O fim de semana passou como um borrão de silêncios e lembranças. O corpo de Lorena ainda carregava as marcas daquela noite no escritório: os arranhões nos ombros, os beijos no pescoço, o sabor dele preso entre os lábios. Mas o que mais doía não era o prazer. Era o que vinha depois.
A culpa. A confusão. E aquele medo familiar de confiar demais.
Na segunda-feira, ela chegou mais cedo ao trabalho. Queria estar sozinha. Mas ao abrir a porta da própria sala, encontrou um envelope sobre sua mesa.
Nenhuma assinatura. Nenhuma palavra.
Apenas uma foto.
Ela congelou.
Era antiga, mas inconfundível: ela, ainda estudante de direito, deitada sobre um corpo ensanguentado. O rosto jovem, desesperado, sujo de sangue.
A cena que passou anos tentando esquecer.
O que fazia aquela foto ali?
Seu coração disparou. Ela trancou a porta da sala, as mãos tremendo. Sabia exatamente o que era aquilo: alguém a estava ameaçando. Alguém sabia o que ela tinha feito — ou deixado de fazer — naquela noite, anos atrás, quando seu ex-namorado foi encontrado morto, e ela jurou que jamais contaria a verdade.
O celular vibrou. Uma mensagem anônima apareceu:
“Você não é tão limpa quanto finge ser, doutora.”
Ela sentiu o estômago revirar. Quem estava por trás daquilo?
— Está pálida. — A voz de Caio a tirou do transe. Ele estava parado à porta, observando-a com olhos atentos. — Aconteceu alguma coisa?
Ela tentou esconder a foto, mas ele já havia visto.
— Lorena… — ele entrou, fechando a porta atrás de si. — O que é isso?
— Não é da sua conta — ela respondeu, firme, guardando o envelope.
— Agora é. Você se meteu comigo, lembra?
— E você se meteu comigo sem saber quem eu sou.
— Então me diz — ele se aproximou — quem é você de verdade?
Ela hesitou. Pela primeira vez, o escudo dela parecia trincado. E pela primeira vez, ela quis que alguém soubesse… mesmo que fosse ele.
— Há seis anos, eu estava em um relacionamento abusivo — começou, a voz baixa. — Ele me controlava, me humilhava. E numa noite, ele passou dos limites. Eu me defendi… e quando percebi, ele estava no chão. Sangrando.
— Você o matou?
— Não. — Ela o encarou. — Mas não chamei ajuda. Não impedi que morresse.
Caio respirou fundo. Não havia julgamento em seu olhar. Apenas algo que ela não esperava: compreensão.
— Às vezes, a justiça não cabe nas mãos da lei — ele disse. — E às vezes, os monstros merecem cair.
Ela se aproximou devagar, os olhos nos dele.
— Você vai usar isso contra mim?
— Não. Mas agora estamos quites.
Ela sorriu de leve, quase com dor.
— Isso não nos torna bons, Caio.
— Não. Nos torna perigosos.
Ele a puxou pela cintura, beijando-a de novo. Mas dessa vez, o beijo não era só desejo — era alívio, cumplicidade, raiva contida. Dois corpos marcados por passado e culpa. Dois corações quebrados demais para amar do jeito certo… mas incapazes de parar de se procurar.
E enquanto se entregavam ali, sobre a mesa novamente, algo ficou claro para os dois:
Eles não eram salvação um do outro.
Eram perdição.
***Faça o download do NovelToon para desfrutar de uma experiência de leitura melhor!***
Atualizado até capítulo 41
Comments