O Banqueiro de Nova Iorque
Assisti, com um fascínio peculiar, à performance dramática da atriz no centro do palco, que se movia de um lado para o outro com uma intensidade tão erótica que me deixou bastante desconfortável.
O desconforto me levou a esticar as pernas longas na tentativa de aliviar a pressão sobre a cabeça do meu pau, exigindo espaço dentro da calça de linho azul-marinho. Para piorar, até o colarinho da camisa social estava desconfortável.
Como se, de repente, meu pescoço estivesse largo demais para aguentar o aperto dos botões.
Desabotoei a camisa enquanto estava sentado em um dos principais lugares da ala privada de um dos muitos teatros da Broadway. Ao menos os dois primeiros botões, enquanto me xingava por ter aceitado o convite de Cintia Kent, filha do investidor americano com quem eu vinha negociando nos últimos seis meses.
O que deveria ter sido apenas um jantar, uma continuação da reunião que tivemos no início da tarde, acabou se tornando uma ida não planejada ao musical. O desinteresse em relação ao espetáculo se dissipou quando as luzes refletoras sinalizaram a entrada da pequena e curvilínea atriz, que, apesar de parecer jovem, silenciou a todos com sua voz rouca e sedutora, que exalava devassidão a cada palavra cantada.
Além de talentosa, a infeliz era linda. De uma forma alarmante e arriscada.
Olhos grandes e claros, adornados com maquiagem escura. Uma pele tão pálida que a meia-calça arrastão usada por baixo da saia volumosa e do corpete vermelho causou um efeito surpreendente. Não consegui entender o que havia de especial na garota para me impactar de maneira tão intensa.
Além disso, aos 37 anos e com uma vida dedicada aos negócios familiares, aprendi a lidar bem com as demandas do meu próprio corpo. O tesão era algo passageiro, assim como as mulheres que cruzavam meu caminho.
Números, investimentos e lucro, não. Eles persistiam, quando não se expandiam, e sempre me pareceram mais simples de lidar e controlar do que indivíduos.
Acontece que não eram números em que eu estava pensando. E sim na infeliz com um corpo atraente e curvas que meus dedos ansiavam por tocar. Merda, eu nem sabia o que estava acontecendo no palco. Somente a atriz tinha toda a minha atenção.
Era só uma dança, pensei com raiva, mas também poderia ter sido apenas sexo. A química, a batalha no palco entre a ousada e seu companheiro de atuação. A maneira como se atraíam e se afastavam, tudo ao mesmo tempo e com tanta intensidade que me deixaram encantado com a garota.
Moulin Rouge – Ato final.
Recordei-me do nome do espetáculo e, mesmo sem ter lido o roteiro que nos foi entregue ao chegarmos à recepção luxuosa, suspeitei de como o musical terminaria: como todas as histórias de amor, de maneira trágica e previsível.
Cada vez mais agitado, comecei a me mexer na poltrona. Enquanto me perguntava se cada homem naquele teatro também reagiu de forma primitiva, ou se o silêncio presente nas fileiras se deu por serem honestos e verdadeiros admiradores da arte.
Impossível, retrucou meu próprio corpo.
Não poderia ser o único filho da puta que presta atenção em cada pequeno detalhe daquela descarada. Desde as roupas indecentes a me despir, pedaço por pedaço, até a voz rouca a me provocar arrepios na alma.
Não importava se ela cantava sobre amor em gritos e rouquidão, porque, de onde eu estava, só conseguia ouvir: Trepe comigo até a exaustão. E, assim como todos os meus desejos na vida, esse seria apenas mais um que eu estava mais do que pronto para realizar.
O que me deixou enfurecido até os ossos. Porque, após quase dez anos me sentindo morto por dentro e preso ao passado, a explosão da adrenalina me alcançou.
Não foi como uma luz no fim do túnel; foi mais como um trem desgovernado. Quase prestes a virar meu mundo de ponta-cabeça.
O que fez com que a culpa que eu carregava se tornasse ainda maior. Uma coisa era transar por transar. Sem a presença de sentimentos ou afeto. Mulheres desconhecidas que me proporcionavam prazer e permitiam que eu as dominasse. Eu poderia lidar com esses termos e até apreciava. O que eu não acreditava ser capaz de fazer era dar mais do que receber.
Frustrado, forcei-me a desconsiderar o efeito daqueles olhos. Que permaneceram em minha direção por um tempo, antes de se afastarem. Como se tivesse consciência de que estava sendo observada e se sentisse encurralada.
Eu a estava deixando irritada.
Ela não era a única perturbada ou desorientada aqui.
Quando percebi que não conseguiria desviar o olhar da garota, rendi-me e a observei com voracidade, como um predador diante de uma lebre. A atriz exibia uma cabeleira densa e escura solta em ondas grossas e indomáveis, que não conseguiam cobrir seus seios atrevidos e saltitantes.
As pernas grossas eram ágeis e robustas o suficiente para suportar o pequeno corpo dela sem grande esforço. A cintura esguia dava lugar a um quadril curvilíneo, que me fez cerrar os punhos de tanta vontade de tocá-lo, esmagar a pele alva e marcar...
A garganta secou, mas não por estar com sede de mais uma dose do uísque consumido durante o jantar. Bem longe disso. Mesmo assim, foi a reflexão sobre a bebida que me fez lembrar que não estava sozinho.
E, sem me importar com a presença de Cintia ao meu lado, voltei a olhar para ela por um breve segundo, em busca de alguma fagulha. Qualquer indício de animação, porém, como de costume, não aconteceu nada.
O único motivo pelo qual aceitei o convite para o jantar foi que a família Kent era essencial para o meu plano, que visava consolidar o B&I como o principal banco de investimentos e ações de norte a sul da América.
Um projeto audacioso que demandaria sacrifícios.
Nunca me importei com o que diziam ou falavam a meu respeito, mesmo sendo considerado rude e até mesmo irascível em negociações e relações pessoais. Ser reservado me proporcionou um tipo de privilégio que muitos empresários não tinham. Isso porque meu nome figurava na renomada e disputada lista publicada pela revista Homens Poderosos.
Todos os anos, jornalistas de diferentes setores se reuniam por vários dias em uma das muitas salas de um renomado edifício no centro de Nova Iorque. O objetivo era determinar os nomes que seriam incluídos em uma reportagem destinada a apresentar aos nova-iorquinos e americanos os homens cujas riquezas e influências estavam transformando o mundo como o conhecíamos.
Fosse no âmbito das inovações tecnológicas, científicas, financeiras ou até políticas. E talvez eu estivesse, de fato, mas não por motivos altruístas como alguns dos outros nomes mencionados.
Por trás da imagem de um homem de negócios habituado a arriscar e fazer grandes investimentos, havia alguém extremamente conservador e ambicioso, que não costumava desperdiçar contratos vantajosos nem noites com encontros e mulheres que exigissem um tempo que ele não tinha. Ou que me demandariam algum tipo de comprometimento.
Sufocado em minha própria pele, inclinei-me para frente, apoiando os cotovelos sobre as pernas, e segui observando a ninfeta com os olhos. É difícil estimar sua idade, mas, pela curiosidade que demonstrou ao receber atenção, percebi que ela era apenas uma garota.
Caramba. Havia algo sórdido e incomum nela que me fazia sentir como um animal preso em um terno Desmond Merrion.
Os ombros continuavam tensos e rígidos, e, de repente, o teatro parecia pequeno para conter o desejo intenso que senti pela atrevida que provocou o pior dos meus instintos, sem aviso ou permissão.
Com as pernas inquietas e longas demais para a poltrona, tirei o roteiro do musical do casaco e busquei qualquer detalhe importante sobre a atriz.
O show Moulin Rouge – Ato Final é uma nova versão do espetáculo original que foi apresentado por vários anos na Broadway. A adaptação ao contexto reabre as portas do magnífico cabaré para os apreciadores da arte e do eterno romance entre o poeta ingênuo e a estrela de Paris. Na estreia de Amy Williams, ela interpreta Satine ao lado de Bruno Evans, um ator renomado e premiado...
— Agora entendo por que a crítica está em polvorosa com este musical. — Olhei para a mulher ao meu lado, que não disfarçava o sorriso de satisfação em seu rosto belo e estoico. — Os dois praticamente transam para o público. — Amassei o roteiro, sem alternativa a não ser concordar. O sentimento que começou a se espalhar pelos meus ossos parecia amargo. Indigestão. E me fez voltar o olhar para o palco.
Nesta ocasião, de forma possessiva e totalmente irracional.
— O que falam deve ser verdade. Eles só podem estar de alguma forma envolvidos…
Cintia só poderia estar querendo me deixar maluco. A última coisa que eu queria era ver a imagem da minha mais recente obsessão sendo fodida por um atorzinho qualquer.
— Não sabia que você tinha tanto interesse no mundo artístico, Cintia. — Não foi bem um elogio, mas a advogada aparentou não se ofender.
— Minha mãe era apaixonada pela Broadway e tudo que envolvia musicais e peças. — Suas palavras me fizeram relaxar por um momento, pois, assim como meu pai, Bartolomeu Middleton, eu também tinha uma paixão pelos números.
E quanto mais eles se multiplicassem em minhas contas bancárias, melhor.
Ao término da apresentação, trágico como previsto, aplausos entusiasmados ecoaram, acompanhados de elogios aos atores principais. Conversas paralelas sugeriam uma possível relação romântica entre os dois, porém Amy Williams aparentemente não foi a primeira nem a última atriz com quem o ator teve um envolvimento. Todas essas pequenas informações foram obtidas de Cintia e assimiladas enquanto eu decidia encerrar a noite com ela.
Após acompanhá-la até a calçada e acomodá-la no banco de trás do Bentley, instruí meu motorista a levá-la de volta para casa. Apenas quando o carro se distanciou, atravessando a avenida movimentada, é que me permiti acender um cigarro. Um costume que vinha tentando eliminar há meses. Contudo, em momentos de estresse e agitação como aquele, acabava sucumbindo ao apelo da nicotina.
Os cuidados com a alimentação e o tempo dedicado à academia da cobertura — praticando remo indoor, um hábito desenvolvido após anos de competições em Yale — não me livravam das consequências que o vício provocava. Também não foi muito útil atribuir a culpa da minha própria fraqueza a uma mulher que conheci pela primeira vez naquela noite.
Mesmo que fosse verdade.
E pensar que eu nem conseguia recordar a última vez que estive tão agitado ou entusiasmado, a ponto de não ter outra opção a não ser recorrer ao maldito cigarro. Agora aprisionado entre meus dedos, eu inalo com intensidade, retendo a fumaça nos pulmões e liberando-a quente no ar frio de Nova Iorque.
Aguardando Amy Williams. Que, em determinado momento da noite, precisaria sair do teatro.
Segui na calçada, de maneira impaciente. A situação se tornou ainda mais insana com a passagem dos minutos. Não costumava ter reações intempestivas. Nunca precisei perseguir mulher nenhuma; ter uma grande fortuna era atrativo o bastante para que elas se agrupassem ao meu redor como abelhas em busca de mel. Por essa razão, pagar era mais simples.
Acordos firmados. Ambas as partes informadas. Sem surpresas ou complicações. Porém, não era a ideia de um novo acordo que me deixava entusiasmado naquele momento, mas sim a caça.
Eu queria e lutaria com todas as minhas forças para conquistar essa garota. E não descansaria até que meu prazer escorresse por cada centímetro de sua pele branca. Apenas porque podia, eu a marcaria pelo cheiro.
Por trinta longos minutos, questionei a minha própria sanidade. Saciando vorazmente cada desejo impuro que me atormenta.
As coisas que eu faria a essa garota se ela deixasse...
Caramba! Não era eu o homem que aguardava uma desconhecida em frente a um teatro. Essa não era a maneira como lidava com qualquer contratempo ou dificuldade. Nascido no Brasil e criado quase todo nos Estados Unidos, nunca fui de correr atrás de mulher.
E ainda menos quando eram apenas garotas.
Mesmo assim, permaneci.
Com o cigarro entre os dedos, assisti a um novo grupo de atores sair do teatro, já trajando suas roupas habituais. Meu olhar percorreu os rostos desconhecidos e surpreendentemente jovens até se fixar no ator que atuou ao lado de Amy. Aquele que tocou seu corpo inteiro com as mãos.
Cada volta. Cada parte da pele.
Busquei a distância entre os vários rostos. E quando a vi, mais baixa que todos ao seu redor, percebi que ela e Bruno estavam em desacordo. A menina parecia muito brava, com as mãos tremendo e o rosto vermelho. Como um intruso diante daquela cena patética e, ao mesmo tempo, íntima, permaneci sem conseguir identificar o que estava sendo dito entre os dois.
O que soube é que Amy estava prestes a empurrar o filho da puta para longe quando Bruno percebeu que havia outras pessoas na calçada observando-os. Como se a discussão que acabara de ter com ela não tivesse acontecido, o ator a beijou na boca e se afastou rapidamente, deixando-a paralisada.
Amy Williams finalmente me viu quando se virou, tomou a direção contrária à de seus colegas e levantou lentamente o rosto. O fato é que os passos dela a conduziram até onde eu me encontrava. E, se, por um lado, fui arrebatado com uma intensidade mil vezes mais dilacerante do que ao vê-la no palco, por outro, amaldiçoei-me por ter permanecido naquela calçada.
Desejando, de maneira brusca e súbita, nunca tê-la conhecido.
Quando Amy me olhou, seus lábios vermelhos e generosos se abriram em choque, ao me identificar como o homem que a observava da primeira fila do teatro. Notei assombro em seus olhos grandes e azuis, semelhantes aos de um anime. Pintados e cobertos com tinta clara, que apenas destacou os cílios extremamente longos.
Puta que pariu! A filha da mãe parecia uma boneca de tão perfeita.
E assim como ela me avaliou do sobretudo cinza aos sapatos italianos, eu a observei dos pés à cabeça.
Ao ser preso pelo maldito choque, senti como se tivesse acabado de despertar de um pesadelo. Um que eu conhecia muito bem e que não me impediu de observar a franja torta que lhe cobria as sobrancelhas, nem o coque cheio e feito às pressas, que me privava de ver toda a cabeleira loira. Fiz o mesmo com o moletom longo que a menina lançou de maneira descuidada sobre o pequeno corpo. As coxas grossas, antes mostradas com meia-calça arrastão, agora estavam cobertas por calças de ginástica.
Ela era parecida demais, pensei amargamente, ao considerar o motivo que me levou até a garota. Em outras palavras, era o meu passado me visitando. E toda a forte atração não ocorreu apenas porque Amy Williams era linda do começo ao fim, mas também porque ela era idêntica...
Rafaela. Ou à versão dela de anos atrás, quando a encontrei pela primeira vez.
A semelhança me fez hesitar, assim como a certeza de que ela estaria em minha cama naquela noite. Porque, mesmo sem pensar com clareza ou ter certeza de que ela era real e não fruto de uma mente em colapso, ficou claro que Amy era ainda mais jovem do que eu pensava.
Um problema que levaria meu nome para as manchetes, e não pelos motivos corretos.
Puta que pariu! Para um homem na minha posição, seria um escândalo absurdo envolver-se com uma garota desconhecida que aparentava ter dezoito, no máximo dezenove anos. Entretanto, a situação era um pouco mais complicada. Para não afirmar que é trágica. Pois, além da culpa que carregava pelo passado, vi-me atraído por uma versão perigosamente mais jovem e desorganizada da única mulher que amei em toda a minha vida.
— O senhor… acho que eu o vi no teatro. — Fiquei zonzo com o mover daqueles lábios. A ponto de cada osso e músculo do meu corpo reagirem, em um enrijecimento doloroso, que afetou principalmente o meu pau.
— Eu sou Mason. — Meus pés me conduziram até ela, igualmente obcecados. — Mason Middleton.
Estendi uma das mãos, aguardando o reconhecimento ou aquele maldito brilho no olhar que surgia quando meu nome era ligado à minha riqueza. Porém, o que percebi foram olhos desconfiados e dentes brancos e afiados mordendo o lábio carnudo.
— Está esperando alguém? — indagou, hesitante. — Precisa de ajuda? — Enfiei a mão estendida, que Amy não apertou, nos bolsos do casaco, e a observei se afastar decidida quando não lhe respondi.
Meus instintos estavam corretos, afinal. Amy Williams nunca seria uma abelha, mas sempre uma caça.
— E se eu dissesse que estou aqui por você? — A garota parou e virou-se.
Hesitante, não só por estar frente a um completo desconhecido, mas também por ela me olhar como se percebesse o mesmo fio que, naquele instante, me conduzia até ele. Se foi destino ou apenas azar, só o tempo diria.
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Atualizado até capítulo 60
Comments
Jessica Carmo
começando 18/07/25
2025-07-19
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Rosângela Santos
Lendo agora 16/07/25
2025-07-17
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