Capítulo 3 – O Alvo dos Olhos Errados

O primeiro dia de Yago na Montgomery & Co. havia terminado, mas o impacto que causara não seria esquecido tão cedo — e não apenas por ele.

Clara o observava discretamente desde o outro lado da baia, com aquele jeito protetor de quem sabia ler pessoas melhor do que relatórios. Assim que o relógio marcou 18h, ela se aproximou com um sorriso e dois copos de café frio.

— Você sobreviveu. Isso já é uma vitória — disse ela, sentando-se ao lado dele na estação de trabalho, agora vazia.

Yago riu baixinho, cansado.

— Nem sei como. Achei que ia desmaiar na primeira hora.

— Por causa dele?

Ele não precisou perguntar quem.

— Eu não sabia que ele vinha tanto ao setor...

— Ele quase nunca vem. Hoje ele apareceu três vezes. Só isso já seria estranho. Mas o jeito como te olhou? Isso aí só não viu quem não queria.

Yago desviou o olhar para a tela do computador, onde o gráfico do orçamento anual ainda piscava, como se lembrasse que o mundo corporativo não dava espaço para distrações.

— Eu não posso me dar ao luxo de... de nada — murmurou.

— É, mas vai ter que aprender a lidar com isso rápido — Clara disse, firme. — Porque se não for você quem define os limites, o resto vai fazer isso por você. E alguns já começaram.

Yago franziu o cenho.

— O que quer dizer?

Clara hesitou, depois passou o celular para ele. Era uma troca de mensagens do grupo de funcionários.

[Bellamy]:

O novo ômega é bonito, vou admitir.

Mas parece saber muito bem o que tá fazendo.

Esses olhos de quem quer subir pelo cio.

[Outro]:

Matteo tem histórico com ômegas?

Porque eu apostaria cem dólares que esse vai sair com promoção antes do segundo mês.

[Bellamy]:

Só se for debaixo da mesa da diretoria. rsrs

Yago devolveu o celular com um nó no estômago.

— Eu não fiz nada...

— E é por isso que incomoda. — Clara cruzou os braços. — Você chegou e simplesmente existiu. E isso já foi demais para alguns egos inflados. Principalmente o de Nora Bellamy.

— Ela...

— É alfa. Antiga gerente de projetos antes da fusão. Achava que ia ser promovida quando o antigo CEO saiu. Mas Matteo assumiu tudo sozinho. Ela odeia não ter controle. E odeia ainda mais que você esteja recebendo o olhar que ela quer há anos.

Yago suspirou, massageando as têmporas.

— Incrível como em menos de um dia eu virei o centro de um circo que nem entrei por vontade própria.

— Bem-vindo à Montgomery & Co. — Clara sorriu com ironia. — Aqui, todo mundo usa perfume caro, fala inglês fluente e esconde feromônio por trás de metas.

Na cobertura da empresa, Matteo não estava muito diferente de Yago — perdido em pensamentos.

Ele tentava focar nas planilhas, mas seu corpo reagia como se estivesse em alerta desde a manhã. O cheiro daquele ômega ainda pairava em sua mente, mesmo que Yago tivesse passado o dia evitando-o.

Era como se o ar ganhasse textura quando ele estava por perto. Como se seu corpo soubesse, antes da razão, que aquele ômega era diferente.

E isso o deixava... furioso.

Matteo sempre se orgulhou de ser impenetrável. Nunca havia se envolvido com ninguém da empresa. Mantinha seus casos bem fora das paredes de vidro. Mas agora, com aquele olhar tímido e ousado ao mesmo tempo, aquele cheiro doce e feroz...

Ele estava sendo testado.

E estava perdendo.

No fim do dia, Yago entrou no elevador com passos apressados. Só queria chegar em casa, tomar um banho e esquecer o quanto seu corpo estava quente.

Mas antes que a porta se fechasse, Matteo entrou.

O ar pareceu se comprimir instantaneamente.

Ambos ficaram lado a lado, em silêncio. Matteo não disse nada, mas seus olhos escuros pousaram sobre Yago como se o desnudassem. E mesmo sem tocá-lo, o corpo de Yago reagiu. A pele arrepiou, o cheiro mudou, a nuca latejou.

Matteo inspirou discretamente.

— Você tomou supressor hoje? — perguntou, a voz baixa, rouca.

Yago engoliu em seco.

— Sim... por quê?

— Porque o seu cheiro tá escapando — Matteo disse, virando o rosto devagar. — E tá me deixando louco.

O elevador parou no térreo, mas nenhum dos dois se moveu de imediato.

Yago sentiu o coração acelerar.

— Isso é... inadequado, senhor.

— Eu sei. — Matteo piscou devagar, um meio sorriso nos lábios. — E é por isso que você me intriga.

Ele saiu primeiro, deixando Yago ali, tremendo. Como se um furacão tivesse acabado de passar e ele não soubesse mais onde era o chão.

Na calçada, Clara esperava com dois cafés na mão.

Yago se aproximou devagar, ainda tentando regular a respiração.

— Você tá bem?

— Acho que... comecei a entender por que ninguém sobrevive ao olhar dele por muito tempo.

Clara deu um sorriso leve e ofereceu um café.

— Bem-vindo ao jogo. Só não se esqueça: mesmo quando a atração parece inevitável... quem define até onde vai, é você.

Yago olhou para o prédio alto atrás de si.

E mesmo tentando se convencer de que podia resistir, no fundo, já sabia.

Matteo Montgomery havia o tocado sem nem encostar.

E aquele jogo, perigoso e instintivo, só estava começando.

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