A manhã nasceu com céu limpo e um calor abafado que prometia tempestade. Ashiley desceu as escadas da mansão vestindo calça de linho clara e blusa leve; o cabelo num coque baixo, o rosto com o mínimo. Queria passar despercebida. Invisível.
Gustavo a aguardava junto a um sedã dos Martins, mangas da camisa branca dobradas, calça escura. Casual, simples — ainda assim, impecável.
— Pronta? — a pergunta veio baixa, sem afetação.
Ela apenas assentiu.
Os primeiros quilômetros foram de silêncio. O motor, a estrada e um piano discreto no rádio preencheram o espaço. Ao volante, Gustavo parecia concentrado; de vez em quando, desviava os olhos para ela — observando, medindo.
— Não precisa ficar tensa — disse, sem teatralidade. — Não vou te arrastar para o altar hoje.
— Não estou tensa.
— Não? — um meio sorriso. — Então por que rói a unha desde que entrou?
Ela recolheu os dedos, percebendo o gesto.
— Hábito antigo.
— Imagino.
O silêncio voltou a tomar a cabine até que os portões da fazenda se abriram. A reforma a surpreendeu: fachada rústica com linhas modernas, janelões de vidro, varandas amplas, jardins aparados, o cheiro limpo da grama cortada. Ao longe, cavalos pastavam; mais adiante, um lago refletia um azul quase metálico.
Gustavo abriu a porta para ela, gesto automático.
— Quero te mostrar onde pensamos montar a tenda do coquetel.
Ela o seguiu mantendo uma distância confortável. Funcionários cumprimentavam com respeito: “senhor Martins.” Mesmo os mais velhos. Ele retribuía sem ostentação, mas com uma firmeza que não deixava dúvidas sobre quem conduzia a orquestra.
— Aqui — apontou para um campo com vista para o lago. — Enxergo a cerimônia neste eixo. Vento de leste, luz do fim da tarde…
— Bonito. — Ela avaliou, braços cruzados.
— Só bonito?
— É só um casamento, Gustavo. Não vejo por que tanto espetáculo.
Ele virou-se de frente, mãos nos bolsos.
— Não é só um casamento. É a sua volta. Sua apresentação oficial como futura Martins.
O estômago dela revirou.
— E se eu não quiser ser apresentada assim?
— Então me diga como prefere. — Deu um passo em direção a ela, olhos mais escuros. — Quer fugir de novo? Quer me deixar plantado como anos atrás? Faça. Mas me avise… para eu não perder tempo tentando te proteger de você mesma.
A palavra ficou vibrando entre os dois. Proteger.
Gustavo respirou fundo, recobrando o prumo.
— Não foi a melhor forma de dizer.
— Não foi. — Ela desviou o olhar para o lago. — Vamos escolher as flores e encerrar.
— Como quiser.
Voltaram em direção à casa. O celular de Gustavo vibrou; ele atendeu, voz baixa:
— Sim, ela está comigo… Ainda não. Fechamos os detalhes primeiro… — Encerrando, deu de ombros: — Gente ansiosa demais.
— Problemas? — Ashiley perguntou, apenas por educação.
— Só gente apressando pauta.
Horas depois, rodeados por amostras de tecidos, paletas e catálogos, um funcionário trouxe um envelope com documentos para assinatura. Gustavo se afastou para outra ligação; Ashiley buscou ar na varanda. O vento ali parecia menos pesado. Pegou o celular. Nenhuma mensagem de Pietro. Nenhuma ligação. O gosto na boca foi uma mistura insolúvel de decepção e alívio.
Perfeito. Exatamente como eu queria., mentiu para dentro.
Em Jardim de Pedra, Pietro caminhava de um lado ao outro no escritório da Santoro Group.
— Ela simplesmente sumiu — disse ao vazio, olhando o mapa aberto na tela como se pudesse geolocalizar o arrependimento.
— Você está exagerando. — Laura surgiu com duas xícaras de café, tom doce, olhos de preocupação calculada. — A Ashiley é dramática. Some para chamar atenção. Quer que você corra atrás… como sempre.
— Não é só drama desta vez. — Ele massageou as têmporas.
Laura pousou o café, sentou-se no braço da poltrona, dedos nos ombros dele.
— Então deixa ela no mundinho dela. Você merece alguém que esteja aqui… agora… com você.
Pietro não respondeu. Mesmo com o toque leve, a cabeça já estava em outro lugar. E Laura viu — e odiou — a distância.
— Você precisa de uma pausa — tentou. — Vem à capital comigo. Visito minha mãe, você respira outro ar.
— Não tenho tempo.
— Por favor… — os dedos dela deslizaram no antebraço.
— Eu disse que não. — Ele levantou-se, seco.
Laura manteve o sorriso, mas os olhos escureceram por um segundo. Assim que ele saiu, discou um número.
— Dona Celina? Que saudade… — açúcar na voz. — O Pietro está se desgastando. Trabalhando demais e obcecado com uma história sem sentido sobre uma garota que não merece atenção. Estou… preocupada.
Do outro lado, a mãe de Pietro não precisou de muito.
— Esse menino já passou da hora de focar no que importa.
— Pensei que uma viagem faria bem. Vou à capital amanhã cedo… Ele não quer ir. O senhor sabe como ele é, teimoso…
— Deixa comigo.
Meia hora depois, o telefone de Pietro tocou.
— Você vai viajar com a Laura amanhã — decretou Celina. — Sem desculpas. Está decidido.
— Mãe…
— Já providenciei tudo.
O clique do fim da chamada ficou vibrando no gabinete. Pietro lançou o celular sobre a mesa com mais força do que pretendia. Laura apareceu na porta com o sorriso exato.
— Tudo certo agora? Mal posso esperar pela nossa viagem.
Ele passou por ela sem responder. Por dentro, a inquietação latejava. Mesmo indo a outra cidade, a cabeça dele continuaria com Ashiley.
Na fazenda, a tarde caminhava para o dourado quando Gustavo voltou à varanda com o envelope assinado.
— Paletas? — perguntou, pousando amostras sobre a mesa.
— Orquídeas brancas e folhagem verde. Sem excessos. — Ela apontou, objetiva. — Nada de arco com luzinhas. Nada de cortina de veludo. E a cerimônia sem imprensa.
— Está no contrato — ele assegurou. — Vetos mantidos.
Ela assentiu, uma tensão invisível caindo dos ombros. O vento virou; o calor abafado ganhou cheiro de chuva.
— Você me perguntou mais cedo se queria fugir — disse, ainda olhando o horizonte. — A verdade é que não quero mais fugir. Só não quero ser humilhada.
— E não será — devolveu, sem hesitar. — Enquanto eu estiver do seu lado, não será.
Ashiley virou o rosto para encará-lo. Não havia charme na frase; havia aço. Por um segundo, a defensiva dentro dela afrouxou um milímetro.
— O anel fica pronto amanhã — ele continuou, mais prático. — Vamos buscá-lo juntos. Depois, alinhamos a logística do anúncio interno.
Ela hesitou. Juntos parecia uma palavra grande demais para um objeto pequeno. Mesmo assim:
— Certo.
Começaram a recolher catálogos quando o primeiro trovão tremeu distante. Um funcionário correu para baixar as lonas da varanda. Gustavo inclinou-se sem tocar nela, mas colou a sombra ao lado do corpo dela enquanto pingos grossos começavam a bater no piso de madeira.
— Vamos entrar — sugeriu.
— Ainda não. — Ashiley ficou mais um instante, deixando a chuva respingar no dorso da mão. Queria registrar aquele exato ponto entre calor e tempestade. Entre antes e depois.
— Só mais um minuto — ela disse por fim, e então o seguiu.
No caminho de volta, a tempestade finalmente quebrou. O vidro embaçou por dentro; os limpadores varreram com eficiência metódica. Dentro do carro, o piano voltou, agora com cordas discretas. Gustavo dirigia em silêncio. No acostamento de um pensamento, ele falou:
— Sobre mais cedo… Quando eu disse “proteger”, quis dizer blindar do que não é seu para carregar. Política de família tem muito ruído. Vou tirar isso do seu caminho sempre que puder.
Ela manteve os olhos na estrada molhada.
— E quando você for o ruído?
— Então espero que me diga. — A resposta veio rápida, sem orgulho.
A sombra de um sorriso, quase involuntária, tocou a boca de Ashiley. Do lado de fora, a chuva perdeu força.
Em Jardim de Pedra, Pietro ficou sozinho na sala depois que a ligação da mãe terminou. Pegou o celular, abriu a conversa com Ashiley e não escreveu nada. Pensou na janela aberta, nas cortinas brancas, no olhar dela na joalheria. Desta vez é diferente. Guardou o aparelho no bolso e, pela primeira vez em dias, admitiu para si que talvez tivesse perdido — não uma mulher, mas a chance de ser alguém melhor ao lado dela.
Quando o carro de Gustavo atravessou o portão da cidade, o céu deixava uma luz limpa sobre o asfalto. Ashiley apoiou a testa no vidro frio. Não havia euforia. Havia foco. E a certeza incômoda de que, a cada escolha, a cela ficava mais confortável — e a chave, paradoxalmente, mais leve no bolso.
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Atualizado até capítulo 61
Comments
Cintia Maria Lemos Tavares
Que história confusa ela é uma lunática que não se ama ele um confuso guiado pela mãe e nos pobres leitoras ainda não sabe se ele tinha um caso com a mal amada ou era uma relação de funcionária
2025-09-12
0
Kelly Santos
eu estou parando de ler, mas não estou julgando, apenas não estou conseguindo entender nada até agora tem muito controversos da história que deixa dúvidas a quem está lendo
2025-09-12
0
Kelly Santos
eu estou parando de ler, mas não estou julgando, apenas não estou conseguindo entender nada até agora tem muito controversos da história que deixa dúvidas a quem está lendo
2025-09-12
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