O Peso da Coroa
Ser Alfa não é privilégio.
É um legado. Um fardo pesado como aço... e afiado como lâmina.
Aqui, dentro dos limites da Matilha Shadowmoon, eles sabem quem eu sou.
A Alfa. A líder absoluta. Aquela que não se curva.
Mas lá fora... o mundo vive uma mentira cuidadosamente construída.
Para os outros alfas, para as matilhas vizinhas, para os velhos conselhos ultrapassados, quem comanda Shadowmoon é um macho — uma figura invisível, fictícia, criada para sustentar uma ilusão conveniente.
Eles não aceitariam se curvar a uma fêmea.
Então… eu deixo que subestimem.
O erro deles será sua ruína.
O som de corpos chocando-se, de rosnados, de patas contra a terra molhada, enchia a clareira de treinamento. O cheiro de suor, de esforço e de determinação misturava-se ao perfume úmido da floresta.
— Mais rápido! — Minha voz ecoou firme, carregada de autoridade. — Quem cair... que não se levante mais. Não há espaço para fracos na minha matilha.
Meus olhos percorreram cada rosto, cada corpo, cada músculo tenso. Eles treinavam até os ossos gritarem, até os limites serem esmagados.
Porque Shadowmoon não aceita fraqueza.
Na borda da clareira, minhas duas gamas e minha beta observavam em silêncio, vigilantes.
Amara, minha beta, estrategista implacável, mente afiada como faca, minha mão direita.
Selene, gama, a guerreira. Letal. Selvagem. A personificação da força.
Kaela, gama, inteligente, sagaz, minha conselheira nas sombras, mestra da informação e da diplomacia.
Elas eram mais que parte da liderança. Eram minhas irmãs de alma. Juntas, sustentávamos Shadowmoon.
— Se aquele ali tropeçar de novo, eu quebro as duas pernas dele — Selene rosnou, cruzando os braços.
— Não precisa, ele vai cair antes de você chegar perto — respondeu Kaela, arqueando uma sobrancelha.
— Não sejam tão duras — Amara sorriu de canto, gélida. — Ele ainda pode aprender... ou morrer tentando.
Soltei uma risada baixa, mas algo, de repente, mudou.
O vento soprou, trazendo um cheiro.
Não.
Não era um simples cheiro.
Era selvagem. Quente. Cortante.
Me atingiu como um raio direto na espinha. Meu lobo se ergueu dentro de mim, urrando, inquieto, feroz. E... algo mais. Algo que nunca senti antes.
Minha pele se arrepiou. Meu coração falhou uma batida.
Meu corpo inteiro entrou em estado de alerta.
— Vocês sentiram isso? — Minha voz saiu mais grave, carregada de instinto.
— Sim — respondeu Amara, os olhos se apertando, farejando. — Está nas fronteiras.
— Isso... não é só um cheiro. — Selene rosnou, mostrando os dentes. — É... algo mais. Errado. Intenso. Quase... pessoal.
— Não reconheço, mas... não gosto disso — completou Kaela, cruzando os braços, o olhar atento.
Estalos. Galhos partidos.
Passos apressados vindo da mata.
Dois dos batedores surgiram, visivelmente tensos, pálidos, com o cheiro do medo impregnado.
— Alfa... — o primeiro se curvou, respirando com dificuldade. — Você precisa ver isso. Agora.
Meu maxilar travou. As garras já pressionavam a ponta dos dedos. Meu lobo arranhava por liberdade. O cheiro... continuava no ar. Forte. Marcante. Dominante.
Inaceitável. Irresistível. Perigoso. Familiar, de uma forma que eu não compreendia… mas que meu instinto reconhecia.
Ergui o queixo. A postura de quem nasceu para comandar. De quem não teme. De quem carrega... o peso da coroa.
— Leve-me até lá — ordenei, fria, cortante, implacável.
Atravessamos a clareira em silêncio, nossos passos eram ágeis, precisos, mas pesados o suficiente para marcar presença. Meus batedores iam na frente, guiando o caminho por entre as árvores densas que formavam o coração do nosso território.
A cada metro que avançava, o cheiro se tornava mais forte, mais intenso, mais... insuportavelmente viciante. Meu lobo estava em ebulição, os sentidos em chamas, uma mistura perigosa de alerta, desejo e raiva que fazia meu controle vacilar.
Meus olhos âmbar se estreitaram quando a linha das fronteiras se revelou. E então eu o vi.
Uma silhueta alta, imponente, ombros largos, cabelos escuros desgrenhados, vestígios de terra nas botas e nas roupas. As mãos estavam cruzadas nas costas, o peito inflava em pura confiança, ou talvez... desafio.
Ele estava exatamente sobre a linha que separava a segurança do meu território do resto do mundo.
Nem um centímetro além. Nem um centímetro aquém.
Deliberado. Provocante.
Quando nossos olhos se cruzaram, algo dentro de mim... quebrou.
Ou talvez se acendesse. Ou se desmoronasse. Não sei.
Meu corpo inteiro congelou.
Meu lobo rugiu, desesperado, possessivo, dominado por uma fúria e um desejo que nunca experimentei antes.
O cheiro fazia sentido agora. Era dele.
Meu companheiro.
— Que merda... — Amara sussurrou atrás de mim, percebendo antes que eu confirmasse.
Selene soltou um rosnado baixo. — Isso não pode ser real...
Kaela apenas cruzou os braços, olhos apertados, estudando-o como quem avalia uma bomba prestes a explodir.
Ele deu um passo à frente, calmo, predatório, os olhos de um dourado tão profundo que pareciam arder.
— Então... — Sua voz era grave, rouca, arrastada, carregada de algo selvagem que me fez perder meio segundo de raciocínio. — A famosa matilha Shadowmoon.
Me obriguei a erguer o queixo, recuperar meu controle, afundar meu lobo no peito.
Eu era a Alfa.
Não importa quem ele seja. Não importa o que o destino grite.
— Você está em território proibido — minha voz saiu cortante, mais gélida do que eu esperava. — Tem cinco segundos para recuar antes que eu arranque sua cabeça e pendure na cerca.
Ele sorriu. Um sorriso lento, arrogante, carregado de dentes brancos e desafio.
— Não vim aqui por acaso, Alfa.
O jeito que ele pronunciou "Alfa" me fez entender.
Ele sabia.
Sabia que não era um homem no comando. Sabia que eu era a líder.
Meus olhos faiscaram.
— Quem te mandou aqui? — Cruzei os braços, firme, dominando minha respiração. — Ou acha que pode invadir meu território e sair inteiro?
Ele deu mais um passo. O cheiro dele me golpeou como uma marreta. Cedro, fumaça, couro... e algo mais. Algo que grudou na minha pele e queimou minhas entranhas.
— Ninguém me mandou. — Ele parou, inclinou a cabeça como quem observa uma presa... ou uma futura amante. — Eu vim... porque o destino não me deu escolha.
Meu coração falhou outra batida. Meu lobo se debateu, urrando, enlouquecido.
Companheiro.
Meu.
Companheiro.
Mas ele...
Ele não parecia nem um pouco disposto a se curvar.
Nem eu.
A tensão era palpável. A eletricidade no ar parecia prestes a incendiar a floresta inteira.
— Isso vai ser... divertido — ele sorriu, com aquela voz rouca, selvagem, perigosa.
Cerrei os punhos, segurando meu lobo à força, enquanto minha voz saia como lâmina afiada:
— Cuidado... muito cuidado...
Porque brincar com fogo, lobo... é pedir para se queimar.
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Atualizado até capítulo 54
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