Os meses se passaram como folhas levadas pelo vento — rápidas, mas cheias de pequenos detalhes que, para Ivan e Max, significavam tudo. Eles não se tocavam, não no sentido convencional — nem mãos dadas, nem abraços, nem beijos. Mas o amor estava ali, pulsando em cada olhar prolongado, em cada sorriso tímido, em cada vez que Ivan apertava o chaveirinho no zíper da mochila de Max.
Era um namoro feito de códigos secretos, de silêncios que falavam mais do que mil palavras, e de pequenas rotinas que só eles entendiam. E, apesar disso, havia algo que começava a crescer, meio incômodo, meio inquieto: nenhum dos dois conhecia os pais um do outro.
Não era exatamente algo que eles evitassem... só que nunca parecia o momento certo.
— Você acha... estranho? — perguntou Max, uma tarde, mexendo no cadarço do tênis enquanto estavam sentados no banco da praça onde sempre se encontravam. — A gente já namora há meses... e... eu nem sei se sua mãe sabe que eu existo.
Ivan apertou o chaveirinho, demorando um pouco antes de responder.
— Ela sabe que... eu saio. — respondeu, olhando pro chão, como quem escolhia as palavras com muito cuidado. — Mas... não sabe... exatamente com quem.
Max respirou fundo, assentindo lentamente.
— E... tudo bem. — disse, sincero. — Eu entendo. Sabe que eu entendo. Só que... às vezes fico pensando. Será que... sei lá... um dia a gente vai... existir de verdade? Fora daqui. Fora do nosso mundinho.
Ivan ficou em silêncio. Apertou o chaveirinho mais uma vez, mais forte desta vez. A respiração ficou um pouco mais curta, e Max percebeu. Não insistiu. Só ficou ali, esperando, oferecendo presença.
Depois de alguns segundos, Ivan falou, baixinho:
— Eu... queria. De verdade. Mas... só de pensar, dá um nó aqui — levou a mão ao próprio peito, sobre o moletom —, e aqui — tocou a garganta, a voz saindo trêmula. — É... muito.
Max assentiu, sorrindo com doçura.
— Então, a gente vai no seu tempo. Sempre no seu tempo. Tá?
Ele não disse, mas pensou: Você vale a espera. Todo o tempo do mundo, se for preciso.
Ivan olhou pra ele, e, por um instante, seus olhos pareciam querer dizer mil coisas que sua boca ainda não conseguia. Mordeu levemente o lábio, desviou o olhar pro chão e respirou fundo, como quem se preparava pra mergulhar em águas muito fundas.
— Max... — começou, com a voz quase sumindo. — E se... se eles não entenderem? Se... acharem que... eu sou estranho? Que a gente... é estranho?
Max ajeitou a mochila no colo, se inclinando um pouco pra frente, com aquele cuidado de quem segura algo muito precioso.
— Então... eles vão estar errados. — respondeu, simples, mas firme. — Porque você não é estranho. E... o que a gente tem... não é estranho. É nosso. E é bonito pra caramba.
Ivan apertou mais uma vez o chaveirinho, quase como um reflexo automático. Ficaram alguns segundos em silêncio, até que ele deixou escapar um sorriso pequeno, meio triste, meio aliviado.
— Você sempre sabe o que dizer... — sussurrou.
— Nem sempre... — Max deu uma risadinha, coçando a nuca. — Às vezes eu só... falo o que eu sinto. E o que eu sinto é que... eu te amo, Ivan. Muito.
O coração de Ivan deu um salto, como se por um segundo esquecesse como bater direito. Seus olhos se arregalaram um pouco, e ele segurou o chaveirinho com mais força, respirando rápido. O corpo inteiro ficou tenso, dividido entre o pânico e a felicidade esmagadora.
Por alguns segundos, ele não conseguiu responder. Mas então, bem baixinho, quase como se as palavras precisassem atravessar um labirinto inteiro pra saírem, ele disse:
— Eu... também. — olhou pra Max, os olhos brilhando, marejados, mas sem tristeza. — Eu te amo... muito.
Max sorriu, largo, com os olhos também brilhando. Não tentou tocar, nem se aproximou além do que sabia que era seguro. Só ficou ali, olhando, deixando que aquele momento existisse do jeito que era possível.
— Então... um passo de cada vez, né? — disse, com aquele sorriso que parecia sempre carregar um pedaço de sol. — E, quando você se sentir pronto... a gente enfrenta isso junto. Seus pais, os meus, o mundo. Juntos. Tá?
Ivan assentiu, apertando de novo o chaveirinho, mas dessa vez o gesto parecia ter outro peso — não mais só um pedido de conforto, mas quase uma promessa silenciosa.
— Juntos. — confirmou, com um sorriso tímido, mas cheio de coragem.
Naquela tarde, eles ficaram ali por mais algum tempo, falando de coisas leves, rindo de piadas bobas, desenhando caminhos invisíveis com os olhos no céu e nas nuvens. Mas, mesmo no meio das conversas casuais, algo tinha mudado. Um passo invisível, mas gigante, havia sido dado.
Dias depois, a inquietação voltou, dessa vez diferente. Ivan começou a perceber que, por mais que o medo apertasse, a ideia de esconder Max do resto do mundo doía mais. Era como se estivesse dividindo a própria vida em dois mundos: o onde ele podia ser inteiro com Max, e o onde ele ainda precisava se encolher, se esconder, caber nas expectativas dos outros.
Certa noite, já deitado, encarando o teto do quarto, Ivan apertou o chaveirinho que agora estava pendurado na prateleira perto da cama. Pegou o celular, ficou encarando a tela por longos minutos e, enfim, abriu a conversa com Max.
"Acho que tá na hora. De você conhecer ela. Minha mãe." — digitou, sentindo o coração bater tão forte que parecia sacudir o colchão inteiro.
A resposta não demorou mais que alguns segundos.
"Sério? Tem certeza? Só se você estiver confortável, tá?"
Ivan respirou fundo. As mãos tremiam, mas, ainda assim, ele respondeu:
"Não tô 100% confortável, pra ser sincero... Mas acho que nunca vou estar se ficar esperando isso. E... eu quero. Quero que ela saiba quem é você. Quem é... quem me faz sorrir desse jeito."
Max demorou um pouco mais dessa vez, e então mandou:
"Ivan... você não faz ideia do quanto isso significa pra mim." E, logo em seguida, uma foto de um bonequinho sorrindo, com um coração gigante no peito.
Ivan riu baixinho, segurando o celular contra o peito.
"Amanhã, depois da escola. Vem aqui em casa. Eu aviso ela hoje." — escreveu, antes que a coragem resolvesse fugir.
Do outro lado da tela, Max respondeu com algo simples, mas que fez o peito de Ivan se encher de um calor bom:
"Tamo junto. Pra tudo."
E, pela primeira vez, ao invés de apertar o chaveirinho pra se acalmar, Ivan só segurou — e sorriu.
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Atualizado até capítulo 24
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