O Primeiro Sinal

Um mês depois, meu corpo começou a me trair.

Não foi de repente. Foi devagar. Insidioso.

Primeiro, o cheiro do café me dava enjoo. Depois, o pão torrado parecia veneno. E, por fim, até o cheiro do sabonete que eu usava desde o orfanato me fazia correr pro banheiro.

Naquela manhã, tava tentando preparar um café aguado com o último pó do pacote — aquele que mal tem gosto, mas pelo menos aquece a alma.

Foi aí que o enjoo subiu do nada.

Violento. Quente.

Corri pro banheiro, ajoelhei no chão frio e vomitei até não ter mais nada.

Quando levantei a cabeça, vi meu rosto no espelho: pálido, suado, os olhos arregalados de pânico.

Não… não pode ser.

Foi só uma noite. Uma vez só.

Isso não acontece na vida real… acontece?

Mas acontece.

E o medo se instalou no meu peito como um hóspede indesejado.

Liguei pra Beatriz a com as mãos tremendo.

— Bia… eu não tô bem. Você pode vir aqui?

— Claro. Já tô indo.

Meia hora depois, ela entrou com uma sacola e olhos que já sabiam.

— Pela sua cara… você tá enjoada, pálida, odeia cheiro de café… — suspirou, botando a sacola na pia. — Isso é gravidez, Soph.

— Não posso tá grávida! — Minha voz saiu quase um grito. — Tô sem emprego, sem casa, sem nada! Como vou criar uma criança?

Fiquei em silêncio, os braços cruzados sobre a barriga, como se pudesse esconder o que já tava crescendo ali.

— Foi com aquele cara do bar? — ela perguntou baixinho.

Assenti, os olhos marejados.

— Foi. Mas eu nem sei quem ele é de verdade. Só sei que…

Engoli seco.

— …que não consigo parar de pensar nele.

Bia abriu a sacola e me entregou um teste de farmácia.

— Comprei dois. Só pra ter certeza.

Fiquei no banheiro por minutos que pareceram horas.

Quando saí, as mãos tavam tremendo tanto que quase deixei o teste cair.

— Positivo — sussurrei. — Duas linhas. Claras. Inegáveis.

Caí de joelhos. Bia me abraçou forte.

— Eu vou ser mãe, Bia…

— Você não tá sozinha — ela disse, mas a voz tava trêmula. — A gente dá um jeito.

— Eu conto pra ele?

— Você quer contar?

Não respondi. Mas meu coração já sabia.

Três dias depois, fui pro parque. Precisava de ar. De fingir que era normal.

Mas o corpo não colaborou.

Tava olhando pras árvores quando o mundo começou a girar. As pernas fraquejaram…

…e antes de bater no chão, uns braços fortes me seguraram.

Levantei os olhos.

E congelei.

— É você… — sussurrei.

Lorenzo tava me olhando com uma cara que eu não esperava: preocupação.

Nada de desejo. Nada de jogo. Só… urgência.

— Você tá bem? — a voz dele tava mais grave que naquela noite.

— Acho que desmaiei.

— Vou te levar pro hospital. Agora.

No carro preto, o silêncio tava tão pesado que eu ouvia meu próprio coração batendo.

Sentia o cheiro dele — couro, sândalo, perigo — e meu corpo reagia como se já o reconhecesse.

— Que tristeza a gente se encontrar assim — falei, mais pra mim mesma.

— Talvez não tenha sido coincidência — ele respondeu, sem olhar pra mim. Mas a mão no volante apertou.

Meu coração acelerou.

Porque, pela primeira vez, entendi:

aquela noite não tinha sido só uma noite.

Era o começo de algo que já tava escrito —

não nas estrelas, mas no sangue, no desejo, no destino que nem a escuridão consegue apagar.

E Lorenzo Ferreira…

não tinha aparecido por acaso.

Antes que eu pudesse dizer qualquer coisa,

o mundo escureceu de novo.

E a última coisa que senti

foi o calor dos braços dele

me segurando com força.

Mais populares

Comments

Leitora compulsiva

Leitora compulsiva

que coincidência encontrar com ele

2025-10-02

1

Ver todos

Baixar agora

Gostou dessa história? Baixe o APP para manter seu histórico de leitura
Baixar agora

Benefícios

Novos usuários que baixam o APP podem ler 10 capítulos gratuitamente

Receber
NovelToon
Um passo para um novo mundo!
Para mais, baixe o APP de MangaToon!