Depois da discussão, o silêncio se tornou absoluto. Um silêncio espesso, que preenchia cada canto da casa como uma névoa pesada.
Escureceu. Literalmente. A luz do fim de tarde foi sumindo pelas janelas enquanto eu subia as escadas, um passo de cada vez, como se o peso da conversa ainda estivesse grudado nas minhas pernas. Voltei para o meu quarto — aquele onde eu havia passado praticamente a semana inteira trancada. O único lugar onde eu não precisava fingir força. Onde eu podia ser… só eu. Só Aria.
Fechei a porta devagar. Não bati. Não chorei. Já tinha feito isso antes — tantas vezes que parecia inútil.
O quarto estava escuro, abafado. A única luz vinha do abajur ao lado da cama, que eu deixava aceso por hábito, mesmo quando não conseguia dormir.
O som dos outros ainda ecoava lá embaixo, em tons baixos, como se quisessem garantir que eu não ouvisse mais nada. Como se minha presença já tivesse sido encerrada — como se eu tivesse deixado de existir para eles naquele momento.
Não houve ceia de Ano Novo. Nenhum brinde, nenhum “feliz ano novo” forçado. Só o peso do que foi dito, do que foi escolhido, do que foi quebrado.
E, em breve, as aulas voltariam.
Eu faria o sétimo ano.
Sétimo.
Ainda era uma menina.
Uma criança.
Mas não para eles.
Para eles, eu era um problema a ser resolvido. Uma peça no tabuleiro. Um nome no testamento.
Me cobravam decisões como se eu tivesse dez anos a mais. Me olhavam como se eu tivesse cometido um erro imperdoável só por ter esperança.
Esperavam de mim uma maturidade que eles próprios nunca tiveram.
Me chamaram de imatura — mas eram eles que gritavam, que acusavam, que mentiam.
Eu só queria uma chance.
Agora, estava sem chão. Sem apoio.
Tudo o que me restava era uma fagulha: a esperança de encontrar o tio Adam.
E a vontade, pequena mas firme, de entrar para a Fundação Addy Miller. Era o meu plano. Meu sonho. Meu plano de fuga, talvez.
A única coisa que me fazia levantar da cama.
Mas, mesmo agarrada a isso, novos problemas surgiam como sombras.
E o pior deles era esse: eu não sabia onde meu tio estava.
Ele sumira.
Talvez de propósito, talvez não. Talvez fugindo dos mesmos fantasmas que agora rondavam minha vida.
E ninguém da família me diria. Eu sabia. Não porque tinham dito, mas porque vi nos rostos deles. Na forma como desviavam o olhar quando o nome dele era mencionado.
O silêncio dizia tudo.
A última vez que falei com ele foi pelo celular da minha mãe.
Foi rápido, um áudio. Ele disse que estava cuidando de algo, que voltaria, que não se esquecia de mim.
Mas o aparelho se perdeu no acidente.
E com ele, qualquer rastro.
Deitei de lado, abraçando o travesseiro com força.
Fechei os olhos e tentei lembrar da voz dele.
Era quente, meio rouca, como se ele tivesse passado a vida inteira tentando falar baixo para não chamar atenção — mas ainda assim, chamava.
Ele dizia meu nome como se eu fosse importante.
E isso, naquele momento, era tudo o que eu tinha.
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Atualizado até capítulo 28
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