Yago não sabia como explicar o que estava acontecendo com ele — apenas sentia.
E sentir, no seu caso, era quase o mesmo que sofrer.
Havia crescido sendo ensinado a nunca demonstrar fraqueza. A manter o cio controlado, o cheiro abafado, as emoções bem guardadas num compartimento lacrado com vergonha e medo. Mas agora, tudo estava saindo pelas frestas.
O controle começava a ceder.
E seu corpo não mentia mais.
Ele tentava disfarçar, sim. Tomava os supressores, reforçava as doses, aumentava os banhos gelados e as noites solitárias. Mas o problema não era apenas fisiológico. Era Matteo.
O alfa estava sob sua pele. Na sua respiração.
Nos seus sonhos.
Nas últimas noites, Yago acordava suado, ofegante, com o cheiro de Matteo imaginado impregnado nos lençóis. E quando se olhava no espelho, via um brilho nos olhos que não reconhecia. Era desejo. E era perigoso.
Porque mais cedo ou mais tarde... isso ia sair de controle.
Na Montgomery & Co., o clima entre eles se tornara delicado.
Matteo passava pelos corredores e seus olhos encontravam os de Yago como se buscassem refúgio. Mas nenhum dos dois ousava se aproximar demais. Era como se ambos soubessem que outro passo poderia significar um abismo.
E ao redor deles, o ambiente estava carregado.
Os boatos não haviam cessado — apenas evoluído.
As mensagens nos grupos internos começaram a insinuar que Yago era “protegido” demais, que Matteo estava sendo parcial nas decisões. Que o ômega estava subindo rápido demais para quem mal conhecia a empresa.
Yago ignorava o máximo que podia. Mas as palavras doíam. Não pelos boatos em si, mas pela forma como reduziam tudo o que ele era a um cheiro e um corpo bonito.
E ele sabia exatamente quem estava por trás.
Nora Bellamy ainda não havia sido afastada. Matteo deixara claro que ela responderia por abuso de autoridade e manipulação, mas o processo estava em análise interna. Até lá, ela continuava atuando em seu cargo — e usava cada segundo para corroer a imagem de Yago com precisão cirúrgica.
— Lancaster — ela chamou com aquele falso tom doce, na hora do almoço. — Pode vir até minha sala? Preciso te mostrar algo importante.
Yago hesitou. Clara não estava por perto. Mas seguiu.
Na sala de Nora, a luz era baixa e o ambiente cheirava a perfume doce demais, quase sufocante.
Ela trancou a porta assim que ele entrou.
Yago já sabia: aquilo era uma armadilha.
— Você quer o quê, exatamente? — ele perguntou direto, cruzando os braços.
— Paz — ela respondeu, girando lentamente uma taça de vinho tinto que descansava sobre sua mesa. — Mas mais do que isso… quero te fazer entender que você não pertence a esse andar.
— Porque sou ômega?
— Porque você está mexendo com a cabeça do Matteo. E isso... nos afeta a todos. — Ela se levantou, aproximando-se. — Você pode ser esperto, Yago, mas não entende a política desse lugar. A maneira como alianças se formam, como cargos são preservados. E o Matteo... ele é um alfa, mas está perdendo o foco.
— Se ele está, é problema dele — Yago rebateu.
— Não. Agora é problema seu. E vai se tornar o problema de todo mundo se você continuar por aqui. — Ela sorriu, mas os olhos brilhavam em ódio. — Uma transferência discreta seria o melhor, concorda? Talvez pro setor de marketing em Jersey. Ou quem sabe algo remoto?
Yago segurou a raiva. Queria gritar. Mas se manteve frio.
— E se eu não aceitar?
— Ah, querido… — Nora riu. — Ninguém aqui precisa da sua permissão.
Horas depois, Yago estava parado na varanda do prédio, onde os funcionários raramente iam. O céu estava nublado, e uma brisa fria acariciava seu rosto.
Ele sentia que estava caindo.
Perdendo tudo o que havia construído em tão pouco tempo.
Por dentro, o ciclo hormonal gritava. A pele doía de sensibilidade. E o pior: o cheiro de Matteo o perseguia. O instinto estava se aproximando do cio real. E se isso acontecesse ali, naquele ambiente… seria a destruição final.
— Está se escondendo? — perguntou uma voz firme atrás dele.
Yago se virou devagar. Matteo.
— Talvez — respondeu, olhando de volta para o horizonte.
Matteo deu dois passos, parando ao seu lado.
— Nora está fazendo ameaças?
Yago assentiu, sem olhar.
— Ela quer que eu aceite uma transferência. Diz que está “protegendo” a empresa. Mas o que ela quer mesmo é me tirar do seu caminho.
— Você quer sair?
— Não. Mas talvez eu devesse.
Matteo respirou fundo. Havia angústia em seu rosto — uma sombra sutil de preocupação que nem ele conseguia esconder.
— Você mexe comigo, Yago — ele disse, enfim. — Mas não no sentido clichê. Não é só sobre instinto. É pior. Você me faz sentir que sou humano.
Yago virou o rosto, surpreso.
— E isso é ruim?
— Eu não sei ser humano. Só aprendi a ser CEO.
O silêncio caiu entre eles por longos segundos, até que Yago deu um passo.
— Matteo, eu não sei se vou conseguir continuar escondendo o que meu corpo tá sentindo. Eu... acho que meu cio tá chegando. Antes da hora.
Matteo arregalou os olhos.
— Isso é sério?
— Muito. E se acontecer aqui... vão me massacrar.
Matteo se aproximou e pegou o rosto de Yago com ambas as mãos, com uma delicadeza que contrastava com a força de suas palavras.
— Você vai sair daqui agora. Eu vou te levar. E depois disso... vamos decidir juntos o que fazer.
Yago piscou, emocionado.
— Você não tem medo?
— Eu tenho medo de te perder. Só isso.
Naquela noite, Matteo o levou para um apartamento mais reservado da empresa — um flat seguro, usado apenas em situações confidenciais com parceiros estrangeiros.
Ali, Yago podia ficar isolado, longe dos olhares, enquanto sua instabilidade passava.
Mas ao fechar a porta, com Matteo ainda parado ali com ele, a tensão explodiu.
Os olhos de Yago estavam marejados.
— Eu não quero ser só uma responsabilidade.
Matteo se aproximou, com uma expressão grave.
— Você não é.
— Então por que parece que cada passo nosso é um erro?
Matteo encostou a testa na dele.
— Porque o mundo tenta dizer que é. Mas o que eu sinto... não pode estar errado.
E naquela noite, sob o teto do silêncio, o toque entre eles foi diferente. Sem pressa. Sem selvageria. Apenas mãos firmes, olhares longos e uma promessa muda entre os corpos:
A queda havia começado.
Mas juntos, talvez aprendessem a voar.
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Atualizado até capítulo 23
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