A porta da biblioteca se fechou com um clique seco.
Catarina girou nos calcanhares, os olhos incendiados.
— Como vocês puderam anunciar algo assim sem me consultar? — disparou, encarando os pais. — Não sou um troféu, muito menos uma peça de tabuleiro.
A mãe manteve a compostura, com o mesmo olhar que usava para lidar com a imprensa.
— Não se trata de você, Catarina. Trata-se da família. Da preservação de tudo que construímos.
O pai suspirou, cansado — ou derrotado. Era difícil dizer.
— Você e Thomás já são próximos. O público vai aceitar isso com facilidade. A imprensa está sendo preparada. Esse noivado vai reforçar os dois nomes.
Catarina riu com amargura.
— Que romântico. Uma fusão de sobrenomes. E se eu não quiser?
— Você já aceitou coisas piores em silêncio. — a mãe respondeu, seca.
A frase cortou fundo. Mas Catarina se calou. Porque sabia que era verdade.
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No andar de cima, Thomás observava a noite da varanda da ala leste. O vinho nas mãos já estava quente. E as palavras de seu pai ainda ecoavam na mente:
“Sacrifícios, meu filho. O que está em jogo é mais do que sua vontade.”
Mas havia algo que o pai não sabia.
Thomás nunca foi movido por imposições. Ele sempre jogou conforme suas próprias regras. O silêncio, para ele, era tática. O sorriso, disfarce.
E naquele instante, decidiu: se seria obrigado a seguir o jogo, então o jogaria melhor do que todos naquela casa.
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A mansão estava mais silenciosa que o habitual. Os convidados haviam partido, e os funcionários recolhiam os últimos vestígios do jantar.
Catarina andava pelos corredores de mármore com passos firmes, como se procurasse algo — ou alguém. Seus dedos deslizavam pela parede até encontrar uma porta semi-oculta por uma tapeçaria antiga: a Sala dos Espelhos.
Um lugar esquecido pelos outros. Mas não por eles.
Empurrou a porta devagar. O ar tinha cheiro de poeira e memórias. Os espelhos antigos cobriam todas as paredes, refletindo sua imagem em ângulos infinitos. No centro, uma poltrona de veludo vinho e um piano fechado.
E ali estava ele. Sentado, como se soubesse que ela viria.
— Como nos velhos tempos — disse Thomás, sem olhar para ela.
— A diferença é que agora não somos mais crianças. E não temos mais para onde correr.
Ela se aproximou, parando a poucos passos de distância. Os espelhos os cercavam como testemunhas silenciosas.
— Você sabia? — ela perguntou, com voz baixa.
— Não. Mas não estou surpreso. — Ele a olhou. — Só decepcionado. Com todos.
— Incluindo comigo?
Ele hesitou. Por um segundo.
— Principalmente com você… por não ter fugido.
Ela soltou uma risada amarga.
— Fugir? E deixar o palco vazio para eles moldarem o roteiro à vontade? Não. Se querem espetáculo, vão ter que lidar com a protagonista.
Houve silêncio. Denso.
Então Thomás se levantou, aproximando-se devagar. Os olhos azuis, intensos, cravados nos dela.
— Se é um jogo que querem, Catarina… jogamos juntos.
— Juntos? — ela ergueu uma sobrancelha. — Até quando?
— Até onde for necessário para virar esse tabuleiro.
Ela o olhou por longos segundos. E então, baixou a guarda — só um pouco.
— E depois?
Ele se aproximou ainda mais, e os dois se viram multiplicados nos espelhos ao redor. Quando respondeu, sua voz era quase um sussurro:
— Depois… veremos de que lado estaremos quando as máscaras caírem.
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No fim da noite, enquanto a mansão dormia, Thomás voltou à biblioteca. Revirava arquivos antigos atrás de qualquer brecha no contrato recém-assinado.
E então, encontrou.
Um envelope esquecido, escondido atrás de um volume de couro desgastado.
Dentro, um adendo datado de 1972.
Uma cláusula nunca mencionada.
E uma assinatura: Benedito Bittencourt de Valença.
Ele leu. Duas vezes.
E então, sorriu.
Não de prazer.
Mas de estratégia.
Aquela aliança não era tão sólida quanto todos pensavam.
Mãe da Catarina
Constança Bittencourt de Valença
• Idade: 47 anos
• Profissão: Diretora de Imagem e Protocolo do Grupo Valença Hotels
• Aparência: Elegância impecável, pele bem cuidada, cabelos loiros puxando para o mel, geralmente presos em coques baixos. Usa perfumes raros e fala baixo — quem quiser ouvi-la, que se aproxime.
• Personalidade: Controladora, perfeccionista e altamente refinada. Constança foi criada em um mundo onde sentimentos são sinal de fraqueza — e aparência é a forma mais sólida de poder.
• Histórico: Filha de uma embaixadora francesa e de um banqueiro português, cresceu entre Viena, Lisboa e Genebra. Casou-se com Augusto aos 22, grávida de Catarina aos 24. Sempre achou que a filha foi seu “projeto mais difícil — e mais caro.”
• Relação com Catarina: Exige sem demonstrar afeto. Não grita, não elogia. Cobra como quem testa, para ver se a filha é forte o bastante para carregar o sobrenome.
Resumo do próx capítulo
No dia seguinte ao anúncio do noivado, Catarina e Thomás enfrentam a repercussão pública do acordo — agora transformado em manchete. Em meio a olhares atentos e cobranças familiares, os dois herdeiros percebem que precisam agir juntos se quiserem manter o controle da própria história.
Enquanto fingem cumplicidade para a imprensa, uma conversa reveladora entre os pais de Catarina expõe a existência de um testamento antigo e de uma cláusula escondida, capaz de abalar toda a fusão entre as famílias. Desconfiados, Catarina e Thomás se reaproximam secretamente e selam um pacto: descobrir a verdade por trás do acordo e proteger um ao outro — mesmo que isso signifique romper com tudo o que conhecem.
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Atualizado até capítulo 34
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