Internato Ravenhall.
O nome soava imponente. Como uma sentença. E fazia sentido. A construção diante de mim parecia saída de um conto gótico.
Um castelo esculpido em pedra cinzenta, com torres pontiagudas e vitrais coloridos que refletiam luz morta sobre o chão frio.
A escadaria larga levava até uma porta de madeira entalhada com símbolos antigos, brasões, palavras em latim, figuras que pareciam me observar.
Meu pai contornou o carro e abriu a porta para mim com naturalidade, como se me deixasse em mais uma aula de balé.
— Boa sorte, minha filha — disse, ajeitando uma mecha do meu cabelo atrás da orelha. — Eu e sua mãe te amamos. Estamos fazendo isso por você.
Um beijo seco na bochecha. Um sorriso automático. Como se amor fosse uma obrigação diplomática, entregue entre um voo e outro.
— Tchau — murmurei, quase sem voz.
Ele assentiu, virou-se e entrou no carro.
O som dos pneus se afastando foi tudo o que me restou.
Fiquei sozinha. Só eu, minha mala e o vento cortante que uivava pelo pátio de pedra.
Respirei fundo. Apertei os passos.
Mas antes que meus dedos alcançassem a maçaneta da porta principal, duas garotas surgiram diante de mim, como predadoras protegendo o território.
A loira era impecável: cabelo platinado até a cintura, pele bronzeada, cílios exageradamente longos, uniforme adaptado como se estivesse numa passarela.
A ruiva ao lado trazia os cabelos presos em um rabo de cavalo firme, sardas discretas sob uma base cara e um olhar entediado como quem já sabia que o mundo girava ao seu redor.
— Olha só quem chegou — disse a loira, com um sorrisinho enviesado. — A nova nerdzinha... com esses óculos ridículos.
Ela riu. A ruiva a acompanhou, me olhando de cima a baixo como se eu fosse um inseto curioso.
— Não sabia que Ravenhall aceitava caridade agora. — a ruiva murmurou.
— Nem eu. — retrucou a outra, arqueando uma sobrancelha.
Segurei firme meu livro favorito contra o peito. Minha última âncora com o que me restava de casa.
Não respondi. Já conhecia esse jogo.
Tentei passar por elas. Mas uma delas esbarrou em mim de propósito.
Meus livros voaram, deslizando pelas pedras. Um deles, o mais amado, arranhou a capa.
— Ei! — exclamei, me abaixando para pegá-lo.
— Olha só, ela tem voz — zombou a loira. — Achei que fosse muda.
Antes que eu pudesse responder, uma voz firme e cortante interrompeu o teatro:
— O que estão fazendo aqui? Voltem imediatamente para os dormitórios.
Virei o rosto.
Uma mulher alta, com cabelos presos num coque severo e um terno cinza escuro, descia os degraus como se pisasse em um campo de batalha.
Tinha a postura de um soldado e olhos que atravessavam a alma.
As duas garotas imediatamente endireitaram a postura.
— Desculpe, diretora Helen… estávamos apenas dando boas-vindas à novata — disse a ruiva, com um sorriso falso.
— Depois do almoço. Agora, sumam da minha frente.
As duas lançaram um último olhar venenoso para mim e sumiram.
Eu ainda recolhia os livros quando uma voz mais suave se aproximou:
— Não liga pra elas. Sobrevive-se. Mais ou menos.
Uma garota se abaixou ao meu lado. Tinha cabelos pretos curtos e bagunçados, piercing no nariz e um olhar que misturava curiosidade e sarcasmo.
O uniforme estava desleixado, quase provocativo, gravata frouxa, camisa meio aberta, saia com botão solto.
Autêntica.
Linda.
— Sou a Vickie — disse, me entregando um dos livros.
— Bella — respondi, surpresa por finalmente ver um rosto sem veneno.
Antes que eu dissesse algo mais, a diretora se aproximou.
— E você, Vickie, para o seu quarto. A recepção será depois do almoço.
— Sim, senhora Helen — respondeu ela, revirando os olhos com charme e me piscando antes de sair.
Sozinha de novo. Com os livros nos braços e um peso novo no peito.
Mas, por algum motivo… me senti menos invisível.
— Você deve ser Isabella Moore. — A voz da diretora soou às minhas costas, firme como aço.
Me virei devagar.
— Bem-vinda ao Internato Ravenhall — disse, sem sombra de sorriso. — Venha. Temos fichas a preencher. E regras a memorizar.
Assenti, em silêncio. Algo nela me dizia que falar demais era perigoso.
Seguimos por corredores longos, frios, ecoando nossos passos. Os vitrais projetavam sombras coloridas nas paredes de pedra. O ar cheirava a madeira antiga, mofo discreto e livros muito, muito velhos.
Ao fim do corredor, uma porta de carvalho trazia uma placa dourada entalhada:
“Diretoria – Sra. Helen Carter”
Ela girou a maçaneta com precisão.
— Entre, senhorita Moore.
A sala era austera, cheia de livros grossos, móveis escuros e um relógio antigo que marcava o tempo com tique-taques impiedosos.
Helen sentou-se atrás da escrivaninha com a mesma elegância gélida de antes. Ajustou os óculos com precisão cirúrgica.
— Seu pai lhe explicou que Ravenhall tem regras. Regras rígidas. — começou. — E não toleramos exceções.
Ela listou, uma a uma:
Celulares proibidos fora dos dormitórios.
Relacionamentos íntimos entre alunos: proibidos.
Uso de substâncias ilícitas: expulsão imediata.
Visitas a quartos do sexo oposto: terminantemente proibidas.
— Violação dessas normas resulta em suspensão, punições disciplinares, ou em casos extremos… expulsão. Está claro?
— Sim, senhora — murmurei.
Ela me entregou uma pilha de papéis, o regulamento, meu cronograma, a chave do quarto…
E um papel vermelho com um número em negrito.
Para denúncias. Sigilo garantido.
A sensação era clara.
Era uma escola.
Mas cheirava a prisão.
Era um colégio ou um campo de treinamento militar?
Duas batidas na porta.
— Entre — disse a diretora.
A maçaneta girou. Um garoto entrou. E por um segundo, o tempo congelou.
Alto, de ombros largos, gravata frouxa, camisa meio aberta. Um colar prateado pendia do pescoço.
Olhos verdes, intensos, como uma floresta prestes a engolir tudo.
Cabelos castanho-escuros, bagunçados. Postura relaxada, quase desafiadora.
Nos encaramos por um instante silencioso. Longo demais.
Eu sorri. Pequeno. Involuntário.
— Aiden — disse a diretora. — Leve a senhorita Moore ao quarto. Mostre os corredores. Seja breve.
Ele assentiu, depois olhou para mim.
— Pronta, Bella?
Eu não estava.
Mas algo naquele olhar dizia que, com ele, as regras seriam a menor das minhas preocupações.
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Atualizado até capítulo 37
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