A Chama que Arde Mesmo Longe
O quarto de Aric cheirava a mirra e cinzas frescas.
O corpo de Laedra ainda estava enroscado ao dele, mas a pele dela, fria após o calor, não acalmava a inquietação que crescia dentro dele.
Ele não conseguia dormir.
E isso não era comum.
Era noite de lua cheia — o auge do poder de um Comandante.
Mas em vez de sentir força, ele sentia…
Falta.
Laedra virou-se, sorrindo preguiçosa.
— Ainda pensa nela?
— Não — respondeu rápido demais.
Ela se levantou nua, o cabelo cor de cobre caindo pelas costas.
Pegou a túnica leve e amarrou na cintura com um sorriso ensaiado.
— Se pensa, tudo bem.
Só não minta pra mim, Aric.
Não sou tola como ela era.
— Calanthe não era tola.
A frase saiu antes que ele percebesse.
O silêncio entre os dois se estendeu.
Laedra encarou-o de forma dura.
Depois, riu sem humor.
— É sempre assim com os homens marcados.
Vocês se apaixonam por quem dá tudo…
E depois abandonam porque não sabem o que fazer com alguém que não precisa de vocês.
Ela saiu, batendo a porta com força.
—
Aric ficou sozinho.
O brasão do Comando Flamejante estava pendurado acima da lareira — uma chama dourada com duas espadas cruzadas.
Mas aquela sala parecia menos quente do que antes.
Havia cinzas demais.
—
Foi então que um envelope foi deslizado por debaixo da porta.
Sem selo real.
Sem brasão.
Somente uma pequena inscrição, escrita em prata:
“Para Aric Solmar. Quando estiver sozinho.”
Ele hesitou.
Mas as mãos abriram sozinhas.
O papel queimava levemente nas bordas — a marca da assinatura de Calanthe.
As letras, quando lidas em voz baixa, vibravam dentro do peito.
Como se tivessem alma.
Como se fossem vivas.
“Você me pediu minha força.
E eu dei.
Você me pediu minha alma.
E eu entreguei...”
A cada linha, a lembrança vinha como uma labareda.
O sangue no campo de batalha.
O momento em que sentiu sua alma escapando…
E ela, Calanthe, ajoelhada diante dele, com a palma da mão em chamas, unindo a dele à dela, selando o salvamento.
O calor… a salvação… e o peso.
Ele segurou a carta com mais força.
“Hoje seria nosso aniversário.
Mas você não voltou.
Você não quebrou a promessa…
Você a queimou.”
As últimas palavras arderam como se tivessem sido escritas com ferro quente.
Ele se levantou num impulso, empurrando a cadeira para trás.
Olhou em volta.
Sozinho.
Mas sentia.
Como se ela ainda estivesse ali.
Na lareira.
Na madeira.
No ar.
A Marca de Chama no fundo da nuca começou a pulsar.
Ele passou a mão por cima.
Não estava com febre.
Mas seu corpo tremia.
—
No dia seguinte, Aric compareceu ao Conselho das Chamas.
Olhares o seguiam.
Todos sabiam da união recente com Laedra — filha de um General do Leste, politicamente vantajosa.
Mas ninguém ousava mencionar Calanthe.
Ela estava sumida.
E muitos diziam que havia aceitado o Fogo Final, o renascimento da morte sem memória.
Aric sabia que não era verdade.
Porque ele ainda sentia.
A cada vez que fechava os olhos.
—
Naquela noite, Laedra retornou.
Tentou envolvê-lo novamente.
Mas algo havia mudado.
Ele não conseguia tocar nela sem pensar na carta.
Nas palavras.
Na dor silenciosa.
Na força de quem o salvou… e agora morria sozinha.
—
Do lado de fora, uma figura encapuzada observava a janela da fortaleza.
Era a serva de Calanthe.
Ela carregava a segunda carta.
Mas ainda não a entregaria.
Não enquanto ele não sentisse a primeira queimando o suficiente.
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Atualizado até capítulo 31
Comments
Jane Silva
sempre com belas histórias
2025-08-05
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