políticos de escritório. Ele apenas... entrega resultados. Resultados assustadores.

Ana se inclinou para a frente.

— A alcunha 'O Executor' não surgiu à toa. O primeiro grande projeto dele foi na Indonésia. Uma mina de níquel que estava atolada em corrupção local e ineficiência. Ele foi enviado para lá com vinte e poucos anos. Em seis meses, ele demitiu metade da gestão, renegociou todos os contratos com o governo, esmagou a oposição de três ONGs e triplicou a produção. Ele foi impiedoso. Eficiente.

Ana fez uma pausa, os olhos fixos em Cecília.

— Depois veio a África. Um projeto hidrelétrico que estava anos atrasado. Ele não apenas terminou a obra antes do prazo, como redesenhou toda a cadeia de suprimentos da empresa no continente. Ele não corta custos, ele os oblitera. Ele não resolve problemas, ele os elimina. Ele não vê pessoas, Cecília. Ele vê ativos, passivos, variáveis num sistema complexo. E ele sempre, sempre vence.

O retrato que Ana pintava era de uma força da natureza corporativa.

— Ele tem a confiança cega do conselho porque nunca falhou. Nunca. Eles dão a ele os projetos impossíveis, e ele os torna não apenas possíveis, mas extremamente lucrativos. É por isso que todos dizem que ele é o sucessor natural para a presidência. Não por ser charmoso ou popular, mas por ser uma máquina de resultados.

— Então por que ele recuou? Por que mandou reavaliar o projeto Silex? — perguntou Cecília, a mente a mil.

— Essa é a pergunta de um milhão de dólares — admitiu Ana — E é por isso que você o assustou. Você não o atacou com emoção, como as ONGs que ele esmagou. Você o atacou com a própria lógica dele. Você mostrou a ele que a abordagem mais 'eficiente' dele era, na verdade, um risco. Você o forçou a recalcular. Ele não recuou por bondade; ele recuou porque você o superou em seu próprio jogo. E ele odeia, mais do que tudo, ser superado.

A admiração no olhar de Ana era inconfundível.

— Eu sou uma analista de dados, Cecília. Passo meus dias olhando para números, tentando encontrar padrões. E eu vejo um padrão em você. Você é uma variável que o sistema dele não previu — Ela se inclinou para mais perto — Eu não posso lutar nas reuniões como você, mas posso conseguir dados. Relatórios antigos, projeções financeiras, e-mails internos. Coisas que podem te ajudar a prever o próximo movimento dele. Considere-me sua aliada.

Pela primeira vez em semanas, Cecília não se sentiu completamente sozinha naquela selva de concreto. O temor que sentia por Eduardo agora tinha uma forma mais clara, a de um adversário genial e implacável, mas a ideia de enfrentá-lo já não era tão solitária. Ela tinha uma aliada. Alguém por dentro que via o mundo através dos mesmos olhos críticos.

— Por que, Ana? — perguntou Cecília, genuinamente — Por que se arriscar por mim?

Ana olhou para a janela do refeitório, para a cidade cinzenta lá fora.

— Eu tenho uma filha de dez anos. Outro dia, ela chegou da escola chorando porque aprendeu sobre o desmatamento na Amazônia. Ela me perguntou o que eu fazia para impedir isso — O olhar de Ana voltou para Cecília, e havia uma tristeza profunda em seus olhos — Eu não tive uma boa resposta para dar a ela. Mas talvez, ajudando você... eu comece a ter uma.

Elas terminaram o almoço, a aliança selada não com um aperto de mãos, mas com um entendimento mútuo. Ao voltar para sua mesa, Cecília olhou para a torre de aço e vidro com novos olhos. Seu inimigo era mais poderoso, mais perigoso do que ela imaginara. Mas ela não estava mais sozinha. As vozes nos corredores podiam continuar a sussurrar, mas agora, havia uma voz que falava a mesma língua que a dela. E isso, Cecília sabia, podia fazer toda a diferença.

...***...

Se está gostando não deixe de curtir pra mim saber e me segue no coraçãozinho, bjs.

❤⃛ヾ(๑❛ ▿ ◠๑ )

Capítulos
1 Capítulo 1 - A Sombra da Seringueira
2 Capítulo 2 - A Torre de Aço e Vidro
3 Capítulo 3 - O Executor
4 Capítulo 4 - O Primeiro Embate
5 Capítulo 5 - Vozes nos Corredores
6 Capítulo 6 - Um Pequeno Triunfo
7 Capítulo 7 - A Solidão do Guerreiro
8 Capítulo 8 - Pesadelos e Planilhas
9 Capítulo 9 - Tensão na Sala do Conselho
10 Capítulo 10 - Uma Viagem Inesperada
11 Capítulo 11 - Voo para Jacarta
12 Capítulo 12 - O Choque de Culturas
13 Capítulo 13 - A Negociação Estagnada
14 Capítulo 14 - A Sabedoria de Cecília
15 Capítulo 15 - Primeiros Sinais de Respeito
16 Não pare agora: conheça minhas outras obra
17 Capítulo 16 - A Tempestade
18 Capítulo 17 - Luz de Lamparina
19 Capítulo 18 - A Confissão de Eduardo
20 Capítulo 19 - Um Gesto Inesperado
21 Capítulo 20 - Depois da Chuva
22 Capítulo 21 - Acordo Fechado
23 Capítulo 22 - O Voo de Volta
24 Capítulo 23 - De Volta à Realidade
25 Capítulo 24 - Encontros Secretos
26 Capítulo 25 - O Rival Atento
27 Capítulo 26 - O Primeiro Beijo
28 Capítulo 27 - As Regras do Segredo
29 Capítulo 28 - A Culpa e o Desejo
30 Capítulo 29 - Um Mundo à Parte
31 Capítulo 30 - A Dupla Face
32 Capítulo 31 - O Santuário Esmeralda
33 Capítulo 32 - Linhas de Batalha
34 Capítulo 33 - A Promessa
35 Capítulo 34 - A Investigação de Ricardo
36 Capítulo 35 - Aliados Inesperados
37 Capítulo 36 - A Pressão Aumenta
38 Capítulo 37 - Uma Conversa com o Pai
39 Capítulo 38 - A Estratégia Final
40 Capítulo 39 - A Calma Antes da Tempestade
41 Capítulo 40 - O Palco Montado
42 Capítulo 41 - O Discurso da Guardiã
43 Capítulo 42 - A Cartada do Executor
44 Capítulo 43 - Além dos Lucros
45 Capítulo 44 - "Meu Filho"
46 Capítulo 45 - O Mundo de Vidro Quebrado
47 Capítulo 46 - A Verdade Nua
48 Capítulo 47 - A Escolha
49 Capítulo 48 - A Revolução Verde
50 Capítulo 49 - A Parceria
51 Epílogo
Capítulos

Atualizado até capítulo 51

1
Capítulo 1 - A Sombra da Seringueira
2
Capítulo 2 - A Torre de Aço e Vidro
3
Capítulo 3 - O Executor
4
Capítulo 4 - O Primeiro Embate
5
Capítulo 5 - Vozes nos Corredores
6
Capítulo 6 - Um Pequeno Triunfo
7
Capítulo 7 - A Solidão do Guerreiro
8
Capítulo 8 - Pesadelos e Planilhas
9
Capítulo 9 - Tensão na Sala do Conselho
10
Capítulo 10 - Uma Viagem Inesperada
11
Capítulo 11 - Voo para Jacarta
12
Capítulo 12 - O Choque de Culturas
13
Capítulo 13 - A Negociação Estagnada
14
Capítulo 14 - A Sabedoria de Cecília
15
Capítulo 15 - Primeiros Sinais de Respeito
16
Não pare agora: conheça minhas outras obra
17
Capítulo 16 - A Tempestade
18
Capítulo 17 - Luz de Lamparina
19
Capítulo 18 - A Confissão de Eduardo
20
Capítulo 19 - Um Gesto Inesperado
21
Capítulo 20 - Depois da Chuva
22
Capítulo 21 - Acordo Fechado
23
Capítulo 22 - O Voo de Volta
24
Capítulo 23 - De Volta à Realidade
25
Capítulo 24 - Encontros Secretos
26
Capítulo 25 - O Rival Atento
27
Capítulo 26 - O Primeiro Beijo
28
Capítulo 27 - As Regras do Segredo
29
Capítulo 28 - A Culpa e o Desejo
30
Capítulo 29 - Um Mundo à Parte
31
Capítulo 30 - A Dupla Face
32
Capítulo 31 - O Santuário Esmeralda
33
Capítulo 32 - Linhas de Batalha
34
Capítulo 33 - A Promessa
35
Capítulo 34 - A Investigação de Ricardo
36
Capítulo 35 - Aliados Inesperados
37
Capítulo 36 - A Pressão Aumenta
38
Capítulo 37 - Uma Conversa com o Pai
39
Capítulo 38 - A Estratégia Final
40
Capítulo 39 - A Calma Antes da Tempestade
41
Capítulo 40 - O Palco Montado
42
Capítulo 41 - O Discurso da Guardiã
43
Capítulo 42 - A Cartada do Executor
44
Capítulo 43 - Além dos Lucros
45
Capítulo 44 - "Meu Filho"
46
Capítulo 45 - O Mundo de Vidro Quebrado
47
Capítulo 46 - A Verdade Nua
48
Capítulo 47 - A Escolha
49
Capítulo 48 - A Revolução Verde
50
Capítulo 49 - A Parceria
51
Epílogo

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