O Espelho da Dor

A chuva caía em fios finos naquela tarde cinzenta, misturando-se com as lágrimas silenciosas que desciam pelo rosto de Aysha. Ela encarava o reflexo no espelho do quarto. Os olhos marejados e o rosto marcado não apenas pela dor física, mas pelo abalo emocional, revelavam o que o coração não conseguia expressar em palavras.

Os boatos correram pela vila como fogo em palha seca: Aysha teria sido vista com um homem, escondida sob o véu da noite. Ninguém sabia ao certo quem era o rapaz, mas a especulação bastava para incendiar a honra da família.

Kemal, ao ouvir os rumores, irrompeu em casa como um furacão. Não quis saber de nomes, nem de explicações. Encontrou Aysha sentada na varanda e, sem uma palavra, a arrastou para dentro.

— Você desonrou esta casa! — gritou ele, os olhos ardendo de fúria.

— Pai, por favor, me escuta! Não é como estão dizendo — implorou ela, as mãos trêmulas tentando alcançar o pai.

Mas ele não ouviu. Cego pela raiva e pelo orgulho ferido, levantou a mão e a violência se abateu sobre ela. O estalo ecoou pela casa como um trovão.

A mãe de Aysha tentou intervir, mas foi contida por Kemal, que apontou para a filha com a mão firme.

— Ela vai embora desta casa! Vai para longe, onde os olhos da vila não vejam mais a vergonha que trouxe para nosso nome.

Elif, a irmã mais velha, chorava em silêncio no canto da sala, com as mãos tapando os ouvidos. A família, antes unida, agora era palco de medo e dor.

Aysha recolheu-se ao quarto, o rosto quente e o coração em pedaços. A dor física era menor diante da mágoa de não ser ouvida, de não ser acreditada. Sabia que, aos olhos do pai, já havia sido julgada e condenada.

Na escuridão da noite, ela se perguntava se algum dia conseguiria recuperar a confiança da família. Ou se já era tarde demais.

Aysha permanecia encolhida no chão do quarto, os olhos marejados e o corpo tremendo. As palavras cruéis do pai ecoavam em sua mente como uma sentença irreversível. Sentia o rosto arder onde a mão dele havia se imposto com brutalidade, e o coração… esse doía ainda mais.

A porta se abriu devagar, revelando sua mãe, Melike, com os olhos marejados, e Elif, que parecia em choque com tudo o que ouvira.

— Minha filha… — murmurou Melike, apressando-se até Aysha, ajoelhando-se ao seu lado. — O que ele fez com você, minha menina?

Elif correu até elas e abraçou a irmã, apertando-a com força, como se quisesse protegê-la do mundo.

— Eu tentei… Tentei explicar, mas ele não me ouviu… — sussurrou Aysha entre lágrimas. — Ele me bateu… e disse que vai me mandar embora…

— Shhh… — Melike a envolveu com ternura, acariciando seus cabelos. — Você não está sozinha, Aysha. Eu estou aqui. Nós estamos aqui.

Elif limpava o rosto da irmã com um pano úmido, enquanto seus próprios olhos brilhavam de indignação.

— Ele não tinha o direito! Você é nossa irmã, não uma prisioneira! — disse com firmeza. — Nada justifica isso.

— Ele nem quis saber quem era… Só acreditou no que ouviu dos outros. — Aysha respirou fundo, com dificuldade.

Melike segurou o rosto da filha entre as mãos, com delicadeza, encarando-a com ternura.

— O amor não é errado, Aysha. Errado é viver preso a regras que sufocam. Errado é não escutar uma filha. Eu vou tentar falar com ele… Tentar fazê-lo ver.

Aysha negou com um leve gesto.

— Ele não vai ouvir… O pai já decidiu. Vai me mandar embora, para longe. Como se eu fosse uma vergonha…

Elif abraçou a irmã novamente, chorando baixinho.

— Onde quer que vá, eu vou escrever todos os dias. Você não vai estar sozinha.

— E eu vou encontrar uma maneira de trazer você de volta — prometeu Melike, com os olhos cheios de lágrimas, mas a voz firme.

Por um instante, entre o caos e a dor, Aysha sentiu um pouco de paz. Porque, mesmo ferida e rejeitada, ela ainda tinha o amor incondicional da mãe e da irmã. E, dentro daquele quarto, no calor daquele abraço, ela sabia que resistiria. Mesmo que o mundo inteiro a quisesse em silêncio.

Melike se levantou, determinada, e saiu do quarto. Desceu as escadas com passos rápidos, encontrando o marido na sala, ainda visivelmente agitado. Ele andava de um lado para o outro, como um touro enfurecido.

— Kemal! — ela o chamou com firmeza. — Isso foi longe demais. Você agrediu nossa filha sem nem ao menos ouvi-la!

— Você não viu o que estão dizendo por aí? — ele rebateu, os olhos ardendo de raiva. — Dizem que ela se encontrava com um homem às escondidas! Que tipo de filha desonra o próprio pai dessa forma?

— E você acha que violência é a resposta? Ela é nossa filha! Tem sentimentos! E mesmo que tenha errado, isso não justifica levantar a mão contra ela!

— Eu fiz o que um pai precisa fazer para salvar o nome dessa família — respondeu, frio. — Ela será enviada para longe. Uma temporada fora daqui talvez a faça aprender o que é vergonha.

— Não! — Melike protestou, em desespero. — Por favor, não faça isso com ela. Ela precisa de apoio agora, não de castigo!

— Ela é uma vergonha para esta casa — bradou Kemal. — E se depender de mim, ninguém mais ousará rir do nome que carrego! Ela partirá ainda esta semana.

Melike recuou, abalada, com os olhos cheios d’água. Subiu de volta ao quarto, segurando o pranto, e abraçou Aysha com força.

Pouco tempo depois, alguém bateu à porta com firmeza, fazendo o som ecoar pela casa silenciosa. Kemal, ainda tomado pela raiva e pelos pensamentos turbulentos, marchou até a entrada, irritado por mais uma interrupção naquele dia conturbado.

Abriu a porta com força.

— O que foi ago... — Sua voz morreu ao ver quem estava diante de si.

Era Aslan.

Alto, imponente, vestido com roupas elegantes e o olhar sério, Aslan parecia ter crescido mais ainda desde que partira. Havia algo diferente em sua postura — uma firmeza madura, um ar de decisão que não se via nos tempos em que apenas brincava com Osman e Aysha pelo quintal da casa.

— Aslan? — disse Kemal, atônito.

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