03

Vanessa_Pov

Acordei antes do despertador, o que não era comum aos sábados. Talvez porque, desde que Bianca chegara, nada mais fosse comum naquela casa. Olhei para o teto, sentindo o coração bater num ritmo estranho, desconfortável, como se meu corpo ainda estivesse processando o toque dela na noite anterior.

Respirei fundo e me obriguei a levantar. Hoje eu não ia ao hospital, o que significava ter que encarar Bianca por mais tempo do que gostaria. Vesti uma roupa leve, prendi o cabelo de qualquer jeito e desci as escadas em silêncio, determinada a recuperar algum domínio sobre mim mesma e a minha casa.

A cozinha estava surpreendentemente calma. Renata bebia café sentada à mesa, usando um vestido florido, cabelos soltos e um sorriso incomum nos lábios. Me aproximei, cautelosa.

— Bom dia — ela disse com uma suavidade que me deixou desconcertada. Levantou-se e beijou-me no rosto, demorando mais do que o habitual. — Dormiu bem?

— Sim… e você?

— Muito bem. Acordei pensando que seria ótimo passarmos o dia na piscina hoje. O tempo está perfeito, e Clara adoraria. Acho que precisamos de um momento juntas, em família.

Olhei para ela, desconfiada daquela mudança repentina de atitude. Mas antes que pudesse responder, Bianca entrou na cozinha, com shorts jeans curto e camiseta clara. Os cachos claros caíam sobre os ombros, ainda úmidos do banho. O sorriso inocente era quase convincente.

— Bom dia, tia. Bom dia, doutora. — disse educadamente, sentando-se à mesa. — O cheiro do café tá ótimo hoje.

Renata sorriu carinhosa para a sobrinha, colocando uma xícara cheia para ela.

— Bom dia, querida. Dormiu bem?

— Perfeitamente — Bianca respondeu, sem lançar sequer um olhar em minha direção. Como se absolutamente nada tivesse acontecido entre nós ontem à noite.

Senti meu corpo inteiro reagir à presença dela, lembrando claramente o calor de seu toque. Raiva, desejo e frustração se misturaram numa confusão irritante. Precisei desviar o olhar para a janela, fingindo interesse no jardim, para disfarçar minha perturbação.

— Acho uma ótima ideia — respondi por fim, recuperando a voz. — Clara vai adorar mesmo. Podemos aproveitar e relaxar um pouco.

Bianca me olhou brevemente, um sorriso quase imperceptível desenhado no canto dos lábios, como se soubesse exatamente o que significava aquele meu fingido autocontrole.

Nesse momento, Clara apareceu, correndo animada para abraçar Bianca primeiro, antes de vir até mim. Meu coração apertou ao notar o carinho genuíno que havia se formado entre as duas em tão pouco tempo.

— A gente vai brincar na piscina hoje, mamãe?

— Vai sim, amor. Vamos todos juntos.

Clara deu um gritinho animado, puxando a mão de Bianca com entusiasmo infantil.

— Você sabe nadar, Bia? Vai entrar comigo?

— Claro, princesa. Vou cuidar de você na água.

Olhei aquela cena com desconforto, percebendo que Bianca não apenas invadira meu espaço emocional, mas também o de Clara. Aquilo deveria me irritar profundamente, mas ao invés disso, senti algo ainda pior: um leve aperto no peito.

Renata interrompeu o silêncio que se formou, acariciando meu ombro gentilmente, de forma inesperada. O toque suave dela, algo tão raro ultimamente, fez com que Bianca desviasse rapidamente o olhar, incomodada, ainda que disfarçasse com perfeição.

— Vai ser um ótimo dia — Renata garantiu, olhando diretamente nos meus olhos com uma ternura que parecia esquecida. — Nós merecemos isso.

Bianca olhou para a xícara de café à sua frente, claramente incomodada, mas recuperou rapidamente a postura tranquila, voltando a atenção para Clara e ignorando solenemente a proximidade entre Renata e eu.

A tensão silenciosa daquela cozinha era palpável. Bianca tinha acabado de mostrar que era perfeitamente capaz de ser duas pessoas diferentes: uma sobrinha inocente e perfeita diante de Renata, e a própria tentação disfarçada quando ninguém estivesse olhando.

Mas hoje eu não cederia.

Hoje, eu retomaria o controle.

Ou ao menos era o que eu tentava desesperadamente acreditar.

(...)

A manhã avançou lentamente, sob o sol quente que esquentava o gramado e iluminava a água azul da piscina. Deitada numa espreguiçadeira, observava Clara brincar animada com Bianca, enquanto Renata lia tranquilamente ao meu lado.

Era quase surreal como a cena parecia comum, como se não houvesse algo estranho pairando no ar. Bianca parecia absolutamente confortável ali, como se aquela casa e aquela família sempre tivessem sido dela. Clara estava radiante, rindo enquanto Bianca a girava na água, os cachos dourados dela brilhando ao sol.

Tentei focar na minha filha, em como ela estava feliz naquele momento, mas meus olhos inevitavelmente voltavam para Bianca, para o jeito como seu corpo se movia na água com facilidade quase provocativa.

— Você está pensativa hoje — Renata murmurou suavemente, pousando o livro sobre a mesa ao lado e tocando minha mão com delicadeza inesperada. — Está tudo bem, amor?

Olhei para ela, surpresa com aquela demonstração repentina de carinho.

— Sim. Só pensando em algumas coisas do hospital — menti parcialmente.

Renata sorriu, um sorriso doce e raro que há muito eu não via. Ela se inclinou e beijou-me suavemente nos lábios, demorando-se o suficiente para que o gesto se tornasse significativo. Senti um arrepio leve percorrer minha espinha; fazia tempo demais desde que havíamos compartilhado qualquer tipo de intimidade real.

Quando ela se afastou, meus olhos imediatamente buscaram Bianca. Ela nos observava da piscina, segurando Clara contra o peito enquanto a menina brincava de bater os pés na água. Por uma fração de segundo, a expressão dela se fechou numa mistura de irritação e algo mais profundo, talvez possessividade. Mas tão rapidamente quanto surgiu, desapareceu atrás de um sorriso inocente.

Bianca desviou os olhos, voltando a atenção exclusivamente para Clara, enquanto meu coração acelerava sem motivo aparente.

— Você acha mesmo que Bianca vai pedir desculpas para Marta? — Renata perguntou, distraída, ajeitando-se novamente na espreguiçadeira.

— Ela precisa — respondi, tentando voltar ao controle daquela conversa. — Não podemos perder Marta por algo tão infantil.

— Não acho que Bianca seja infantil. Ela só é... impulsiva. — Renata sorriu levemente, parecendo admirar a sobrinha à distância. — Você já percebeu o quanto Clara gosta dela?

— Percebi. Só não sei se isso é algo bom — admiti, franzindo o cenho ao observar como Clara agora ria com Bianca, como se fossem melhores amigas há anos.

— Não seja tão dura, Vanessa. Bianca pode ser exatamente o que essa casa precisa agora. Um pouco de juventude, vida nova...

— Ou caos — completei, secamente.

Renata riu, como se eu tivesse feito uma piada engraçada, voltando sua atenção para o livro.

Alguns minutos depois, Bianca saiu da piscina carregando Clara nos braços, enrolada numa toalha grande. Ela se aproximou de nós com aquele sorriso inocente que agora eu sabia que era perfeitamente falso.

— Clara precisa de água. Vou pegar pra ela — anunciou docemente, colocando Clara cuidadosamente na cadeira ao meu lado.

Antes que eu pudesse dizer algo, Bianca caminhou até a cozinha, deixando-me inquieta. Era impossível relaxar perto dela. Ela sempre parecia estar um passo à frente.

— Mamãe, Bianca é incrível! — Clara falou empolgada, sacudindo as perninhas e sorrindo.

— É, filha, ela realmente sabe como conquistar as pessoas — respondi, mais para mim do que para Clara.

Quando levantei o olhar, Bianca estava de volta, entregando a garrafa de água para Clara com delicadeza exagerada. Ela aproveitou para se inclinar perto de mim, sob o pretexto de ajeitar algo na cadeira da menina, e falou baixo o suficiente para que apenas eu ouvisse:

— Fica linda quando está tentando me ignorar, doutora. Quase acredito.

Ela se afastou em seguida, sentando-se ao lado de Renata e puxando conversa sobre algo trivial, como se nada tivesse acabado de acontecer.

Senti o rosto esquentar, o coração bater mais rápido do que deveria. Era ridículo como uma garota conseguia me desestabilizar tão facilmente.

Eu precisava reagir, precisava voltar ao controle antes que fosse tarde demais. Só que, no fundo, sabia que já estava perigosamente próxima do ponto sem volta.

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Comments

Fran Silva

Fran Silva

Coitada da Vanessa em essa Bianca e fogo kkkk

2025-09-19

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