Vendida ao Don Italiano
Ayla não sabia que era o último dia.
O sol ainda nem havia nascido quando os passos pesados ecoaram pelo corredor estreito do apartamento mofado. Ela já conhecia o som: botas arrastadas, cheiro de álcool velho, hálito de cigarro e dívidas. Seu pai. Ou o que restava dele.
— Levanta. Agora.
A voz cortou o silêncio como faca em carne mole. Sem entender, Ayla sentou-se na beirada do colchão murcho. Usava apenas uma camiseta velha, grande demais, e calcinha. O frio da madrugada arrepiava sua pele, mas não tanto quanto o que sentiu ao ver os dois homens que entraram logo atrás.
Eles não falavam. Só a observavam. Um com uma cicatriz larga no pescoço, o outro com um capuz cobrindo metade do rosto. Seus olhos eram frios, calculistas. Olhos de quem já tinha feito aquilo muitas vezes antes.
— Pai, o que tá acontecendo? — Ela perguntou, a voz fraca, trêmula.
Ele não respondeu. Só desviou o olhar. Covarde.
Foi então que a ficha caiu. A mala. Jogada no canto. Suja, mas pronta. E então ele disse, sem alma:
— Eles vão cuidar de você agora. Vai pagar minha dívida e ainda vai ter onde dormir.
Ayla não teve tempo de correr. Um deles a segurou pelos braços com brutalidade, enquanto o outro puxava uma seringa do bolso. Ela gritou, chutou, tentou escapar, mas a agulha entrou em seu pescoço como um beijo envenenado.
Tudo ficou lento.
As luzes, os sons, o mundo.
O último som que ouviu antes de desmaiar foi o de seu pai contando dinheiro.
Quando Ayla acordou, o mundo tinha mudado.
O chão era gelado, de pedra escura. As luzes eram vermelhas, fracas, quase sensuais — um contraste cruel com a realidade grotesca que a cercava. Ela estava em uma sala sem janelas, com outras garotas ao redor, muitas delas mais novas, algumas drogadas, outras chorando em silêncio.
O cheiro era uma mistura insuportável de perfume barato, suor, medo e sangue seco.
Ela tentou se levantar, mas seus pulsos estavam algemados a uma barra de ferro. Um colar de couro envolvia seu pescoço com uma etiqueta metálica pendurada. Número 47.
— Nova entrega —, disse uma mulher alta, de vestido justo e salto alto, ao passar. — Vai render bem. Tem cara de inocente. Os clientes adoram.
Ayla tentou gritar, mas sua voz mal saía. Sua garganta estava seca, o corpo ainda fraco. Olhou em volta e percebeu que ninguém ali parecia acreditar na própria existência. Eram cascas. Bonecas quebradas. Como ela seria em breve.
Horas depois, foi levada a um chuveiro coletivo. Despida à força. Lavada como mercadoria. Cortaram seu cabelo sem perguntar, tiraram sua calcinha como se arrancassem sua dignidade junto. Riram quando ela chorou. Riram quando tentou se cobrir. Ali, vergonha era um luxo que não durava muito.
Depois, a levaram ao Quarto de Avaliação.
Luzes mais fortes. Um sofá de couro vermelho. Uma câmera. Um homem de terno e uma prancheta. Ele não tocou nela. Ainda. Só observou enquanto a mulher que o acompanhava ordenava que ela se virasse, se ajoelhasse, abrisse a boca.
— Bom porte. Olhos fortes. Vai precisar de treino. Mas vai vender bem. Nome?
— Não importa —, disse a mulher. — Agora ela é Vênus Quarenta e Sete.
E assim, Ayla deixou de existir.
Não foi com um grito. Nem com sangue.
Foi com silêncio.
Com a morte lenta da esperança.
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Atualizado até capítulo 29
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