O sol já beijava o horizonte quando Helena chegou ao lago.
O caminho até ali era estreito, ladeado por árvores de galhos longos, que balançavam suavemente ao sabor do vento. O mundo parecia mais lento, como se cada segundo estivesse sendo estendido para que ela pudesse respirar com calma — algo que há muito tempo não fazia.
Usava um vestido simples, azul-claro, e cabelos presos de forma displicente. Nada de rendas, joias ou maquiagem. Apenas ela, inteira. Pela primeira vez desde que chegara àquele universo literário, não se sentia fingindo.
O lago era tão bonito quanto nas descrições do livro, mas ao vivo, era mais… real. As águas refletiam o céu em tons dourados e rosados, e os juncos à margem balançavam como se dançassem com a brisa. E ali, encostado numa velha árvore, ele a esperava.
Alexander Monteiro.
Com a jaqueta militar pendurada no ombro, camisa branca aberta no colarinho, as mangas arregaçadas e o olhar perdido nas águas. Por um segundo, ele parecia… jovem. Quase vulnerável.
Helena parou a poucos passos e esperou que ele notasse sua presença.
Ele virou-se devagar, como se já soubesse que ela viria.
— Pensei que poderia mudar de ideia — disse ele, com aquela voz baixa e firme que sempre parecia carregar mais do que dizia.
— Pensei também — respondeu ela, aproximando-se devagar. — Mas estou cansada de fugir.
Ele apontou para uma pedra larga à beira do lago, onde ela se sentou. Ele permaneceu em pé, como se hesitasse em se permitir o conforto da proximidade. Mas depois de alguns segundos, cedeu. Sentou-se ao lado dela, com os olhos ainda voltados para o espelho d’água.
— Este lugar — começou ele — era onde eu vinha quando precisava me lembrar de quem eu era… antes.
— Antes da guerra?
— Antes de tudo. Antes de perder.
O silêncio se acomodou entre eles, mas não era desconfortável. Era um silêncio cheio. Denso. Carregado de histórias que ainda não haviam sido contadas.
— Eu sei o que é perder — disse Helena, baixinho. — Só que as minhas guerras foram diferentes. Menos sangrentas. Mas igualmente devastadoras.
Ele a olhou de lado, como se a visse pela primeira vez.
— Você é tão diferente, Elisa.
Ela não corrigiu. Apenas devolveu o olhar.
— Talvez porque finalmente me tornei quem sempre fui. A versão de mim que estava presa, sufocada… silenciada.
Alexander respirou fundo.
— E por que está me envolvendo nisso?
— Porque o senhor é o único nesta história que nunca quis ser lido — respondeu ela, sem hesitar. — E eu… eu sempre quis saber o que havia por trás da armadura.
Por um instante, algo no rosto dele se quebrou. Uma rachadura na expressão controlada. Um lampejo de dor real.
— Eu amava minha esposa — disse ele, sem encarar Helena. — E quando ela morreu… a parte boa de mim morreu com ela. O resto… virou pedra.
— Isso é o que o senhor acredita — ela disse, suavemente. — Mas eu não vejo uma pedra. Vejo um homem cansado de fingir que não sente nada.
Ele a encarou, tenso.
— E se eu não tiver nada a oferecer além de escombros?
— Então que sejam escombros sinceros. Prefiro isso a castelos de mentiras.
A resposta dela o atingiu em cheio. Ele virou o rosto, como se fugisse do que sentia. Mas não disse nada. E naquele silêncio, Helena sentiu que havia ganhado algo raro: a confiança dele. Ainda não era amor. Ainda não era entrega. Mas era o primeiro tijolo de uma ponte.
A luz do sol começou a desaparecer por trás das árvores, lançando sombras longas sobre o lago. A brisa ficou mais fria. Helena se levantou devagar.
— Não vou pedir que confie em mim agora. Nem amanhã. Mas quero que saiba que não vim para consertar o senhor. Vim para caminhar ao lado. Se me deixar.
Alexander também se levantou. Estava perto agora. O suficiente para que ela sentisse o calor da respiração dele.
— Não sei como… lidar com isso. Com alguém como você. Alguém que parece saber demais.
— Eu não sei tudo — respondeu ela. — Mas sei como essa história termina… se nada mudar.
Ele franziu o cenho.
— Termina mal?
— Para mim, sim. Para o senhor… nem sequer há final. Só ausência.
Alexander ficou em silêncio. Por fim, deu um passo atrás.
— Então mude. A história. Comece você.
Helena assentiu. E, com um sorriso breve, se virou e caminhou de volta pela trilha, deixando o general às margens do lago — parado, observando não só a água, mas a si mesmo, como se a enxergasse pela primeira vez.
E em algum lugar, entre o céu e a terra, entre o que estava escrito e o que podia ser reescrito, algo se moveu.
Algo mudou.
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Atualizado até capítulo 45
Comments
New Biana
lindo esse cara.
também quero saber suas idades
2025-07-27
0
Rafaela Braga
qual sãos as idades deles?/Doubt//Doubt//Doubt/
2025-07-14
0
New Biana
Interessante
2025-07-27
0