A BONECA DO MONSTRO.

A BONECA DO MONSTRO.

PRÓLOGO

PRÓLOGO**

*A Boneca do Monstro*

A chuva caía grossa naquela noite de outono, lavando as ruas de Milão como se quisesse apagar os pecados que se acumulavam nos becos e mansões. Helena Moretti observava as gotas escorrerem pelo vidro da janela do quarto. Gostava do som — era como se o mundo todo estivesse suspenso, preso no compasso da água caindo.

Ela tinha apenas doze anos, mas já sabia que o silêncio era uma arma. As criadas diziam que ela era a filha “bem-comportada” do Don Moretti, ao contrário de sua meia-irmã mais velha, que vivia quebrando as regras. Mas Helena sabia que não era exatamente bem-comportada — era treinada para ser.

Naquela noite, a governanta, Signora Lucia, havia pedido que ela vestisse o vestido creme de renda, o mais delicado de seu guarda-roupa. O corpete justo, as mangas bufantes e a saia rodada faziam-na parecer uma boneca de porcelana. Seus cabelos castanhos estavam presos em uma trança impecável, e um laço branco adornava o topo da cabeça.

Helena não perguntou o motivo. No mundo em que vivia, perguntas custavam caro.

A porta do quarto se abriu e seu pai entrou. Don Alessandro Moretti era um homem alto, de ombros largos, olhar severo e mãos que carregavam tanto o peso da violência quanto o de decisões que mudavam destinos. Atrás dele, dois homens entraram. Eles não se pareciam com os homens da máfia italiana — havia algo diferente no porte, no olhar gelado e no sotaque pesado quando trocaram algumas palavras entre si.

— É ela? — perguntou o homem de terno preto, a voz grave como trovão distante.

— Sim — respondeu Don Alessandro, sem sequer olhar para Helena. — Minha filha.

O homem de terno cinza aproximou-se. Seus olhos claros varreram Helena da cabeça aos pés, não com desejo, mas com uma avaliação fria, como se estivesse examinando mercadoria.

— Bonita. E disciplinada. — Ele se virou para o homem ao lado. — Seu filho não vai recusar.

Helena franziu levemente a testa, mas não se mexeu.

— Meu presente para Nikolai — disse seu pai, entregando um envelope grosso ao homem de terno preto. — Um acordo entre famílias. Quando ela completar dezoito anos, será dele. Casamento oficial.

A menina sentiu um frio percorrer sua espinha. Ela não conhecia nenhum Nikolai. O nome soava pesado, estrangeiro.

O homem de terno preto pegou o envelope sem expressão. — Eu vou garantir que ele saiba… na hora certa.

E então, como se nada de extraordinário tivesse acontecido, os dois russos se viraram e saíram do quarto.

Helena não perguntou nada. Seu pai apenas lhe lançou um olhar rápido e disse:

— Vá dormir, Helena. A partir de amanhã, sua educação será prioridade.

E foi assim que tudo começou.

Nos meses seguintes, sua vida virou um regime rígido. Aulas de etiqueta, idiomas, dança clássica, música, boas maneiras à mesa, postura. Tudo milimetricamente planejado para que ela se tornasse a esposa “perfeita”. Não podia correr descalça no jardim, não podia rir alto, não podia contestar uma ordem. Cada gesto era moldado para que, no futuro, ela fosse uma boneca impecável ao lado de um homem que ela nem conhecia.

As outras meninas da sua idade brincavam de boneca. Helena estava se tornando uma.

Às vezes, quando se olhava no espelho, tinha dificuldade de reconhecer a si mesma. Por dentro, ela ainda sentia curiosidade, medo, raiva… mas por fora, era tudo delicadeza e silêncio.

E, enquanto os anos passavam, ela guardava o nome “Nikolai Volkov” em um canto da mente, sem saber se deveria temê-lo ou ansiar por conhecê-lo.

Seis anos depois — Moscou**

Nikolai Volkov odiava reuniões familiares. O ar ficava pesado demais, carregado de interesses, mentiras e promessas que ninguém pretendia cumprir. Ele estava sentado à cabeceira de uma longa mesa de carvalho, vestido com um terno preto impecável, as mangas dobradas até o antebraço, revelando as tatuagens da Bratva que marcavam sua pele.

À sua esquerda, Ivan Volkov — seu irmão mais velho e Pakhan da Bratva — folheava uma pasta de documentos como se nada fosse importante o suficiente para apressá-lo.

— Tenho um presente para você — disse Ivan, por fim, lançando-lhe um olhar de canto.

Nikolai arqueou uma sobrancelha. — Não preciso de presentes.

— Não é uma questão de precisar. É uma questão de honra entre famílias. — Ivan empurrou um envelope na direção dele.

Nikolai pegou o envelope e o abriu. Dentro, havia um contrato assinado há seis anos, selado com o brasão dos Moretti e o da família Volkov. Seu nome estava ali, ligado ao de uma tal Helena Moretti.

— O que é isso? — perguntou, a voz baixa, mas carregada de tensão.

— Sua futura esposa.

O silêncio na sala foi quase palpável.

Nikolai soltou uma risada seca, sem humor. — Isso é uma piada?

— Não. — Ivan manteve o tom calmo. — Alessandro Moretti vendeu a filha para garantir a paz entre nossas famílias. Ela tinha doze anos na época. Hoje, completou dezoito. Está pronta para o casamento.

Nikolai apertou o papel entre os dedos. — Doze anos… — repetiu, com desgosto. — Ele me prometeu uma criança?

— Uma criança que agora é mulher — corrigiu Ivan. — E que foi treinada para ser sua.

Nikolai se recostou na cadeira, o olhar frio. — Eu não quero uma boneca. Não gosto de mulheres moldadas para agradar. Elas quebram fácil.

— Talvez ela não seja tão frágil quanto parece — disse Ivan, enigmático. — Você deveria conhecê-la antes de decidir.

Nikolai ficou em silêncio por alguns segundos, olhando para o contrato. Aquilo o irritava profundamente. Ele não era homem de receber ordens, muito menos de cumprir promessas que não fez. Mas uma parte dele queria ver com os próprios olhos que tipo de mulher alguém ousaria preparar para o “monstro da Bratva”.

— Marque um encontro — disse, por fim. — Quero conhecer essa tal Helena Moretti.

Ivan sorriu de canto, como se já esperasse essa resposta.

Naquela mesma noite, a notícia foi enviada a Milão. Helena estava sentada na varanda, lendo um livro de poesia, quando Signora Lucia entrou apressada, segurando um telefonema.

— Helena… — disse, hesitante. — É sobre o senhor Volkov.

O coração dela deu um salto.

Seis anos esperando, seis anos imaginando quem ele era, como seria seu rosto, sua voz, se teria um olhar cruel ou gentil… e agora, finalmente, ele sabia de sua existência.

Helena fechou o livro lentamente e respirou fundo. Sabia que seu futuro estava prestes a mudar. Só não sabia se para melhor ou para pior.

Mais populares

Comments

Mavia Dantas

Mavia Dantas

meu Deus lavem o furacão /Angry//Facepalm/

2025-08-15

2

Marta Monteiro

Marta Monteiro

iniciando a leitura 📚 hoje.

2025-08-20

2

MEDUSA

MEDUSA

amandooooo jaaaa

2025-08-20

0

Ver todos

Baixar agora

Gostou dessa história? Baixe o APP para manter seu histórico de leitura
Baixar agora

Benefícios

Novos usuários que baixam o APP podem ler 10 capítulos gratuitamente

Receber
NovelToon
Um passo para um novo mundo!
Para mais, baixe o APP de MangaToon!