Abri a porta do carro, ainda espantada.
O chão em volta da casa era de pedra. A sala, toda de paredes de vidro, nos deixava ver um vulto de homem se aproximando. Havia uma piscina, tão delicada que parecia mais um lago – completamente diferente das piscinas em que eu costumava ir quando era criança.
- Valentina! – o homem saiu pela porta da frente\, sorrindo.
O olhei com atenção. Parecia estar na faixa dos sessenta anos, mas era forte e se movia com muita agilidade. O cabelo, embora branco, era volumoso e brilhante.
- Luiz Antônio! – minha mãe exclamou\, se apressando para dar um abraço animado.
Noely e eu trocamos um olhar. Percebi que minha avó estava tão espantada quanto eu.
- Essa é minha mãe\, Noely. – Valentina o puxou pela mão até nós – E a minha filha\, Samantha.
- É um prazer imenso recebê-las aqui. – notei que os olhos dele eram de um verde intenso – Sou Luiz Antônio.
- É um prazer. – minha vó deu um sorriso educado.
- É\, sim\, claro. – falei\, meio confusa\, quando percebi que todos olhavam para mim – É um lugar lindo.
O homem pareceu feliz com minha aprovação. Seu peito se ergueu levemente, os olhos passando pela propriedade, enquanto envolvia a cintura da minha mãe com um dos braços.
- Obrigado. É meu paraíso particular.
Fomos até o lado de dentro, que conseguia ser ainda mais impressionante. Tudo era de uma madeira escura, sólida e brilhante. Os sofás se espalhavam por todo o ambiente, que devia ser maior que todo o meu apartamento. Luiz Antônio indicou a cozinha ao fundo, mas não nos levou até lá.
Subimos pela escada até o andar de cima. Primeiro, havia um cômodo amplo, com prateleiras cheias de livros e mais sofás, poltronas e um tapete enorme e felpudo. A parede da frente combinava com o andar de baixo, totalmente de vidro, e deixava uma bela vista.
Em seguida ele nos guiou por um corredor cheio de portas, onde explicou que eram suítes.
- Podem escolher qualquer um. – explicou\, apontando – Menos o último\, que é meu quarto. – olhamos na direção – E esse aqui. – colocou a mão na primeira porta da direita. – É o do meu filho.
- É mesmo. – minha mãe comentou\, animada – E quando vamos conhecê-lo?
O homem deu um suspiro profundo, o que já me fez imaginar que o garotinho de ouro do papai não era muito simpático.
- Adam ainda não chegou.
Tudo aquilo era um pouco excessivo para mim, e eu também estava um pouco cansada da viagem de ônibus somada com a pressão dos dias anteriores.
- Bom\, vou ficar por aqui. – apontei para a primeira porta da esquerda – Se não houver problema. – acrescentei\, tentando soar mais educada.
- Claro que não\, querida. – Luiz Antônio fez um gesto despreocupado – Se acomode\, descanse...
Abri a porta e passei para o lado de dentro.
Bom, se eu tinha ficado chocada com o resto da casa, não saberia que palavra usar para aquele quarto.
A cama era grande, com uma cabeceira acolchoada e luzes presas dos dois lados – uma espécie de abajur, imaginei. Ao lado, havia uma janela que ia do teto ao chão, com uma cortina branca de um tecido muito suave. Claro que um tapete tomava a maior parte do local, que ainda tinha armários embutidos por toda uma parede, um sofá que combinava perfeitamente com a cama e uma escrivaninha.
Abri a porta que me levaria ao banheiro e, mais uma vez, fiquei maravilhada. Metade do comprimento do teto era de vidro, e logo abaixo dessa parte estava uma banheira de um material escuro por fora e branco por dentro. Mais ao fundo, estava o chuveiro, a pia e o vaso sanitário.
Certo, talvez não fosse tão ruim assim passar as férias longe da minha casa de infância.
A primeira atitude que tomei foi mergulhar na banheira, cheia com água quente e os sais para banho que estavam do lado. Fiquei lá até sentir todas as tensões musculares se dissiparem.
Claro que, assim que me sequei com a toalha mais macia do mundo, me lembrei que minha mala continuava no porta-malas do carro. Jamais que eu colocaria a roupa que usei a manhã toda, principalmente durante uma viagem de ônibus, depois de me perfumar toda.
Felizmente, havia um roupão branco pendurado em um suporte, e o vesti rapidamente.
Ninguém iria se incomodar se eu fosse assim até o carro buscar minha roupa. Minha mãe devia estar com o namorado no quarto dele – ou deles, melhor dizendo -, minha avó devia estar descansando na cama de seu próprio quarto e eu ainda não tinha visto nenhum empregado circulando.
Sem me preocupar em calçar nada, desci as escadas e atravessei a sala com passos rápidos, já imaginando usar uma roupa quentinha.
- Uau\, dessa vez meu pai se superou.
A voz me fez frear, assustada. Derrapei suavemente, por pouco não caí de costas, e vi o rapaz parado na porta da frente, provavelmente recém chegado.
Não precisaria nem de apresentações para saber que aquele era Adam. Além de ter traços muito parecidos com o pai – como os olhos verdes e o cabelo volumoso caindo em cachos suaves e loiros pela testa -, a postura era arrogante e os lábios, grossos e bem desenhados, estavam abertos em um sorriso malicioso.
- Adam\, meu filho\, você chegou. – Luiz Antônio apareceu no primeiro degrau da escada.
- É\, pai. – o outro olhou para ele suavemente\, antes de voltar a me encarar – Acho que esta é capaz de te causar um infarto.
Era isso mesmo que eu estava ouvindo?
- Escuta aqui... – comecei\, irritada.
- Adam. – o homem falou um pouco mais alto – Essa é Samantha\, filha da minha namorada.
Cruzei os braços na frente do peito, com raiva.
- Filha. – ele inclinou a cabeça para mim – É\, acho que essa passaria um pouco dos seus limites.
- Adam\, por favor. – Luiz Antônio começou a descer as escadas – Seja educado\, pelo menos.
- Desculpe\, madame. – ele sorriu para mim\, cínico – É um prazer tê-la em nossos aposentos.
Ele desviou de mim e subiu as escadas correndo, ignorando o pai no processo.
Uau. Menos de cinco minutos e eu já queria dar um soco naquele rostinho perfeitamente irritante.
- Algum problema\, Samantha? – o homem me perguntou\, provavelmente porque eu estava parada no pé da escada usando apenas um roupão.
- Minha mala. – apontei para o lado de fora – Eu esqueci... Já vou buscar. – acrescentei\, me apressando.
Peguei a mala e voltei para o quarto o mais rápido possível. Toda a sensação de relaxamento tinha se esvaído em uma velocidade recorde. Quantos dias minha mãe iria querer ficar?
Com esforço, e reclamando baixo para ninguém mais ouvir, coloquei a mala pesada dentro do quarto e abri o roupão. Será que havia a possibilidade de eu almoçar dentro do quarto sem parecer mal educada?
- Garota.
Dei um pulo, fechando o roupão com as mãos e me virando.
Deitado de lado, com a cabeça apoiada na mão, Adam me encarava com mais um daqueles sorrisinhos idiotas. Havia divertimentos em seus olhos.
- Creio que seu quarto fica do outro lado do corredor. – ele acrescentou\, apontando a porta.
- Merda. – sussurrei\, me virando para amarrar o roupão com força.
- Não precisa se apressar. – escutei os passos dele se aproximando.
Minha mão buscou a mala, mas Adam foi mais rápido.
- Deixa que eu levo para você. – ele abriu um sorriso torto e passou pela porta.
Eu estava longe de ser uma pessoa implicante, mas, decididamente, eu não simpatizava nem um pouco com aquele garoto. Com certeza seria impossível ficar no mesmo ambiente que ele por dias – minutos já parecia inconcebível.
- Prontinho. – ele colocou a mala no chão do meu quarto e olhou ao redor – É. Meu pai sabe mesmo decorar uma casa.
- É\, é mesmo linda. – respondi\, rabugenta.
- Está totalmente diferente da última vez que eu vim. – Adam não parecia ter pressa para sair\, e\, como a casa era dele\, cruzei os braços para não o empurrar para fora.
- Deixa eu adivinhar. – tentei controlar o sarcasmo – Você costuma viajar nas férias. Algum lugar da moda\, cheio de gente...
Para minha surpresa, Adam riu.
- Gosto de viajar\, claro. – ele me encarou\, ainda sorrindo – Mas esse não é o motivo disso estar diferente. Meu pai sempre muda tudo quando termina um relacionamento.
Franzi a testa.
- É\, é isso mesmo que você está pensando. – o tom de voz de Adam era crítico – Uma infinidade de candidatas a madrasta já passaram por aqui nos últimos anos. Sempre mais jovens\, bonitas... Ninguém fica muito tempo. – ele deu de ombros.
Senti um aperto no peito pela minha mãe. Esse tal de Luiz Antônio nada mais era do que um conquistador – provavelmente uma versão mais velha de Adam.
- Não se acostume com o luxo. – o garoto comentou antes de passar pela porta.
Me virei, pronta para dar uma reposta, mas tudo que vi foi a porta de seu quarto fechando.
Me controlei para não bater a minha porta, depois me troquei e joguei o roupão longe. Naquele momento, tudo que eu queria era pegar minhas coisas e voltar para casa.
- Samantha? – minha mãe bateu suavemente na porta antes de entrar – E então? É legal\, não é?
- É tudo muito chique. – me sentei no colchão macio.
- O que foi? – Valentina se aproximou. Me conhecendo bem\, já tinha notado algo de errado.
- Conheci o Adam. – reclamei.
- Ah... – ela riu – O Luiz me disse.
- Mãe... – gemi – Será que realmente isso tudo... – gesticulei ao redor – É o que você quer?
Valentina sorriu, de um jeito compreensivo, e se sentou ao meu lado.
- Entendo que tudo isso pareça muito diferente da nossa realidade.
- Não\, mãe... – ela continuou me encarando – Bom\, sim. É. Mas não é exatamente...
- Filha. – ela colocou a mão na minha perna – Faz anos que eu não encontro alguém legal. Francamente\, não me importo com o dinheiro e o luxo. Mas é bom ser mimada\, sabe?
Eu queria dizer o que Adam tinha falado, mas não consegui. Minha mãe, depois de anos de solidão, parecia realmente feliz ao lado de Luiz Antônio e animada para passar um tempo comigo e com Noely naquela casa.
- Sei que você só que o meu melhor. – prosseguiu – Mas eu realmente estou muito feliz.
- Que bom\, mãe. – dei um pequeno sorriso.
- Enfim... – ela bateu com a mão no colchão e ficou em pé – Eu vim te chamar para o almoço em família.
- Almoço em família. – repeti\, morrendo por dentro.
Quando cheguei ao andar de baixo com minha mãe, Luiz Antônio e Noely já estavam acomodados em uma mesa que ficava em um canto na sala. Uma empregada colocava uma travessa fumegante em cima da mesa, o que já foi suficiente para minha boca salivar.
- Adam não vem? – minha mãe perguntou\, inocentemente.
- Adam é um mistério. – Luiz Antônio respondeu monotonamente.
Começamos a comer. Parecia a melhor comida da minha vida, já que eu era uma péssima cozinheira e Taís não ficava muito atrás. Por alguns minutos, esqueci todo meu incômodo e aproveitei. Até, claro, Adam resolver aparecer.
- Olha só\, até parecemos uma família feliz. – se aproximou\, nos encarando um a um.
- Adam\, não começa. – o pai o repreendeu.
Noely olhava para ele tentando controlar o olhar de desagrado, o que não estava funcionando. Mas minha mãe queria que o filho do namorado gostasse dela, então sorriu e tentou ser gentil.
- Oi\, Adam... Eu sou Valentina.
O rapaz revirou os olhos enquanto puxava uma cadeira. Acho que minha mãe não viu isso, então continuou com o semblante agradável.
- É um prazer finalmente conhecer você.
- É. Oi. – ele respondeu\, sem se preocupar em olhar para ela\, enquanto se servia.
O clima ficou tenso. Senti minha mãe buscando uma explicação para a hostilidade gratuita, minha avó se controlando para não se intrometer e até mesmo Luiz Antônio tentando não entrar em uma discussão com o filho na nossa frente.
- Estou satisfeita. – empurrei a cadeira para trás – Obrigada pelo almoço.
Dei as costas antes que alguém me chamasse de volta, mas assimilei o olhar curioso de Adam.
A melhor politica das férias tinha se resumido em ficar no quarto e me isolar. Livros não faltariam nessa incrível jornada.
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Atualizado até capítulo 43
Comments
Solange Borkovski
Gostei do Adam kkk Faz meu tipo irritante kkkkkk
2025-08-07
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