Capítulo 2

A Chama que Arde Mesmo Longe

O quarto de Aric cheirava a mirra e cinzas frescas.

O corpo de Laedra ainda estava enroscado ao dele, mas a pele dela, fria após o calor, não acalmava a inquietação que crescia dentro dele.

Ele não conseguia dormir.

E isso não era comum.

Era noite de lua cheia — o auge do poder de um Comandante.

Mas em vez de sentir força, ele sentia…

Falta.

Laedra virou-se, sorrindo preguiçosa.

— Ainda pensa nela?

— Não — respondeu rápido demais.

Ela se levantou nua, o cabelo cor de cobre caindo pelas costas.

Pegou a túnica leve e amarrou na cintura com um sorriso ensaiado.

— Se pensa, tudo bem.

Só não minta pra mim, Aric.

Não sou tola como ela era.

— Calanthe não era tola.

A frase saiu antes que ele percebesse.

O silêncio entre os dois se estendeu.

Laedra encarou-o de forma dura.

Depois, riu sem humor.

— É sempre assim com os homens marcados.

Vocês se apaixonam por quem dá tudo…

E depois abandonam porque não sabem o que fazer com alguém que não precisa de vocês.

Ela saiu, batendo a porta com força.

Aric ficou sozinho.

O brasão do Comando Flamejante estava pendurado acima da lareira — uma chama dourada com duas espadas cruzadas.

Mas aquela sala parecia menos quente do que antes.

Havia cinzas demais.

Foi então que um envelope foi deslizado por debaixo da porta.

Sem selo real.

Sem brasão.

Somente uma pequena inscrição, escrita em prata:

“Para Aric Solmar. Quando estiver sozinho.”

Ele hesitou.

Mas as mãos abriram sozinhas.

O papel queimava levemente nas bordas — a marca da assinatura de Calanthe.

As letras, quando lidas em voz baixa, vibravam dentro do peito.

Como se tivessem alma.

Como se fossem vivas.

“Você me pediu minha força.

E eu dei.

Você me pediu minha alma.

E eu entreguei...”

A cada linha, a lembrança vinha como uma labareda.

O sangue no campo de batalha.

O momento em que sentiu sua alma escapando…

E ela, Calanthe, ajoelhada diante dele, com a palma da mão em chamas, unindo a dele à dela, selando o salvamento.

O calor… a salvação… e o peso.

Ele segurou a carta com mais força.

“Hoje seria nosso aniversário.

Mas você não voltou.

Você não quebrou a promessa…

Você a queimou.”

As últimas palavras arderam como se tivessem sido escritas com ferro quente.

Ele se levantou num impulso, empurrando a cadeira para trás.

Olhou em volta.

Sozinho.

Mas sentia.

Como se ela ainda estivesse ali.

Na lareira.

Na madeira.

No ar.

A Marca de Chama no fundo da nuca começou a pulsar.

Ele passou a mão por cima.

Não estava com febre.

Mas seu corpo tremia.

No dia seguinte, Aric compareceu ao Conselho das Chamas.

Olhares o seguiam.

Todos sabiam da união recente com Laedra — filha de um General do Leste, politicamente vantajosa.

Mas ninguém ousava mencionar Calanthe.

Ela estava sumida.

E muitos diziam que havia aceitado o Fogo Final, o renascimento da morte sem memória.

Aric sabia que não era verdade.

Porque ele ainda sentia.

A cada vez que fechava os olhos.

Naquela noite, Laedra retornou.

Tentou envolvê-lo novamente.

Mas algo havia mudado.

Ele não conseguia tocar nela sem pensar na carta.

Nas palavras.

Na dor silenciosa.

Na força de quem o salvou… e agora morria sozinha.

Do lado de fora, uma figura encapuzada observava a janela da fortaleza.

Era a serva de Calanthe.

Ela carregava a segunda carta.

Mas ainda não a entregaria.

Não enquanto ele não sentisse a primeira queimando o suficiente.

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Jane Silva

Jane Silva

sempre com belas histórias

2025-08-05

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