Capítulo 4 – A Noite e a Queda
— Amiga, eu não suporto mais te ver assim, destruindo sua própria vida. — A voz de Adriana estava embargada, carregada de uma mistura dolorosa de frustração e um carinho genuíno que teimava em não se apagar. Ela segurava as mãos de Isis entre as suas, apertando-as com uma súplica silenciosa, buscando em vão um sinal de que suas palavras estavam finalmente penetrando a barreira espessa que Isis havia erguido ao redor de si. — Você acha que a tia Solange estaria feliz vendo você se afogando nessas noites sem fim, nessa fuga constante da sua própria dor?
As palavras eram um golpe suave, mas certeiro, e por um breve instante, atingiram o alvo. Um tremor percorreu Isis, um nó se formou dolorosamente em sua garganta, sufocando qualquer resposta. Ela desviou o olhar, incapaz de encarar a verdade espelhada nos olhos preocupados da amiga, talvez não querendo admitir a veracidade daquelas perguntas que ecoavam insistentemente em sua própria consciência perturbada. No fundo, ela sabia que Adriana tinha razão; uma pontada aguda de culpa a atravessou, como uma agulha fria, mas a necessidade premente de silenciar a dor avassaladora era infinitamente mais forte, gritando mais alto que qualquer razão ou remorso.
Sem obter nenhuma reação verbal, apenas o silêncio teimoso e o olhar desviado, Adriana suspirou profundamente, a decepção velando a tristeza em seu rosto.
— Eu não irei mais compactuar com isso, Isis. Não posso mais ser testemunha da sua autodestruição silenciosa. Eu te amo, você sabe disso, mas ver você se afundando cada vez mais nesse abismo... eu simplesmente não aguento mais. — E com essa declaração dolorosa, um ultimato carregado de amor e desespero, Adriana pegou sua bolsa, o fecho estalando no silêncio opressor do apartamento, e saiu, deixando Isis sozinha com o peso esmagador do silêncio e a companhia sombria de seus próprios demônios.
As palavras de Adriana reverberavam na mente de Isis, um sussurro persistente e incômodo em meio ao barulho ensurdecedor de sua própria dor lancinante e da fúria corrosiva que a consumia por dentro. Por alguns momentos fugazes, a culpa e a genuína preocupação da amiga a faziam hesitar à beira da porta, antes de se lançar novamente na escuridão da noite, sentindo o peso do julgamento silencioso pairando sobre seus ombros. Uma batalha interna se travava com ferocidade: uma parte sua, exausta e solitária, ansiava por permanecer ali, naquele silêncio forçado, para finalmente tentar processar a dor lancinante que a dilacerava; mas a outra parte, selvagem, ferida e consumida pela raiva inextinguível contra seu pai e a figura intrusa da "madrasta", implorava por oblívio imediato, por uma fuga desesperada da realidade cruel.
Mas a necessidade visceral de escapar, de silenciar a avalanche incessante de lembranças dolorosas da perda da mãe e a fúria persistente que borbulhava em suas veias, invariavelmente vencia a frágil resistência da sua consciência. A escuridão da noite parecia um refúgio ilusório, um lugar onde ela podia se perder momentaneamente, na vã esperança de não ter que se encontrar com a dor que a espreitava em cada canto da sua mente.
Isis sentiu um misto estranho e paradoxal de alívio imediato e uma profunda solidão gelada. Alívio por não ter que mais lidar com o olhar preocupado e silenciosamente desaprovador da amiga, um espelho constante de sua própria autodestruição; e uma solidão cortante, por saber que mergulharia na escuridão da noite sem o seu escudo protetor, sem a sua única ligação genuína com o mundo que ela sentia estar deixando dolorosamente para trás – sozinha, pela escolha amarga de Adriana de não mais testemunhar sua lenta e dolorosa autodestruição.
Ela se arrumou com uma ousadia quase suicida, escolhendo a roupa mais escura e provocadora que encontrou em seu guarda-roupa, um contraste gritante com a palidez do seu rosto marcado pelas inúmeras noites mal dormidas, pelos olhos inchados e sombreados. A maquiagem carregada, pesada e escura nos olhos, era uma tentativa desesperada e vã de esconder as olheiras profundas que a denunciavam e o brilho febril, quase insano, que havia tomado conta do seu olhar desesperado. Bebeu antes mesmo de sair do apartamento, um gole rápido e queimante de vodka direto da garrafa, sentindo o líquido áspero queimar sua garganta, na tentativa de anestesiar a ansiedade paralisante e dar o primeiro empurrão na descida vertiginosa que ela buscava incessantemente.
Na festa, o ritmo pulsante e repetitivo da música eletrônica vibrava como um segundo coração caótico em seu peito vazio, a multidão anônima era um mar denso de corpos em constante movimento, todos buscando o mesmo escape efêmero na batida incessante e no brilho ofuscante das luzes estroboscópicas. Isis bebeu mais do que de costume, misturando indiscriminadamente diferentes bebidas alcoólicas sem pensar nas consequências, até que o mundo ao seu redor começasse a se inclinar perigosamente. A cabeça girava em uma vertigem prazerosa e perigosa, as luzes estroboscópicas embaralhando sua visão até o mundo se tornar um borrão abstrato de cores e formas indistintas, a tênue linha da sua consciência vacilando perigosamente em alguns momentos antes de ser tragada novamente pelo ritmo frenético e hipnótico da música. Em algum momento daquela noite nebulosa, buscando um alívio ainda mais potente para a dor lancinante que a corroía, aceitou uma pequena pílula de um estranho, engolindo-a com um gole de bebida, sentindo uma onda artificial de euforia percorrer seu corpo, distorcendo ainda mais sua percepção da realidade.
A dança era frenética, quase violenta, um espasmo desesperado para tentar expulsar a dor lancinante, a raiva inextinguível e o medo paralisante através do movimento incessante, de sacudir a alma até que ela ficasse dormente e insensível.
As horas se esvaíram em um borrão denso e nauseante de álcool barato, suor pegajoso e um barulho ensurdecedor que latejava em seus ouvidos. Em algum momento impreciso daquela noite caótica, Isis se viu sozinha, completamente desorientada, apoiada em uma parede fria e áspera do lado de fora do clube ou em um beco escuro e mal iluminado adjacente, o corpo dormente e pesado, e a mente perigosamente confusa, lutando para processar a realidade fragmentada. Sentiu o frio cortante da noite gélida em sua pele exposta, um arrepio percorrendo sua espinha, apesar do calor artificial do álcool e da droga que ainda circulavam em suas veias. Pegou o celular na bolsa, mas com os dedos trêmulos e descoordenados mal conseguia segurá-lo direito, a tela escorregadia. A tela brilhava com uma miríade de contatos desconhecidos, rostos indistintos e nomes de pessoas que ela mal lembrava ter conhecido naquela noite nebulosa, e algumas mensagens de texto confusas e sem sentido que ela não conseguia decifrar em seu estado alterado de consciência.
A realidade a atingiu com a força brutal de um balde de água fria jogado diretamente em seu rosto: ela não fazia a menor ideia de onde estava ou de como voltar para a segurança do seu apartamento. Estava longe, em um bairro desconhecido e sinistro, onde as sombras alongadas dançavam de forma ameaçadora sob a luz bruxuleante e amarelada de postes distantes, e o silêncio era sinistramente pontuado por ruídos inexplicáveis que eriçavam os pelos da sua nuca. A embriaguez profunda e a névoa da droga toldavam sua memória e seus sentidos, desorientando-a completamente e deixando-a perigosamente vulnerável à escuridão da noite e a qualquer perigo real que pudesse espreitar nas esquinas desertas e silenciosas. Uma onda gelada de pânico puro percorreu seu corpo, o coração martelando descompassadamente contra suas costelas, a respiração curta e entrecortada, e um nó de terror apertando sua garganta. Ela se sentia terrivelmente exposta, uma presa fácil e isolada em um território completamente desconhecido e potencialmente hostil.
Pela primeira vez em muito tempo, a máscara de rebeldia agressiva, de autossuficiência forçada e de controle ilusório ruiu completamente, desmoronando como um castelo de cartas, revelando a fragilidade e o medo cru e visceral que ela tanto se esforçava para esconder do mundo e de si mesma.
Olhou ao redor, a rua escura, deserta e silenciosa parecia subitamente infinitamente ameaçadora. Cada sombra alongada parecia abrigar um perigo iminente, cada ruído distante soava como um prenúncio sinistro em seus ouvidos hipersensíveis, o medo distorcendo sua percepção da realidade de forma assustadora. A sensação avassaladora de vulnerabilidade era paralisante, prendendo-a no lugar como se seus pés estivessem colados no asfalto frio. Em um ato de desespero instintivo, seus dedos trêmulos e gelados deslizaram hesitantemente pela tela do celular, procurando um nome familiar em meio à lista caótica e confusa de contatos desconhecidos. Um nome que ela relutava visceralmente em pronunciar, a última pessoa a quem ela pediria ajuda em qualquer circunstância normal, mas que, naquele momento de pânico extremo e solidão assustadora, parecia ser sua única e humilhante salvação. O nome de seu pai.
A ligação tocou algumas vezes, cada toque ecoando no silêncio da noite como um prenúncio sombrio, aumentando exponencialmente o pânico crescente em seu peito. Finalmente, a voz distante, fria e claramente irritada de Edmundo soou do outro lado da linha, denunciando sua impaciência por ser incomodado naquela hora da noite.
— Que infernos você quer? Sabe perfeitamente que estou ocupado a esta hora. Fale rápido, Isis.
A voz de Isis estava embargada pelo choro silencioso, pelo medo paralisante e pela confusão da embriaguez, soando fina e terrivelmente frágil do outro lado da linha. — Pai... sou eu, Isis. Eu... eu não sei onde estou. Eu me perdi... Pai, por favor, eu preciso desesperadamente de ajuda.
Houve um suspiro alto e impaciente do outro lado da linha, quase um rosnado de irritação contida. — Pelo amor de Deus, Isis. E o que eu posso fazer em relação a isso? Você se meteu nessa confusão sozinha, não foi? Como sempre faz. Se vire, eu já te dei um apartamento para você ter sua independência.
Antes que Isis pudesse implorar, soluçando silenciosamente, uma outra voz masculina, grave, calma e surpreendentemente rouca, como se as cordas vocais fossem feitas de um veludo áspero e imponente, soou claramente ao fundo da ligação, muito próxima a Edmundo.
— Edmundo, já chega. O tempo é precioso e não podemos perdê-lo com trivialidades. Quem está te incomodando a essa hora?
Edmundo pigarreou discretamente, a voz voltando ao seu tom ríspido e autoritário usual, mas com uma pressa evidente em se livrar da filha e retornar à conversa importante que fora interrompida. — É a minha... filha. Isis. Se meteu em alguma estupidez por aí, como é de costume dela. Bebendo, imagino. Já vou resolver essa inconveniência rapidamente.
Para o crescente desespero de Isis, a frieza implacável de seu pai parecia completamente intacta, inabalável até mesmo pelo seu medo genuíno e pelo seu completo desamparo naquela situação de vulnerabilidade extrema. A preocupação paterna era quase nula, totalmente sobreposta pela irritação de ter sido interrompido em seus negócios importantes – negócios importantes que envolviam a presença e a voz grave que ecoava ao fundo da ligação, uma voz que ela não reconhecia, mas que emanava uma aura inegável de poder silencioso e causou um arrepio frio percorrendo sua espinha, como se uma sombra fria e ameaçadora tivesse se estendido sobre ela.
— Pai, por favor... eu estou com muito medo. Um medo terrível. Eu realmente não sei como voltar para casa. Me ajuda... por favor, pai...
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Atualizado até capítulo 60
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