Capítulo 5

Thiago chegou em casa naquela sexta-feira com o corpo moído e a cabeça latejando. O elevador do prédio onde morava não funcionava havia semanas, e subir os quatro andares com a mochila pesada nas costas parecia um teste final de resistência depois da pior semana da sua vida.

Gael não olhou em sua cara o dia inteiro. Clarissa evitou qualquer conversa fora do estritamente necessário. E o RH… bem, ele sentiu os olhares.

Rafael tentou ser cordial, mas até isso parecia forçado.

Quando abriu a porta do estúdio, tudo o que queria era um banho quente, um arroz com ovo e silêncio.

Mas o que encontrou no chão foi um envelope branco com seu nome rabiscado à caneta.

Não era carta. Não era conta.

Era um aviso de despejo.

“Informamos que, devido ao atraso acumulado de 3 meses e à ausência de acordo formal, o imóvel deverá ser desocupado até o dia 30. Caso contrário, medidas judiciais serão tomadas.”

Thiago leu três vezes. E então sentou no chão, sem conseguir pensar. O aviso tremia entre seus dedos. Ele não chorou. Não gritou. Só… travou.

Três meses. Três malditos meses.

Sabia que estava devendo, mas achava que o dono do prédio — um senhor que conhecia desde que se mudou — daria mais tempo. Não agora. Não justo agora, quando talvez fosse efetivado. Quando talvez… tudo estivesse prestes a mudar.

Mas a vida não esperava por “talvez”.

Levantou devagar, como se estivesse com febre. Caminhou até a pia, bebeu água direto da torneira. Abriu a janela. A cidade parecia zombar dele com suas luzes piscando.

“Pra onde eu vou?”, pensou.

Não tinha amigos íntimos em São Paulo. Os colegas da faculdade estavam espalhados, a maioria tão quebrada quanto ele. Os pais… não eram uma opção. Nunca mais seriam.

Olhou em volta. A TV velha, o colchão no chão, as panelas emprestadas. Tudo o que tinha construído sozinho, do zero. E agora, prestes a perder de novo.

O peito apertou.

Mas algo dentro dele resistia. A mesma coisa que o fez não desistir quando foi expulso. A mesma coisa que o fez suportar os gritos de Gael. A mesma coisa que, apesar de tudo, ainda sussurrava que ele não estava acabado.

Thiago fechou os olhos, respirou fundo, e repetiu em voz baixa:

— Segunda-feira eu volto naquele prédio. Não importa onde eu durma até lá.

E naquele instante, mesmo sem saber como, ele decidiu que não ia cair de novo.

Poderia perder tudo. Mas não ia se perder de novo.

Enquanto Thiago se encostava na parede do pequeno estúdio, com a carta de despejo nas mãos e o coração esmagado pelo medo, Gael Ferraz degustava um Barolo de safra rara num restaurante italiano de cinco estrelas, onde um prato de massa custava o equivalente a duas semanas de aluguel de Thiago.

Helena, sua namorada, usava um vestido preto de corte clássico, maquiagem impecável e um sorriso treinado para eventos. Médica de renome, filha de diplomatas, sabia como se portar — e como manter a imagem.

— Você tá distraído — disse ela, enquanto mexia o risoto de trufas.

Gael olhou para o copo. Depois para o prato. Depois para ela.

— É o trabalho. Sempre o trabalho.

— Aconteceu alguma coisa?

Ele hesitou. Então, soltou, quase sem pensar:

— Um funcionário novo cometeu um erro grave. E mesmo assim… ficou.

Helena arqueou uma sobrancelha. — Ficou? Você não costuma ter paciência pra isso.

— Eu sei.

— E quem é? Alguém importante?

— Não exatamente. É o meu assistente.

— Ahhh, o famigerado assistente novo. — Ela riu, com um toque de sarcasmo. — Aquele… o bonitinho, né? O que parece modelo de editorial underground.

Gael ergueu os olhos, irritado com o tom.

— Não é sobre isso.

— Você nunca comenta sobre ninguém. Aí do nada fala desse cara duas vezes essa semana. Tá marcando ponto, hein?

Ela riu de novo, leve. Mas o som da risada dela, que antes ele achava elegante, soou… falso. Cruel. Como se zombasse de algo que ele ainda nem tinha coragem de entender.

— Bom — continuou Helena, cortando o ravióli — se for verdade o que me disseram, ele é gay, né?

Gael não respondeu.

— Você precisa tomar cuidado, amor. Essas pessoas são carentes. Um olhar e já criam história na cabeça. Não quero que digam por aí que você tá… alimentando isso.

A faca de Gael parou no prato.

— Essas pessoas? — ele repetiu, devagar.

Helena nem percebeu o peso nas palavras dele. — Você sabe como é. Hoje em dia, qualquer coisa vira fofoca. Ainda mais com um chefe poderoso e um assistente pobre e sensível. É um prato cheio pra historinha.

Gael largou os talheres. O vinho já não descia bem.

Helena continuou comendo, alheia.

Mas ele não. A imagem de Thiago, com os olhos endurecidos, a fala firme, o corpo tenso de quem está sempre pronto pra se defender, surgiu na mente como um soco mal dado.

E pela primeira vez, algo pesou dentro de Gael.

Não era culpa. Ainda não.

Mas era incomodar-se com a risada errada na hora errada.

E isso… era novo.

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Comments

Fatima Gonçalves

Fatima Gonçalves

MAIS ELA É COBRA ESTÁ COM UM HOMEM QUE NÃO A AMA SO POR DINHEIRO

2025-10-11

5

Clesiane Paulino

Clesiane Paulino

pobre é vc sua cobra... Thiago é cheio de riquezas e valores que pessoas como vc desconhece😡😡

2025-10-25

0

Yamagutte Maria

Yamagutte Maria

Estou amando essa história ❤️❤️

2025-10-21

0

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