5 - Primeiros dias, primeiras festas

A primeira semana na faculdade parecia um desfile caótico de tudo que eu não conhecia.

Rostos novos.

Prédios enormes.

Salas frias como geladeira industrial.

E um ponto de ônibus que mais parecia um encontro aleatório de mundos paralelos.

Acordei cedo no primeiro dia, tomei café de barriga embrulhada e abracei minha mochila nova como se ela fosse uma armadura.

Ela era vermelha, discreta, com um chaveiro de estrelinha pendurado no zíper — presente da Manu, como símbolo da nossa “nova era universitária”.

— Mel (pensando): Respira. É só o primeiro dia. Não é um jogo de sobrevivência… ainda.

Cheguei na faculdade meia hora antes da aula, como uma boa ansiosa treinada. Fiquei parada no pátio observando as tribos se formando naturalmente.

Meninas maquiadas como se fosse balada às sete da manhã.

Garotos com fones de ouvido no volume máximo e olhares de sono eterno.

E alguns como eu — com cara de "tô fingindo costume, mas por dentro tô gritando".

**

Entrei na sala e fui direto para o fundo.

O canto da observadora.

O território seguro de quem prefere assistir antes de agir.

Na terceira aula do dia — que eu mal sabia do que se tratava —, um grupo animado começou a se formar no centro da sala. Eles falavam alto, riam de qualquer coisa e compartilhavam memes em voz alta.

Uma menina de cabelo cacheado colorido e mochila lotada de chaveiros olhou pra mim e sorriu.

— Luana: Você é nova, né? Tô sentindo vibe de caloura perdida.

— Mel (rindo): Total. Mas… com cara de quem disfarça bem?

— Luana: Disfarça lindamente.

Se quiser sobreviver à faculdade sem surtar, senta com a gente no intervalo. Vamos te mostrar os segredos da selva.

— Mel: Fechou.

Mas só se no tour tiver parada estratégica pra café.

Nos tornamos, nos dias seguintes, as "sobreviventes da primeira semana".

Ríamos dos professores que falavam como apresentadores de podcast.

Reclamávamos dos que pareciam falar em código binário (matemática financeira, no caso).

E dividíamos nossos lanches como se cada mordida selasse um pacto de irmandade acadêmica.

**

Mas o que mais me intrigava naquela rotina nova não estava dentro da sala de aula.

Estava no ponto de ônibus.

Na volta pra casa, sempre havia um garoto que chegava quase junto com o ônibus, como se calculasse o tempo com precisão cirúrgica.

Moreno. Barba feita. Óculos de armação fina.

Tinha uma vibe silenciosa, quase invisível, mas que chamava atenção de quem prestava atenção nos detalhes.

Ele nunca sorria.

Mas também… nunca parecia triste.

Era como se fosse feito de silêncio.

— Mel (pensando): Ele parece um mistério ambulante com mochila nos pés.

Ficava ali, encostado no poste ou mexendo no celular.

Assim que o ônibus chegava, ele entrava, sentava perto da janela e colocava os fones.

Nunca puxava conversa.

Nunca olhava ao redor.

Mas um dia, decidi quebrar o padrão.

**

Cheguei mais cedo de propósito. O ponto estava vazio… exceto por ele.

Lá estava, com a mesma postura relaxada, olhando pro nada.

Respirei fundo e me aproximei.

— Mel: Oi.

Ele virou o rosto devagar, como se estivesse voltando de um lugar distante.

— ??? (surpreso): Oi…

— Mel: A gente pega o mesmo ônibus todo dia…

Mas nunca conversamos. Que curso você faz?

— ??? (baixo): Engenharia de Software.

— Mel: Uau. Pesado.

Tá em que ano?

— Matheus: Último. E você?

— Mel: Primeira semana. Contábeis. Ainda aprendendo a sobreviver sem parecer desesperada.

Pela primeira vez, ele soltou um meio sorriso.

Pequeno. Quase tímido. Mas verdadeiro.

— Matheus: No começo parece uma selva.

Depois vira rotina. Meio caótica… mas suportável.

— Mel (rindo): Você fala como quem sobreviveu a um apocalipse.

Ele deu de ombros. O ônibus se aproximou.

— Matheus: Talvez tenha sobrevivido mesmo.

Entramos juntos.

Ele foi pro mesmo lugar de sempre. Mas… dessa vez, tirou apenas um fone.

Sentei no banco atrás.

E passei o resto do caminho sorrindo sozinha como quem acabou de abrir um presente inesperado.

**

Na sexta-feira, rolou a primeira festa da turma de Contábeis.

Não era exatamente uma festa — mais uma bagunça organizada por caloros com sono e esperança.

Tinha refrigerante barato, música variando entre forró, pop e funk, e uns trocados investidos em luzes coloridas improvisadas.

— Luana: Já tem grupo de trabalho?

— Mel: Tô fazendo análise criteriosa de confiabilidade.

Ou seja: ainda não confio em ninguém.

— Luana: Regra de ouro:

Nunca confie em quem diz “relaxa, eu faço a parte mais difícil”.

Rimos alto.

Lá pelas onze, cansada, fui me sentar no cantinho da área externa. O som estava mais baixo ali. Eu gostava de observar as pessoas — de ver como cada um mostrava uma parte de si quando pensava que ninguém estava reparando.

Foi então que vi.

Ele.

Matheus.

Chegando devagar, sozinho, como sempre.

Cumprimentou um colega do curso dele com um aceno discreto. Ficou parado alguns minutos perto da escada…

E quase sem fazer barulho, foi embora.

Mas, antes de sair, nossos olhos se cruzaram.

Foi um segundo.

Talvez menos.

Mas foi como se o tempo piscasse entre nós.

**

— Mel (pensando): O que ele tá fazendo aqui?

E por que esse olhar parece uma pergunta silenciosa?

Voltei pra sala sem comentar nada com ninguém.

Mas dentro de mim, algo novo se instalava.

Era só o começo.

Mas eu já sabia.

Com aquele sexto sentido que só quem já viveu borboletas no estômago entende…

Matheus não era só o garoto do ponto.

Ele seria muito mais.

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