A madrugada caía como um véu espesso sobre Sintra.
Lá fora, o som dos galhos roçando nas janelas misturava-se ao estalo discreto da lareira.
Dentro da ala leste da mansão, Thomás e Catarina estavam sentados frente a frente, separados por um silêncio carregado de intenção.
Entre eles, repousava um envelope antigo — o mesmo que Thomás havia encontrado escondido na biblioteca.
Diante dos olhos atentos de Catarina, ele deslizou o documento sobre a mesa.
— Leia. E me diga se entende agora por que nos empurraram um para o outro com tanta pressa.
Ela abriu o envelope com cuidado, os olhos correndo pelas linhas escritas à mão em tinta envelhecida.
Era um adendo ao testamento de Benedito Bittencourt de Valença, datado de 1972.
E nele, uma cláusula inesperada:
“Se, ao longo das décadas seguintes, a liderança do grupo Valença não for assumida por um herdeiro direto, por mérito comprovado, a direção será transferida à família aliada mais antiga — os Montenegro de Bragança.”
Catarina se recostou na poltrona, em choque.
— Então… se eu me recusar a liderar ou abandonar a empresa… o controle vai para a sua família.
— E se nossas famílias forem oficialmente unidas — como agora pretendem — a cláusula deixa de ter validade. O poder permanece sob o mesmo nome.
— O nome deles. — ela completou, amarga.
Thomás assentiu, observando-a com atenção.
— Seus pais sabiam. Talvez até os meus.
— E nós fomos colocados no centro do palco como distração. Imagem, imprensa, romantismo…
— Para ninguém notar que, por trás das alianças, havia ameaça.
Catarina se levantou. Estava furiosa. Mas não havia grito — apenas frieza.
— Se eu continuar noiva de você, a cláusula se dissolve. Se eu recusar, perco tudo. E a sua família ganha.
Thomás se levantou também.
— Não a minha família, Catarina. O meu pai.
Ela virou-se para ele, os olhos faiscando.
— E você?
— Eu quero respostas tanto quanto você. Mas não pense que serei apenas peça no jogo dele.
— Nem no jogo dos meus.
⸻
Na manhã seguinte, a mansão estava mais agitada do que o habitual.
Um e-mail enviado anonimamente aos acionistas anunciava que uma cláusula do testamento original poderia invalidar o contrato de fusão recém-assinado.
Alguém estava tentando sabotar o acordo por dentro.
Constança convocou uma reunião de emergência com os conselheiros. Augusto desapareceu no escritório. E Catarina…
Catarina subiu para o quarto da torre e abriu o antigo diário da avó.
Entre as páginas perfumadas de lavanda, encontrou uma carta — endereçada a ela.
Datada do ano de sua morte.
Escrita à mão.
Selada com o brasão da família.
Catarina sentiu um arrepio percorrer-lhe a espinha.
Ao romper o lacre, leu as primeiras palavras:
“Minha querida Catarina,
Se você está lendo isso, é porque descobriu o que ninguém queria que soubesse…”
⸻
Naquela noite, o céu de Sintra desabou em uma tempestade violenta.
Na biblioteca, Thomás encarava o retrato do bisavô Valença, como se esperasse que ele respondesse alguma coisa.
E no quarto da torre, Catarina terminava de ler a carta da avó — com lágrimas nos olhos e o rosto transformado.
A menina que cresceu em salões dourados havia desaparecido.
Ali nascia a mulher que decidiria se destrói o império… ou o reconstrói à sua maneira.
Pai da Catarina
Augusto Bittencourt de Valença
• Idade: 51 anos
• Profissão: Presidente do Conselho do Grupo Valença Hotels
• Aparência: Imponente, com barba rente e fios grisalhos discretos nas têmporas. Costuma vestir-se de forma sóbria, com ternos escuros e alfaiataria italiana.
• Personalidade: Astuto, pragmático e viciado em controle. Mas ao contrário de Constança, tem brechas humanas — especialmente quando se trata de Catarina. Seu maior dilema é protegê-la sem quebrar o império que construiu.
• Histórico: Começou cedo nos negócios, herdando a empresa aos 28 anos após a morte repentina do pai. Casou-se com Constança num acordo estratégico entre famílias tradicionais. Ama a filha, mas raramente demonstra isso com gestos visíveis.
• Relação com Catarina: Vê nela uma sucessora, mas teme que o mundo a devore caso ela mostre emoções demais. Por isso, endurece — para prepará-la.
Resumo do próx capítulo
Após descobrir a carta deixada por sua avó, Catarina mergulha nos segredos mais antigos da família Valença. O conteúdo da mensagem revela que o testamento foi manipulado anos atrás para garantir o controle da empresa por meio de alianças forçadas. A avó, que havia desconfiado da traição dentro do próprio conselho, deixa pistas para que Catarina descubra quem realmente se beneficiou dessa cláusula e como revertê-la — mas sem escândalo.
Enquanto isso, Thomás começa a perceber movimentações suspeitas dentro da própria família. Alguém próximo a ele parece querer sabotá-lo — e talvez usar Catarina como isca.
Catarina, decidida a não ser mais marionete, convoca uma reunião informal com Thomás. Pela primeira vez, ela fala como herdeira real, não como filha moldada. Os dois estabelecem um pacto mais profundo: se os querem aliados por conveniência, eles escolherão como e quando quebrar o jogo.
No fim do capítulo, Catarina abre uma pasta secreta deixada por sua avó. Dentro dela, há algo mais poderoso que qualquer contrato:
A chave para desmascarar todo o conselho.
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Atualizado até capítulo 34
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