O convite havia chegado por meio de um e-mail formal, como tudo na família Vasconcellos. Assinado por Clarisse Vasconcellos, irmã mais velha de Enzo, ele soava mais como uma intimação do que um gesto de boas-vindas:
"Será um prazer finalmente conhecer a mulher que conquistou o coração do nosso irmão. Esperamos por você no jantar de sábado às 20h. Att, Clarisse."
Helena leu a mensagem três vezes.
Sabia exatamente o que significava: um campo minado. Não era uma reunião familiar. Era um tribunal silencioso — onde ela seria julgada por todos que achavam que ela não pertencia àquele mundo.
Mas o que eles não sabiam… era que ela não estava ali para pertencer. Estava ali para reinar.
A mansão Vasconcellos parecia saída de uma revista de arquitetura clássica. Colunas brancas, portas duplas de madeira maciça, escadarias de mármore. Era elegante. Intocável. Fria.
Helena vestia um longo vinho profundo, de tecido pesado e corte reto. Um vestido sem brilhos, sem ousadia — mas que, em contraste com o que esperavam dela, era uma declaração silenciosa de poder.
Enzo caminhava ao seu lado. De terno cinza escuro e expressão serena, mas firme.
— Eles vão te provocar — disse ele antes de atravessarem o saguão da entrada. — Vão cutucar até encontrar uma fraqueza.
— Que pena que não tenho mais nenhuma à mostra — respondeu ela, com um meio sorriso.
Ele parou. Olhou para ela, por um segundo mais longo que o necessário.
— Você está pronta?
— Sempre estive.
A mesa estava posta como num cenário de filme antigo. Louça de porcelana italiana, talheres de prata, castiçais de cristal. Mas nada brilhava tanto quanto os olhos curiosos e venenosos dos membros da família Vasconcellos.
Clarisse foi a primeira a se levantar, sorrindo com os dentes cerrados.
— Helena, querida! Finalmente. — Ela a beijou no rosto, dois toques rápidos e gelados. — Enzo sempre teve um gosto… excêntrico.
— Eu diria que finalmente evoluiu — retrucou Helena, educadamente. — Mas obrigada.
A provocação disfarçada de gentileza foi recebida com olhares enviesados. A próxima a se manifestar foi Gustavo Vasconcellos, irmão mais novo de Enzo, e o mais interessado em sua posição como sucessor.
— Então você era florista, é isso? — perguntou com tom casual demais. — Que mudança drástica, não acha?
— Na verdade, não tanto. Eu sempre lidei com espinhos disfarçados de beleza — ela respondeu, tomando um gole de vinho. — Agora só são mais caros.
Um silêncio desconfortável caiu por segundos. Clarisse forçou uma risada.
— Que espirituosa!
— A vida nos obriga — disse Helena. — Principalmente quando se vem de onde eu vim.
Enzo interveio.
— Helena é a mulher mais resiliente que conheci. E mais íntegra também.
— Sim, sim… integridade — disse Gustavo, girando a taça em círculos. — Mas será que ela entende a complexidade de ser uma Vasconcellos? A imprensa, os acordos, os códigos internos? Não é um pouco... grande demais para uma mulher com o histórico dela?
Helena manteve a compostura, mas seus olhos estavam frios.
— O nome Vasconcellos é grande, sim. Tão grande que alguns acham que ele os torna intocáveis. Mas quando você quase morre por amor, você descobre o que realmente importa. E eu não estou aqui por ambição. Estou aqui porque não devo nada a ninguém. Isso me torna mais livre do que todos vocês.
A tensão ficou densa como concreto.
Clarisse, em choque disfarçado, tentou suavizar o clima.
— Enzo sempre foi o diferente da família. Você e ele parecem se entender… bem.
— Nós nos vemos com clareza — respondeu Helena. — O que já é mais do que posso dizer de algumas relações aqui.
Caio, sentado no canto da mesa, permanecia calado. A cada resposta afiada, sua mandíbula se contraía mais. Ele não a encarava diretamente. Era como se não conseguisse suportar a nova versão da mulher que um dia ele manipulou.
No momento da sobremesa, a tensão já havia se transformado em uma guerra fria. Mas Helena não parecia abalada.
Ao final do jantar, Enzo levantou-se, puxando-a suavemente pela mão.
— Obrigado por nos receberem — disse ele. — Helena e eu temos uma vida inteira para construir. E não temos tempo a perder com falsas cortesias.
Enquanto saíam, Clarisse murmurou algo baixo demais para ser ouvido claramente, mas Helena parou, virou-se com calma e respondeu, olhando nos olhos da mulher:
— A diferença entre mim e vocês… é que eu não preciso fingir quem sou. E talvez por isso, seja mais Vasconcellos do que todos nesta sala.
No carro de volta, o silêncio entre ela e Enzo era confortável.
— Eu avisei que seria tenso — disse ele.
— Eu gostei — respondeu ela. — É mais fácil lidar com inimigos quando eles estão bem na sua frente, servindo vinho caro.
Enzo sorriu.
— Está pronta para o próximo passo?
— Sempre estive.
— E se eu te dissesse que, no fim disso tudo, o nome Vasconcellos vai significar o que nós quisermos?
Helena virou o rosto para ele, confiante.
— Então vamos reescrever essa história. Começando por mim.
Enzo estendeu a mão, os olhos firmes.
— Ao nosso império.
Ela entrelaçou os dedos aos dele.
— Ao nosso jogo.
A mansão silenciou com a partida do casal.
Mas o veneno já começava a ferver nos copos meio vazios.
Na sala de estar, Clarisse Vasconcellos pousou sua taça de cristal sobre a bandeja com um estalo impaciente.
— Aquela mulher precisa ser tirada de cena — disse, encarando o irmão Gustavo com os olhos duros. — O que Enzo está fazendo é uma afronta à nossa linhagem. Casar-se com uma florista? Uma mulher com passado duvidoso? Que ele queira brincar de redenção, tudo bem… mas levá-la ao altar? Nunca.
Gustavo estava de braços cruzados, recostado na lareira apagada.
— Ele não está brincando, Clarisse. Está protegendo ela como nunca vi fazer com ninguém. E sabe o que é pior? A garota não se intimida. Isso… incomoda.
Clarisse ergueu uma sobrancelha.
— Então precisamos cortar a raiz antes que floresça demais.
Ele a encarou.
— Está pensando em quê?
Ela sorriu. Frio.
— Expor o passado dela. A origem, a venda do rim, a humilhação pública que sofreu… quem sabe até... a relação com o próprio Caio. Ela subiu demais, rápido demais. O tombo será mais bonito.
Do lado de fora da mansão, o ar estava pesado. Caio saiu discretamente pela garagem lateral, sem trocar palavra com ninguém. No volante de seu carro importado, os dedos tremiam.
Ele não sabia o que doía mais: ver Helena vestida como uma rainha ao lado de Enzo, ou perceber que ela já não era mais sua Helena.
— Isso não é real — murmurava para si, acelerando pela estrada deserta. — Ela está fazendo isso pra me atingir.
Mas quanto mais dizia, mais o peito apertava. A imagem dela lhe torturava.
Ela não olhou pra mim. Nem por um segundo. Nem como ódio. Nem como pena.
Ela o apagou.
E isso era pior do que qualquer escândalo.
Na manhã seguinte, Helena acordou com o sol filtrando-se pelas cortinas da suíte. Estava sozinha na cama. O lugar de Enzo ainda quente.
Ao se levantar, encontrou uma bandeja de café à espera. Frutas frescas, pão artesanal, café forte… e um bilhete:
“Você foi mais do que esperávamos. E menos do que eles merecem. Estarei na reunião até às 10h. Mas hoje à noite... você e eu. Enzo.”
Ela sorriu. Um sorriso breve, mas real.
Apesar do acordo, apesar do início frio… algo começava a surgir entre eles. Respeito. Aliança. Atração. Um tipo raro de intimidade silenciosa.
Poder dividido é poder multiplicado, ela pensou, pegando a xícara.
Do outro lado da cidade, Clarisse deslizava o dedo pela tela do celular. Parou quando achou o nome certo: Henrique Salazar, colunista de fofoca, conhecido por vender notícias sujas para os tabloides da elite.
Ela enviou uma mensagem direta, objetiva:
“Tenho uma história que vai colocar fogo na sua próxima capa. Mas só se você publicar do jeito que eu mandar.”
Ele respondeu em menos de cinco minutos:
“Manda o que tiver. E prepare-se pra ver sangue.”
Clarisse sorriu, triunfante.
— Vamos ver quanto tempo essa flor resiste à luz.
Mais tarde, naquele mesmo dia, Enzo chegou em casa mais cedo do que o habitual. Encontrou Helena na biblioteca, lendo um volume de capa dura sobre estratégias empresariais.
— Está estudando?
— Sempre — disse ela, fechando o livro. — Eles acham que vou tropeçar na ignorância.
— Eles subestimam você. Todos. Menos eu.
Helena o olhou com atenção. Enzo parecia cansado, mas havia uma intensidade diferente nos olhos dele. Algo mais… presente.
— Está tudo bem? — ela perguntou.
Ele hesitou por um segundo, depois se aproximou e sentou-se na poltrona à frente dela.
— Eles vão reagir. Vão tentar te destruir. Já começaram.
— Eu sei — disse ela, com tranquilidade. — Clarisse e Gustavo são previsíveis.
— E Caio?
— Caio… já está quebrado. Só não percebeu ainda.
Enzo a observou por longos segundos. Depois, falou com voz baixa:
— Você tem coragem, Helena. Mas não precisa enfrentar tudo sozinha. Nós somos um time agora. Não estou fazendo isso por conveniência. Eu acredito em você.
Ela piscou devagar, absorvendo o peso daquelas palavras.
— Isso… parece perigoso — murmurou.
— O quê?
— Acreditar em alguém.
— Sim. Mas às vezes é inevitável — ele disse, levantando-se. — Vista algo especial. Hoje à noite, vamos jantar em um lugar só nosso. Sem família. Sem guerra. Apenas… nós.
Ela assentiu.
E por dentro, sentiu algo novo: vontade de confiar.
Mas enquanto ela se preparava para o jantar, enquanto Enzo escolhia o vinho perfeito…
Clarisse apertava "enviar" no e-mail contendo o dossiê completo sobre Helena.
Nome verdadeiro.
Histórico médico.
Registro de internação após a doação do rim.
O caso com Caio.
A aposta.
O artigo estava pronto. E seria publicado na segunda-feira de manhã.
A manchete?
"A Noiva do Patriarca: de florista a mercadoria emocional — a verdade por trás de Helena Andrade"
Clarisse sorriu.
— Agora sim… vamos ver do que essa menina é feita.
Mal sabia ela que Helena já havia queimado todas as pontes.
E quem não teme a própria ruína… é quem destrói reinos.
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Atualizado até capítulo 56
Comments
Zilma sena Santos
história maravilhosa,
2025-06-30
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Dulce Gama
essa história está linda maravilhosa agora que vi que já tem atualização recente estou adorando muito está muito boa 🌟🌟🌟🌟🌟🌟♥️♥️♥️♥️♥️🎁🎁🎁🎁🎁🎁🌹🌹🌹🌹🌹👍👍👍👍👍👍👍
2025-06-30
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