A mansão Shadowthorn Parte 1

A mansão do vampiro ficava na Floresta dos Gritos, que tinha esse nome por causa dos pântanos horrendos onde se dizia que as bruxas se reuniam para praticar vodu e feitiçaria, ecoando gritos para Satã ou entidades da crença vodu que, honestamente, Leonor desconhecia quais eram. Leonor conhecia a história do pântano, mas não sabia muito do mundo sobrenatural ao qual os mitos e lendas se referiam.

Mas Caim sabia vagamente ao que e em quem as lendas daquela floresta se baseavam. Ainda assim, ele era o verdadeiro diabo daquela floresta. Não havia nenhuma entidade infernal ou elementar por lá além dele e, quando estavam juntos, Judas. Eles assombraram  o lugar quando viveram lá juntos.

O castelo localizava-se pouco depois da ponte do Rio das Almas, o território mais assombrado de Hellgate, uma região que os moradores evitavam a todo custo.

 A cidade em si já possuía um nome sinistro, pois dizia-se que ali foi onde um anjo caído tombou, e Deus amaldiçoou o lugar. Todos tentavam sair, mas havia algum tipo de maldição que os fazia sempre voltar, vivos ou mortos.

Embora a magnífica e mística mansão de pedra se destacasse, apresentava certo desleixo. O brilho da lua cheia era como um clarão, permitindo que Leonor visse como a estrutura estava decadente.

 O musgo crescia sobre as pedras que formavam a gigantesca infraestrutura da casa. As fontes, de água esverdeada, estavam paradas. E o portão de grades pretas,  entrada da mansão, estava enferrujado e emitia um rangido estranho quando passaram por ele.  Contudo, era estranhamente reconfortante. Ela não saberia explicar a razão racionalmente, mas só de não estar sendo um cadáver na água do rio já era algo benéfico.

No jardim, ervas daninhas tomavam conta de todos os canteiros de plantas que deveriam ser belas, ladeados por divisórias de linhas marcadas por pedras brancas que agora estavam marrons e cobertas por grama.

Na mansão... Glicínias cresciam pelas paredes, infiltrando-se nas rachaduras das pedras. As janelas eram vitrais multicoloridos com imagens sacrossantas, quase como num castelo gótico. A casa respirava um ar ancestral, místico, opressor, fazia todo o sentido como lar de um vampiro. Ainda assim, era evidente que, nos seus anos de ouro, a propriedade fora magnífica. As fontes de água, as roseiras, as estátuas no jardim... Tudo era lindo, apesar dos sinais do tempo e do descuido.

A mulher que caminhava atrás de Caim parecia fascinada com o lugar, que parecia ter vida própria. Era algo encantador no meio daquela área pantanosa. Ela nunca imaginou que houvesse algo depois da Ponte dos Suicidas, da Ponte das Bruxas ou do Rio das Almas. Ninguém se arriscava na Floresta dos Gritos por medo de encontrar o diabo... ou o Papa Legba.

— Vou renovar tudo assim que tiver tempo — disse Caim, sondando sua nova esposa.

Aquilo era uma mentira deslavada. Ele teve séculos para reformar a mansão e nunca o fez. Talvez o fizesse agora por causa dela. Queria que sua serva fosse feliz e estivesse confortável.

A Mansão Shadowthorn nunca lhe importou, exceto em 1666, quando Judas desejava que tivessem um lar naquele fim de mundo esquecido por Deus. Judas sempre tentava fugir da Divindade e do pecado que cometeu contra o Filho de Deus.

E Caim queria vê-lo feliz, longe do julgamento divino, ou do que Judas acreditava ser o julgamento divino. Mas a verdade é que Deus não se importava com ninguém.

Leonor, por outro lado, estava feliz por ter um teto onde passar a noite, depois de ser expulsa de seu apartamento. A única gentileza do síndico foi permitir que deixasse os pertences lá até encontrar outro lugar. Mas a ideia era nunca buscá-los. Antes de Caim encontrá-la naquela ponte, Leonor ia se matar.

— Você vive aqui? — ela perguntou, enquanto o seguia até uma grande porta de madeira com uma aldrava em forma de leão.

Caim pegou uma chave velha do bolso da calça jeans preta, vestida para não parecer antiquado entre os humanos, levou-a à fechadura, destrancou a porta e a abriu. Entraram os dois. Ele fechou e trancou a porta, deixando a chave dourada na fechadura para o caso de Leonor querer sair.

A mansão cheirava a cera de vela, poeira e a mofo.

Um regresso ao passado, pensou Leonor.

O chão era de mármore escuro, como um espelho negro que refletia os dois e os vitrais multicoloridos. Havia candelabros de ouro apoiados em colunas gregas da altura de muretas ou mesas, com velas brancas que, pelo cheiro a cera, certamente eram acesas com frequência. Uma lareira belíssima decorada com leões estava apagada.

As velas se acenderam com um simples aceno de mão de Caim, iluminando a casa decadente: sofás seculares puídos por traças, vermelhos, um tapete persa sobre o mármore negro. Quem decorou aquela casa, mesmo há séculos, tinha muito bom gosto.

Judas era requintado e perfeccionista. Caim nunca ligou para a casa, os móveis importados, o órgão de tubos que Judas amava tocar. Tudo aquilo era por causa de Judas. Se dependesse de Caim, ele dormiria numa cripta no cemitério. Mórbido, mas seguro.

Leonor suspirou profundamente. Não havia ali nada do mundo moderno. Era como se o tempo tivesse parado. Mas o requinte permanecia. Bastaria uma boa limpeza e estaria habitável. Embora ela presumisse que ele não possuísse nem um aspirador de pó.

— Vai dormir no sofá que está sem traças esta noite — determinou ele, sondando-a. — Amanhã à noite, vou começar os preparativos para tornar esse lugar o mais confortável possível para si. Há dinheiro ali.

Ele apontou para um belo jarro de porcelana chinesa com desenhos de dragões vermelhos, sobre uma das colunas semelhantes a pequenas mesas. Era curioso como sua linguagem alternava entre o arcaico e o moderno.

— Pode usar o quanto precisar para comer e, se sair, tranca a casa e leva a chave. A chave está na fechadura. Apareça aqui ao fim da tarde, se quiser ouvir minha proposta...

Leonor estava ciente de que aquele ser poderia matá-la se quisesse. Mas, como uma suicida, sua curiosidade venceu o medo.

Ela apenas assentiu para tudo que ele disse. Caim suspirou.

— Desejo-te uma boa noite — despediu-se, solene.

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Comments

Pamella Pampam

Pamella Pampam

Gente caim e judas ?! estou muito curiosa.

2025-07-11

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