O domingo amanheceu em Sorocaba com uma promessa diferente no ar para Anne. A luz da manhã que entrava pela janela de seu quarto não era apenas o sol, mas um reflexo do brilho que sentia por dentro. A noite anterior, culminando naquele beijo que reescreveu todas as suas expectativas, reverberava em cada fibra do seu ser. O sabor do beijo de Rael, a doçura do reconhecimento, a forma como as mãos fortes dele a seguraram... Tudo era tão real, tão palpável, que ela precisava se beliscar para ter certeza de que não estava sonhando novamente.
Seu celular, que havia dormido ao lado do travesseiro, permaneceu intocado por alguns minutos. Anne se conteve. Queria ligar, mandar uma mensagem, mas a etiqueta ditava um pouco de paciência. Ele havia dito que ligaria assim que pudesse, afinal. Ela se levantou, os cabelos castanhos levemente ondulados caindo sobre seus ombros enquanto se movia. A pele clara dela ainda parecia formigar, e seus olhos castanhos escuros refletiam uma alegria que não conseguia esconder.
O café da manhã, geralmente um momento de revisão de estudos ou planejamento da semana, transformou-se em um ritual de espera. Cada notificação do celular a fazia saltar, mas eram apenas os grupos de amigos ou notícias irrelevantes. Foi só perto do meio-dia que a tela vibrou com um nome que acelerou seu coração: Rael.
A mensagem era simples, mas carregada da ternura que ela já reconhecia nele:
"Bom dia, Anne. Espero que o seu seja tão bom quanto o meu. O beijo de ontem ainda está em replay na minha mente. Voo tranquilo. Cheguei em São Paulo. Me liga quando puder, quero ouvir sua voz. Saudade inesperada. Rael."
Um sorriso radiante se abriu no rosto de Anne. "Saudade inesperada." A frase ressoou em sua alma, confirmando que a conexão não era unilateral, que ele sentia o mesmo. Ela discou o número dele sem hesitação, o polegar forte e decisivo.
"Alô?", a voz de Rael soou, grave e um pouco cansada, mas com um tom que se iluminou ao ouvir o nome dela.
"Oi, Rael! Bom dia!", Anne respondeu, a voz cheia de uma doçura que ela não se lembrava de ter. "Chegou bem? Já está na correria?"
"Cheguei sim, Anne. O voo foi tranquilo, mas o trânsito de São Paulo nunca colabora", ele riu. "Já estou no escritório, mas tive que parar um minuto para te mandar mensagem. Minha cabeça está tentando conciliar a apresentação de amanhã com a lembrança dos seus olhos e... bom, do nosso beijo."
Anne sentiu as bochechas esquentarem. "É, o beijo... ainda estou tentando processar."
"Processar e querer mais, eu espero", ele brincou, e ela pôde ouvir o sorriso em sua voz. "Você não sabe como foi difícil sair daí. Mas a responsabilidade do CEO não espera."
Eles conversaram por quase quinze minutos, um tempo precioso no dia atribulado dele. Ele contou um pouco sobre a agenda da semana em São Paulo – reuniões com investidores, visitas a novas instalações, conferências. Anne, por sua vez, falou sobre sua aula de cálculo estrutural, sobre a dificuldade de se concentrar nos estudos agora que sua mente estava dividida entre vigas e a imagem dele. A cada palavra, a intimidade crescia, tecendo um fio invisível que conectava Sorocaba a São Paulo.
"Eu sinto falta do seu sorriso já, sabia?", ele confessou, a voz mais suave. "É estranho. A gente se conhece há tão pouco tempo, mas sinto como se estivesse te esperando há uma vida."
"Eu sei exatamente o que você quer dizer", Anne murmurou, com os olhos castanhos escuros marejados de uma emoção feliz. "É como se o tempo que a gente não se conhecia fosse o tempo perdido, e agora estamos correndo para compensar."
A conversa se encerrou com a promessa de se falarem à noite e o desejo mútuo de que a semana passasse rápido.
Os dias que se seguiram foram uma mescla curiosa da rotina familiar de Anne com a nova e emocionante presença de Rael. Ela mergulhava nos estudos de Arquitetura, nas aulas da PUC, nos trabalhos em grupo, mas cada intervalo, cada pausa, era preenchida pela expectativa. Seu celular tornou-se uma extensão de sua mão. As mensagens de Rael chegavam em horários variados – um "bom dia" apressado antes de uma reunião, uma foto de uma vista de São Paulo com a legenda "Pensando em você", um áudio com a voz rouca no final de um dia exaustivo.
Rael, o CEO, mostrava-se um homem de extremos. De dia, ele era um estrategista perspicaz, lidando com números e negociações milionárias, tomando decisões que impactavam centenas de funcionários. À noite, nas longas chamadas de vídeo, ele se transformava no Rael que Anne conheceu no bar – atencioso, curioso, engraçado, e vulnerável. Ele contava sobre as frustrações do dia, sobre a saudade da família que morava em Minas Gerais, sobre o tédio dos jantares de negócios solitários.
"É louco, Anne", ele confessou em uma noite, a voz ecoando pelo viva-voz enquanto ela caminhava pelo seu pequeno apartamento em Sorocaba. "Minha vida é uma correria sem fim. Mas quando seu nome aparece na tela, ou quando a gente se fala, tudo para. É como um oásis. Você é o meu oásis no meio do deserto corporativo."
Anne sentia o coração derreter com as palavras dele. Ela compartilhava suas próprias angústias de estudante, as noites em claro para entregar projetos, a pressão do último ano da faculdade. "E você é a minha inspiração, Rael. Às vezes, quando a maquete não sai, ou o projeto não encaixa, eu lembro que meu 'homem do sonho' existe, e isso me dá um gás a mais."
A distância, paradoxalmente, serviu para aprofundar a intimidade deles. Sem a pressão da presença física, eles se abriram mais sobre suas histórias de vida, seus medos, seus sonhos. Anne descobriu que Rael, apesar de sua posição de poder, era incrivelmente humilde e valorizava as coisas simples da vida. Ele, por sua vez, se encantava com a inteligência e a sensibilidade de Anne, com a paixão dela por criar e a forma como ela via beleza em cada canto de Sorocaba.
As amigas de Anne não demoraram a perceber a mudança. O brilho em seus olhos, o sorriso constante, o fato de ela estar sempre com o celular por perto. "Quem é o mistério, Anne?", perguntou Carol, uma de suas melhores amigas, durante um almoço na faculdade. "Você está radiante!"
Anne hesitou, mas a alegria era grande demais para guardar. Contou a história desde o sonho, passando pelos encontros "casuais" e o beijo no bar. Carol e Marina, a outra amiga, ouviram com os olhos arregalados.
"Você está dizendo que o homem dos seus sonhos, literalmente, apareceu na sua vida?", Marina perguntou, descrente e fascinada ao mesmo tempo. "Isso é roteiro de filme, Anne!"
"Ele é um CEO que está aqui a trabalho, Rael", Anne explicou, mostrando uma foto discreta que ele havia enviado de um almoço de negócios. "E ele sentiu a mesma coisa. Falamos sobre isso. É insano, eu sei!"
As amigas estavam céticas, mas fascinadas. "Cuidado, amiga", aconselhou Carol. "Homem CEO que está só 'a trabalho' na cidade pode ter a data de validade curta. Não se joga de cabeça tão rápido."
Anne agradeceu a preocupação, mas sabia que era diferente. Havia algo em Rael, na profundidade de seus olhos, na sinceridade de sua voz, que a fazia confiar. A intuição que seu sonho havia plantado era mais forte do que qualquer ceticismo.
A semana se arrastou, mas a ansiedade pelo reencontro crescia a cada dia. As conversas de Rael com ela começaram a incluir planos. Ele disse que voltaria a Sorocaba no próximo fim de semana para um último ajuste no projeto antes de uma fase de consolidação.
"O que você vai fazer na sexta à noite?", Rael perguntou em uma ligação na quinta-feira. "Meus compromissos terminam mais cedo. Queria te levar para jantar. E talvez... te dar outro beijo que não saia da sua cabeça."
O coração de Anne disparou. "Eu adoraria, Rael. Minha agenda está livre para você."
A sexta-feira chegou, e com ela, uma leve chuva em Sorocaba, lavando as ruas e deixando um cheiro de terra molhada no ar. Anne sentiu que o tempo havia conspirado para tornar a espera ainda mais doce. Ela passou o dia em um misto de euforia e nervosismo. Queria que ele chegasse logo, que a distância se dissolvesse, que a realidade do sonho se tornasse palpável novamente.
Ao final da tarde, Rael enviou uma mensagem: "Cheguei em Sorocaba. Estou exausto da viagem, mas cheio de energia para te ver. Me dá uns minutos para me instalar e te pego às 20h. Beijo. Rael."
Anne sorriu para o celular. Aquele "beijo" no final da mensagem, tão natural, já era familiar. Ela sentiu que o universo, depois de tantos sinais, estava finalmente alinhando os astros para que a realidade de seu sonho florescesse sem impedimentos. A espera havia valido a pena.
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Atualizado até capítulo 23
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