A luz da manhã atravessava as cortinas de linho cru, inundando o quarto de Isadora com tons dourados. Ela já estava desperta há mais de uma hora, sentada à beira da cama, com o robe de seda escorrendo por seus ombros. O silêncio da suíte contrastava com a agitação que fervilhava dentro dela.
Desde que havia voltado para o Brasil, cada dia era como mover uma peça em um tabuleiro de xadrez gigante. Mas agora, depois do reencontro com Gael, a partida ganhava um novo nível de complexidade.
Ela se levantou e caminhou até o closet, onde uma seleção impecável de vestidos de alfaiataria e saltos altos aguardava. Escolheu um conjunto preto, sóbrio, com um corte que valorizava sua silhueta e projetava poder. Os cabelos ruivos estavam presos em um coque baixo e elegante. Os olhos azuis delineados com precisão. Quando se olhou no espelho, viu a imagem perfeita de uma mulher inabalável. Mas dentro de si, sentia que uma tempestade se aproximava.
No andar de baixo, sua assistente já a esperava com uma pasta de documentos e uma xícara de café forte.
— Reunião com o Conselho marcada para as 10h — informou Sofia, enquanto caminhavam pelo hall de mármore da mansão. — E, sim... ele estará lá.
—Gael? — perguntou Isadora, sem tirar os olhos do tablet em mãos.
— Sim. Foi convidado para integrar o comitê de estratégias internacionais da Vasconcellos Holdings. Por indicação do seu primo Augusto.
Isadora fechou os olhos por um instante, respirando fundo. Claro. Gael não era apenas o homem que havia quebrado seu coração no passado — agora, ele também era um dos poucos com expertise suficiente para ameaçar seus planos.
— Ótimo — disse por fim, com um meio sorriso. — Isso vai tornar as coisas mais interessantes.
A sala de reuniões do 34º andar era imponente, com janelas de vidro que ofereciam uma vista panorâmica da cidade. Os membros do Conselho já estavam sentados quando Isadora entrou. Seus saltos ecoaram pelo piso de madeira enquanto atravessava a sala com a confiança de quem sabia exatamente onde queria chegar.
E lá estava ele.
Gael Castellani.
Encostado na mesa, com as mangas da camisa social dobradas até os cotovelos e o blazer apoiado na cadeira. Ao vê-la, endireitou a postura, um sorriso discreto no rosto — o tipo de sorriso que provocava sem entregar tudo.
— Bom dia, senhores. — A voz de Isadora cortou o ar. — Vamos começar?
O encontro durou mais de duas horas. Isadora comandava cada ponto com firmeza, desafiando decisões, cortando sugestões medíocres com precisão cirúrgica. Mas a cada intervenção de Gael, havia uma faísca. Ele era sagaz, articulado, e desafiava suas ideias de forma quase intencional, como se o jogo que começara na festa continuasse ali, entre gráficos e estratégias.
— Com todo respeito, Isadora — disse ele, em um determinado momento —, sua proposta de reestruturação internacional é ousada... mas imprudente. Isso pode nos expor demais.
Ela ergueu os olhos, fria.
— Ousadia é o que salvou essa empresa da irrelevância, Gael. Se está buscando segurança, talvez tenha vindo ao lugar errado.
A tensão no ambiente era palpável. E, ainda assim, os olhares trocados entre os dois carregavam uma energia quase elétrica.
Quando a reunião terminou, Isadora caminhou até a janela, observando os prédios ao longe. Ouviu os passos dele se aproximando, mas não se virou.
— Você sempre teve esse brilho nos olhos quando está no controle — ele disse, parando ao lado dela.
— E você sempre gostou de me desafiar — respondeu, sem encará-lo.
— Talvez porque você nunca foi fácil de decifrar. Mesmo agora, depois de todos esses anos... ainda não sei onde termina a sua verdade e começa a sua armadura.
Ela se virou devagar, encarando-o de frente.
— Talvez porque você nunca quis ver quem eu era de verdade. Só o que projetava em mim.
Gael sorriu, mas havia tristeza em seus olhos.
— E você? Vai me dar uma nova chance... ou está aqui apenas para vencer?
— Não estou aqui para vencer você, Gael. Estou aqui para conquistar o que é meu por direito.
Houve um momento de silêncio carregado. Ele se aproximou mais, sua presença intensa. Os olhos fixos nos dela.
— E se o que é seu for também o que eu quero?
Ela não recuou. Ao contrário, ergueu o queixo e manteve-se firme.
— Então teremos um problema. Porque desta vez... eu não cedo.
Por um instante, parecia que ele iria beijá-la. Havia algo no olhar dele — desejo, frustração, admiração. Mas ele recuou, engolindo o impulso.
— Então até o próximo movimento.
Isadora ficou diante da janela por mais alguns segundos, tentando recuperar o controle da respiração. Gael sempre soube como abalar suas defesas, mas agora ela não era mais a garota apaixonada que um dia se iludiu com promessas vazias. Era uma mulher de negócios, forjada nas exigências das maiores universidades da Europa e no fogo das traições da própria família.
Seu celular vibrou sobre a mesa de reuniões.
— Augusto quer falar com você — avisou Sofia, entrando discretamente. — Disse que é urgente.
— Coloque na linha.
Ela levou o telefone ao ouvido.
— Diga, Augusto.
— Como foi a reunião? — a voz dele soava casual demais.
— Como esperado. O conselho continua dividido entre bajuladores e covardes. E você fez questão de reforçar o time deles ao trazer o Gael.
Houve um silêncio do outro lado.
— Ele tem valor estratégico, Isadora. Conexões, experiência... e conhece sua forma de pensar melhor do que qualquer um ali dentro.
— Justamente por isso ele é um risco — rebateu. — Mas tudo bem. Não costumo desperdiçar energia com peças previsíveis.
Ela encerrou a chamada sem esperar resposta. Estava farta de meias verdades e de homens tentando manipulá-la sob o pretexto de protegê-la.
Mais tarde, no escritório que havia montado no antigo andar reservado ao seu pai, Isadora se debruçou sobre dossiês e relatórios. Cada movimentação dos diretores, cada voto em decisões anteriores, cada menção em atas esquecidas — ela estudava tudo. Sabia que o verdadeiro poder não se exibia em reuniões, mas era consolidado nos bastidores.
Com uma caneta prateada, ela circulou três nomes em uma folha à parte: Mauro, Edna e Vinícius. Três conselheiros-chave, suscetíveis à influência de Augusto — e agora, provavelmente, de Gael. Precisaria lidar com eles antes que se tornassem obstáculos reais.
— Sofia? — chamou, sem tirar os olhos do papel. — Agende jantares individuais com esses três. Quero conhecê-los... fora do tabuleiro.
— Já imaginava que diria isso — respondeu a assistente com um leve sorriso. — A agenda está pronta.
Isadora sorriu de volta. Inteligência era prever. Poder era agir antes que o inimigo percebesse que está em desvantagem.
Naquela noite, deitada em sua cama ampla, os olhos abertos encarando o teto, ela pensava no jogo que havia recomeçado. A mansão estava silenciosa, mas a mente dela trabalhava sem cessar.
A imagem de Gael surgia com mais frequência do que gostaria. Os olhos intensos. O jeito provocador com que a desafiava. O magnetismo entre os dois que, mesmo adormecido por anos, bastou um olhar para se reacender.
Ela se virou na cama, inquieta.
Gael não era apenas uma ameaça profissional. Era um perigo pessoal. Uma lembrança viva do que foi vulnerável no passado. Mas agora ela era diferente.
— Dessa vez — murmurou para si mesma — você vai sentir o gosto de perder, Gael Castellani.
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Atualizado até capítulo 51
Comments
Vanildo Campos
❤️❤️❤️❤️❤️
2025-07-21
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