Um brinde ao Acaso

Leyla girava a taça em movimentos suaves, observando o brilho âmbar do líquido enquanto uma música dançava pelo ambiente, envolvente, quase hipnótica. O bar estava cheio, mas não lotado. Havia espaço suficiente para respirar, mas não o bastante para se sentir invisível. Era o tipo de lugar em que as pessoas vinham para viver histórias, mesmo que por algumas horas. Era elegante, aconchegante, com luzes amareladas pendendo do teto em fios longos, criando um clima que parecia tirado de um filme noir.

Os olhos — delineados com precisão — exploravam o ambiente com aquela expressão de quem enxerga além do óbvio. Era bonita, mas não era só isso. Havia algo nela que chamava atenção antes mesmo que alguém notasse seu rosto. Um tipo de presença firme, segura, difícil de descrever.

Leyla não queria estar ali. Mas cedeu ao apelo das amigas. “Só hoje, Ley. Amanhã começa sua nova fase, você merece isso.” E aqui estava ela. Rindo com duas delas, mas olhando ao redor com certo distanciamento, como quem observa a vida de longe.

Do outro lado do bar, Rodrigo ajustava os punhos da camisa branca, já dobrada até os cotovelos, revelando antebraços fortes e tatuados. Estava com o parceiro de sempre — Leo, o mulherengo incorrigível que achava que toda noite era uma nova oportunidade de cometer os mesmos erros com mais estilo. Rodrigo, por outro lado, só queria um bom whisky e silêncio. Ou, no máximo, uma conversa inteligente.

— Você precisa relaxar, irmão. Olha esse lugar. Você tá com cara de quem veio interrogar alguém. — Leo riu, levantando a garrafa em direção a uma dupla de mulheres próximas. Rodrigo apenas suspirou.

— Relaxar não significa virar piada. — respondeu, com um meio sorriso que quase ninguém notava, mas que dizia muito sobre ele.

Ele encostou no balcão e pediu outro whisky. Enquanto esperava, seus olhos foram atraídos por um detalhe: uma mulher girando sua taça de vinho de forma hipnótica. Ela não estava tentando ser notada, e talvez por isso fosse impossível ignorá-la.

Leyla ergueu o olhar por instinto, sentindo algo. E o encontrou. Um homem de postura firme, olhar sério, mas não arrogante. Forte, discreto, com algo no semblante que dizia “não me aproxime” e ao mesmo tempo, “tente me decifrar”. Ela arqueou uma sobrancelha, num gesto involuntário.

Rodrigo desviou os olhos por um segundo, depois voltou a encará-la. Aquela troca durou pouco — dois, talvez três segundos — mas teve mais intensidade do que qualquer conversa naquela noite.

— Não olha agora, mas o James Bond tá te encarando. — disse uma das amigas de Leyla, provocando risos. Ela riu também, mas sem tirar os olhos dele. Foi então que decidiu levantar para ir ao banheiro. Nada demais. Apenas se mover um pouco. Mas sabia, no fundo, que estava convidando o acaso a brincar.

Rodrigo, sem saber por quê, também se moveu. Pegou a bebida e foi até uma das poltronas próximas à entrada dos lavabos, onde o som era mais suave. Precisava de um momento só. Mas quando ela passou, o perfume a invadiu. E o olhar se cruzou outra vez.

— Parece que escolhemos a mesma trilha de fuga. — disse ela, com um meio sorriso.

Rodrigo encarou por um segundo, tentando entender se aquilo era uma provocação ou apenas casualidade.

— Ou a mesma necessidade de silêncio. — respondeu.

— Nem sempre o barulho vem do som. — ela completou, já indo em direção à porta. Mas antes de entrar, olhou por cima do ombro. Ele ainda a observava.

E ali, naquele olhar silencioso e sem compromisso, havia o primeiro flerte. Não intencional. Não planejado. Apenas... orgânico. Como tudo que realmente vale a pena ser vivido.

Leyla retornou ao bar com o andar seguro de quem não se deixa intimidar por nada. O sorriso ainda brincava em seus lábios, e os olhos brilhavam com a leveza de quem havia se permitido respirar por alguns instantes fora da rotina. Assim que adentrou o salão, foi recebida pelas amigas com uma enxurrada de comentários e perguntas, mas ela apenas sorriu, misteriosa, enquanto buscava, sem querer admitir, o olhar do estranho de olhos castanhos que havia cruzado o seu minutos antes.

Rodrigo a viu antes que ela o notasse. Estava encostado no balcão, segurando um copo de uísque com a mesma firmeza com que mantinha seus princípios. Só que, pela primeira vez em muito tempo, sentia esses mesmos princípios vacilarem. Havia algo naquela mulher... não era só beleza. Era postura. Era o olhar. Era o jeito como ela ocupava o espaço sem pedir permissão.

Ela não se encaixava no padrão das mulheres que cruzavam aquele bar — muito menos no perfil das que se deixavam levar por flertes rasos. Rodrigo sentiu isso instintivamente.

Tomou um gole da bebida e passou os olhos por ela com mais atenção. A forma como ela falava com as amigas, os gestos expressivos, a risada levemente rouca que escapava vez ou outra. Inteligente. Espontânea. Ousada.

“Definitivamente, o tipo que me instiga”, pensou, e o pensamento foi tão claro e direto que o fez sorrir sozinho. Há quanto tempo não sentia aquilo? O arrepio na espinha, a curiosidade viva, o desejo genuíno de conhecer — não só o corpo, mas o que havia por trás daquele olhar?

Ele havia se blindado por tanto tempo, mantendo tudo sob controle, que aquela pequena desordem interna parecia quase deliciosa. E por mais que sua mente gritasse para manter distância — afinal, estava ali para relaxar, e no dia seguinte teria que se apresentar como orientador de novos recrutas — algo nele dizia que aquela noite poderia ser diferente.

Mas não seria fácil. Ele sabia disso. Aquela mulher não era do tipo que se ganhava com frases prontas ou olhares intensos. Teria que conquistá-la. Provocar sua mente antes de tentar alcançar sua pele.

Rodrigo se endireitou, observando o movimento ao redor. Ela estava de costas para ele, mas ele sentia sua presença como se ela ocupasse cada centímetro daquele ambiente.

— Certo... — murmurou para si mesmo, com um sorriso enviesado. — Vamos ver até onde isso vai.

Ele deixou o copo no balcão e deu o primeiro passo em direção à imprevisibilidade daquela noite.

Rodrigo se aproximou devagar, sem pressa. Não era do tipo impulsivo. Gostava de observar antes de agir. Mas havia algo quase magnético naquela mulher — algo que o fez cruzar o salão com passos decididos, como se aquela fosse uma daquelas raras situações em que o instinto falava mais alto do que qualquer código de conduta.

Leyla ainda estava rindo de algo que uma das amigas dissera quando sentiu o peso de um olhar queimando em sua nuca. Virou-se com naturalidade e o viu. Ele caminhava na direção dela, os ombros largos e a postura firme como um predador que não precisava correr para alcançar sua presa.

Ela ergueu uma sobrancelha, curiosa.

— Espero que você não tenha voltado só por causa do meu olhar insistente, — disse ela, provocando, assim que ele se aproximou.

Rodrigo sorriu, surpreso pela audácia.

— Eu diria que o olhar foi um convite. Mas... o jeito como você voltou, como se não devesse nada a ninguém, isso sim me trouxe de volta.

Ela mordeu o canto do lábio, divertindo-se. O olhar dele era intenso, mas havia respeito ali. Interesse genuíno. Isso a fez relaxar.

— E o que te faz pensar que eu estou interessada em continuar essa conversa?

— Nada, — ele respondeu, com um meio sorriso. — Mas algo me diz que você é do tipo que gosta de saber com quem está lidando antes de descartar. Estou certo?

Ela cruzou os braços, intrigada, inclinando levemente a cabeça.

— Rodrigo.

— Leyla.

Os nomes saíram juntos, quase como um pacto não verbal de que, dali em diante, ambos sabiam que estavam cruzando uma linha invisível.

— Um nome forte, Leyla. Diferente. Assim como você.

— E você, Rodrigo... Tem cara de quem gosta de ter tudo sob controle. Mas está claramente fora da zona de conforto.

Ele riu, surpreso mais uma vez.

— É perceptível assim?

— Para quem sabe observar, sim. — Ela deu um passo sutil para o lado, como se estivesse testando os limites do espaço entre eles. — Mas eu gosto disso.

— De quê?

— De ver alguém tão no controle... perdendo um pouco o equilíbrio.

Rodrigo a olhou fixamente. Ela estava o provocando com cada palavra, cada gesto, e ao mesmo tempo parecia nem perceber o poder que exercia. Aquilo era fascinante.

— Você é perigosa, Leyla.

— E você parece o tipo que gosta de viver perigosamente, mesmo que tente negar.

Havia algo quase elétrico no ar. Eles não estavam encostados, mas a tensão era palpável. Um jogo silencioso se desenrolava entre olhares e sorrisos enviesados.

Rodrigo estendeu a mão.

— Me concede uma dança?

Ela olhou para a pista, depois para ele, e assentiu, aceitando.

Enquanto caminhavam em direção ao centro do bar, a música mudava para algo mais lento, envolvente. Os dedos dele tocaram a cintura dela com firmeza, mas sem invadir. O toque foi o suficiente para arrepiar a pele de Leyla sob o tecido do vestido.

E então dançaram. Sem palavras por alguns minutos. Apenas corpos em sintonia, como se se conhecessem há anos.

Rodrigo pensava que havia tempo que não se deixava levar assim. Que talvez, só por aquela noite, ele pudesse abrir uma exceção às regras. Ela valia o risco.

Leyla, por outro lado, sentia que algo naquela presença a acalmava e desafiava ao mesmo tempo. E mesmo sem saber seu sobrenome, profissão ou qualquer detalhe, sabia que aquele homem misterioso acabaria marcando sua história de um jeito que ela não poderia prever.

E a noite... estava apenas começando.

Capítulos
1 Dois Mundos, Um destino
2 Um brinde ao Acaso
3 Ritmo do prazer
4 impacto
5 Mantendo o profissionalismo
6 A sombra do palco
7 O segundo ato
8 Terceiro ato: sem continas
9 Quarto ato: o julgamento final
10 Depois da cortina
11 instintos reprimidos
12 Um capa se pensar
13 O Enigma das Sombras
14 Ecos do Reflexo
15 impulsos reprimidos
16 Mentes iguais
17 tortura apertada
18 Argos44
19 Destruindo arquétipos
20 Um Gênio Contrariado
21 Interrogatório
22 O Terceiro Ato Está Próximo
23 O Plano Perfeito
24 Xeque-Mate
25 A Verdade sob as Camadas
26 O Desejo que Queima
27 esquecer o inesquecível
28 meses gelados
29 A escuta que destrói o silêncio
30 O Dia em Que Tudo Queimou por Dentro
31 Onde o Silêncio Grita
32 A Verdade Queimando em Silêncio
33 Café Quente
34 confraternização e entrega
35 café e bolinho
36 Fragmentos que se conectam
37 Fora da Lei, Fora do Controle
38 Rosto Revelado, Controle Perdido
39 fim de caso, começo de algo
40 Dupla surpresa
41 Terreno Neutro
42 O padrão no caos
43 A VOZ DOS OBJETOS
44 Reflexos do desejo
45 Pistas e Romantismo
46 Ecos de Um Nome
47 Casa, enfim
48 Linha Tênue
49 Assumir é para os fortes
50 O silêncio que grita
51 Ecos do silêncio
52 Ecos do Caçador
53 O Jogo Começou
54 Fragmentos do Inferno
55 48 Horas
56 O CÓDIGO SILENCIOSO
57 O Código da Luz
58 Depois da Tempestade
59 Um Ano Depois
60 O Caso Mais Importante
61 Entre Códigos e Confetes
62 O Grande Dia
63 Noite de Núpcias
64 Arquivos Fechados, Corações Abertos.
65 Nota da Autora
Capítulos

Atualizado até capítulo 65

1
Dois Mundos, Um destino
2
Um brinde ao Acaso
3
Ritmo do prazer
4
impacto
5
Mantendo o profissionalismo
6
A sombra do palco
7
O segundo ato
8
Terceiro ato: sem continas
9
Quarto ato: o julgamento final
10
Depois da cortina
11
instintos reprimidos
12
Um capa se pensar
13
O Enigma das Sombras
14
Ecos do Reflexo
15
impulsos reprimidos
16
Mentes iguais
17
tortura apertada
18
Argos44
19
Destruindo arquétipos
20
Um Gênio Contrariado
21
Interrogatório
22
O Terceiro Ato Está Próximo
23
O Plano Perfeito
24
Xeque-Mate
25
A Verdade sob as Camadas
26
O Desejo que Queima
27
esquecer o inesquecível
28
meses gelados
29
A escuta que destrói o silêncio
30
O Dia em Que Tudo Queimou por Dentro
31
Onde o Silêncio Grita
32
A Verdade Queimando em Silêncio
33
Café Quente
34
confraternização e entrega
35
café e bolinho
36
Fragmentos que se conectam
37
Fora da Lei, Fora do Controle
38
Rosto Revelado, Controle Perdido
39
fim de caso, começo de algo
40
Dupla surpresa
41
Terreno Neutro
42
O padrão no caos
43
A VOZ DOS OBJETOS
44
Reflexos do desejo
45
Pistas e Romantismo
46
Ecos de Um Nome
47
Casa, enfim
48
Linha Tênue
49
Assumir é para os fortes
50
O silêncio que grita
51
Ecos do silêncio
52
Ecos do Caçador
53
O Jogo Começou
54
Fragmentos do Inferno
55
48 Horas
56
O CÓDIGO SILENCIOSO
57
O Código da Luz
58
Depois da Tempestade
59
Um Ano Depois
60
O Caso Mais Importante
61
Entre Códigos e Confetes
62
O Grande Dia
63
Noite de Núpcias
64
Arquivos Fechados, Corações Abertos.
65
Nota da Autora

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