O burburinho do 'Amanhecer Dourado' pareceu retornar de uma vez só, engolfando Cristal em uma onda de sons e cheiros que ela mal registrava. A caneta ainda estava apertada em sua mão, uma prova física de que o encontro com Brad não fora um pesadelo. Os assentos vazios onde os homens haviam estado, a ausência daquela sombra opressora, deveriam trazer alívio, mas em vez disso, deixaram um vazio inquietante, como a marca de um dente afiado.
Cristal sentiu o tremor que havia contido com tanta força começar a se espalhar por seus braços, subindo pela coluna. O pânico, que ela havia domado momentaneamente para enfrentar Brad, agora ameaçava dominá-la. Não era apenas o medo; era a estranha e avassaladora atração que a deixava confusa, uma fenda perigosa em sua lógica. Ela deveria estar aliviada, grata por ele ter ido embora, mas a frase final dele – "O acaso... às vezes tem uma memória muito longa" – soava como uma promessa, ou uma maldição, reverberando em sua mente.
Ela se forçou a respirar fundo, o ar frio em seus pulmões ajudando a clarear um pouco a névoa. Levantou-se da cadeira, sentindo as pernas um pouco fracas, e caminhou em direção ao balcão para pagar sua conta, os olhos percorrendo o ambiente, quase esperando vê-lo novamente. Cada rosto, cada sombra parecia esconder a figura imponente de Brad. A ideia de que ele poderia "lembrar" dela, que seus caminhos pudessem se cruzar novamente, era aterrorizante e, ao mesmo tempo, estranhamente sedutora. O que ele queria? E por que ela sentia aquela corrente elétrica sempre que seus olhares se cruzavam?
Ao sair do café, o sol da tarde, que antes parecia tão acolhedor, agora tingia o céu de Istambul com tons de perigo. As ruas movimentadas, antes um refúgio de normalidade, com o canto dos mercadores e o cheiro de especiarias misturado ao ar, pareciam subitamente cheias de olhos ocultos. Cristal sabia, com uma certeza fria, que sua vida acabara de mudar. O mundo cinzento e seguro que ela conhecia havia sido invadido por uma escuridão atraente, e ela não tinha certeza se conseguiria, ou se queria, se livrar dela.
Os dias que se seguiram foram uma névoa. Cristal tentava retomar sua rotina nas ruas movimentadas de Istambul, mas a imagem dos olhos escuros de Brad e o eco de sua voz a perseguiam. Ela se sentia como uma mariposa atraída por uma chama perigosa. No entanto, o verdadeiro inferno estava prestes a começar, não por causa de Brad diretamente, mas por uma virada cruel do destino que a arrastaria para o coração sombrio de sua família.
A tragédia atingiu como um raio em uma noite chuvosa. Cristal se viu, sem querer, no lugar e na hora errada, testemunha – e logo acusada – de um incidente fatal que despedaçou a estrutura de uma das famílias mais poderosas da máfia de Istambul. A vítima: o irmão mais novo de Brad. Cristal era inocente, uma mera espectadora arrastada para o olho do furacão, mas as evidências circunstanciais, ou talvez a conveniência, a incriminavam.
Em meio ao caos daquela noite, enquanto a notícia da morte de seu irmão ecoava pelos corredores da máfia, a fúria de Brad era um incêndio devastador. Ele não sabia, ainda, que a mulher envolvida era Cristal. Sua mente estava nublada pela dor e pelo desejo ardente de retribuição. "Encontrem a mulher! Quero-a viva, e a quero diante de mim!", sua voz de comando cortou o ar pesado, as palavras carregadas de uma promessa de tormento para quem quer que fosse a responsável. Para Brad, o luto e a raiva se fundiram em um desejo de vingança incontrolável contra a figura que ele ainda não conseguia identificar. Ele faria da vida dela um inferno, não pouparia esforços para que ela pagasse pelo que ele acreditava que ela havia feito. O que ele não sabia, nem podia conceber em sua cegueira por vingança, era que a mesma mulher que ele jurava destruir, um dia, seria aquela por quem seu coração, endurecido pela escuridão, aprenderia a amar.
Cristal, por sua vez, tentava desesperadamente entender o turbilhão em que se encontrava. A polícia já a havia interrogado, e as perguntas, carregadas de insinuações, a deixavam atordoada. Ela havia tentado explicar, jurado sua inocência, mas era como se suas palavras se perdessem no ar. Naquela mesma noite, enquanto tentava se abrigar em um pequeno apartamento alugado no bairro de Sultanahmet, sentindo a cidade histórica se fechar ao seu redor, um som brusco na porta a fez pular. Não eram as autoridades. Eram os homens de Brad. A porta cedeu com um estrondo, e antes que pudesse reagir, mãos fortes a agarraram. Ela tentou lutar, um grito sufocado morrendo em sua garganta, mas era inútil. Em questão de segundos, Cristal foi arrastada para fora, vendada e jogada na parte de trás de um carro escuro. O cheiro de couro e perigo a envolveu. Ela não sabia para onde estava sendo levada, mas a batida violenta de seu coração anunciava que seu destino a levava diretamente para as profundezas do império de Brad.
O carro parou abruptamente, e Cristal foi puxada para fora, a venda ainda apertada sobre os olhos, desorientando-a completamente. O ar era pesado, com um cheiro de charuto e algo metálico, e o som de passos em torno dela era abafado, como se estivesse em um grande espaço. Ela foi empurrada para uma cadeira, e o silêncio que se seguiu era mais opressor do que qualquer ruído. Então, a venda foi bruscamente arrancada. Seus olhos piscaram, tentando se ajustar à penumbra, antes de se fixarem na figura imponente sentada atrás de uma vasta mesa de madeira escura. Brad. O mesmo homem do café, com seus olhos intensos e sua aura de perigo, agora amplificada pela raiva evidente em seu semblante. O local era um escritório luxuoso e sombrio, com estantes repletas de livros e artefatos caros, mas que exalava a frieza de um covil. Brad a observava com uma intensidade predatória, e Cristal sentiu um calafrio percorrer sua espinha. Ele ainda não a reconhecia daquela forma, apenas via nela a "mulher" que lhe fora trazida.
"Quem é você?", a voz de Brad trovejou, sem vestígios da curiosidade sutil do café, agora fria e cheia de uma raiva contida que a fez encolher-se. "Diga-me o que fazia na rua naquela noite e qual a sua relação com o que aconteceu ao meu irmão."
Cristal cerrou os lábios. O pânico a sufocava, mas a acusação injusta, a forma como ele a olhava como se ela fosse culpada, reacendeu a chama de sua ousadia. Ela não lhes daria a satisfação. "Eu sou inocente", ela declarou, a voz trêmula, mas firme, como um fio de aço. "Não sei do que está falando, nem quem é seu irmão." Cada palavra era um desafio, um muro que ela erguia entre a verdade e a fúria dele. Brad se inclinou para frente, a paciência se esvaindo de seu rosto. Seus olhos se tornaram fendas escuras, avaliando-a, e o sorriso de escárnio que ele exibiu antes de sua voz cortar o ar era glacial.
"Inocente?", ele sibilou, a palavra carregada de desdém. "Ninguém é inocente neste inferno. E ninguém me esconde a verdade." Ele bateu na mesa, o som ecoando no ambiente. "Vocês, peguem-na. Ela vai falar." Antes que pudesse piscar, dois dos homens que estavam de pé perto da porta a agarraram. Cristal tentou resistir, debatendo-se com toda a força que tinha, mas seus esforços eram inúteis contra a força bruta deles. Seus pulsos foram amarrados com rapidez e eficiência a uma cadeira, e ela foi arrastada para um canto escuro da sala. Lá, a porta de ferro de uma pequena cela, antes imperceptível na parede, rangeu ao se abrir. "Ela vai ficar aí até decidir que a verdade é mais confortável que o silêncio", Brad rosnou, sem desviar o olhar dela. "E acredite, ela vai desejar ter falado quando eu acabar com ela." A porta de ferro se fechou com um baque surdo, jogando Cristal em uma escuridão fria e sem esperança, o som do clique da tranca ecoando em seus ouvidos.
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Atualizado até capítulo 56
Comments
Xyn Anala
Que plot twist maravilhoso, eu não esperava por isso de jeito nenhum! 👌
2025-06-25
1
Cecianeixi Ixice
obrigado por ler!
2025-07-04
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