– Muros Quebrados
Nos dias que se seguiram, Gael parecia determinado a conquistar cada pequeno espaço da vida de Isabella. Não de forma invasiva, mas com uma presença constante, sólida, como se quisesse mostrar a ela que podia confiar, que podia se permitir… mesmo sem perceber, ela começou a ceder.
Havia flores enviadas sem bilhete em manhãs aleatórias. Mensagens simples no meio do dia: “Pensando em você.” Ou um convite inesperado: “Tem uma exposição nova… quer ir?”
Isabella, que sempre fora tão contida, tão focada em seu trabalho na moda, percebia que havia sorrisos que surgiam espontâneos quando via o nome dele no celular. Começou a se pegar escolhendo a roupa com mais cuidado quando sabia que o veria, ajeitando os cabelos com uma ansiedade que não conhecia.
Cada encontro parecia derrubar um tijolo dos muros que ela havia erguido ao redor de si.
Em uma tarde de sábado, ele a levou para fora da cidade, num lugar cercado de vinhedos — ironia, considerando que o negócio da família dela não era vinho, mas Isabella se apaixonou pela paisagem.
Fizeram um piquenique à sombra de uma árvore, e quando ela comentou, rindo, que nunca tinha feito algo tão clichê, Gael apenas respondeu:
— Clichês existem porque funcionam.
E então, segurou sua mão, acariciando com o polegar a pele delicada do dorso, sem dizer mais nada. Isabella sentiu um calor subir-lhe ao rosto, e pela primeira vez, não afastou a mão.
Mais tarde, quando o sol começou a se pôr, Gael a puxou para uma dança silenciosa, ali, no meio do campo. Não havia música, só o som do vento e do coração dela batendo forte.
Isabella encostou o rosto no peito dele, fechou os olhos e, por um instante, se permitiu: sem perguntas, sem reservas.
Quando o olhar dele cruzou o dela, ela soube… estava se apaixonando.
E isso a assustava tanto quanto a fazia sorrir.
Mas, ao mesmo tempo que esses sentimentos cresciam, uma parte de Isabella permanecia alerta. Havia algo em Gael… uma sombra que ela não conseguia nomear, uma hesitação nos olhos, como quem escondia um segredo.
Só que agora… ela já não sabia mais se queria descobrir a verdade ou apenas continuar vivendo aquela ilusão por mais algum tempo.
A tarde estava suave, o jardim da casa dos Valmont exalava o perfume das roseiras recém-podadas, e Leonor, como de costume, preparava um chá na varanda enquanto lia um dos seus romances favoritos.
Isabella se aproximou devagar, parou por um segundo ao lado da mãe, observando o quanto ela parecia tranquila, serena… tão diferente do turbilhão que ela própria sentia por dentro.
— Mamãe… — chamou, com a voz mais suave que conseguia.
Leonor ergueu o olhar, fechou o livro com um sorriso afetuoso e logo percebeu o ar pensativo da filha.
— O que foi, meu amor?
Isabella se sentou na cadeira ao lado, puxando as pernas para cima, como fazia quando era criança.
— Preciso te contar uma coisa… mas não sei bem como.
Leonor sorriu, paciente, e passou a mão pelos cabelos da filha.
— Então não se preocupe em como… apenas diga.
Isabella respirou fundo, olhando para o jardim como quem busca coragem entre as flores.
— Acho que… acho que estou me apaixonando.
Leonor parou o movimento de levar a xícara aos lábios e encarou a filha com um brilho curioso nos olhos.
— Por Gael? — perguntou, como quem já soubesse a resposta.
Isabella arregalou um pouco os olhos, surpresa.
— Como você…?
— Sou sua mãe, querida. Eu vejo como você fala dele, como seu olhar muda quando o nome dele surge numa conversa.
Isabella soltou um riso tímido, meio sem graça, e escondeu o rosto entre as mãos.
— É estranho… eu sempre fui tão fechada pra essas coisas… tão focada no meu trabalho, nas minhas metas… e agora… — respirou fundo — ele vai quebrando as barreiras, uma a uma. E eu nem sei como impedir.
Leonor se aproximou e segurou a mão da filha com carinho.
— E por que você quer impedir?
Isabella ficou em silêncio por alguns segundos antes de responder:
— Porque… eu sinto que ele esconde alguma coisa, mãe. Como se tivesse algo na história dele que… eu não conheço. E meu coração fica dividido: uma parte quer se jogar sem medo… mas a outra me grita: “Cuidado.”
Leonor apertou sua mão, compreensiva.
— O amor, minha filha, sempre traz riscos. Às vezes, a gente se machuca… mas às vezes… a gente descobre que vale a pena.
Isabella deixou uma lágrima silenciosa escorrer pelo canto do olho.
— Eu tenho medo.
Leonor enxugou a lágrima com carinho.
— Eu sei… mas eu também sei que você é forte. E seja qual for a verdade… você vai saber o que fazer.
Isabella assentiu, ainda com o coração apertado, mas, ao mesmo tempo, aliviada por ter compartilhado com quem sempre soube acolhê-la.
Leonor sorriu e beijou o topo da cabeça da filha.
— Só te peço uma coisa… se ele fizer seu coração bater mais forte… não fuja, Isa. Não fuja.
Isabella sorriu, abraçada à mãe, enquanto ao longe, o som de uma notificação no celular soava.
Ela olhou: “Gael: Estou com saudades. Quer jantar comigo hoje?”
E então, seu coração bateu mais forte.
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Os encontros entre Isabella e Gael se tornaram mais constantes e naturais. Ela, mesmo sem perceber, já o incluía em pequenos detalhes da sua rotina — um almoço entre reuniões, uma caminhada pelo parque no fim da tarde ou um café rápido antes de voltar para casa.
E, inevitavelmente, Gael começou a se aproximar da família Valmont.
Foi numa tarde de domingo, quando Isabella, de forma casual, mencionou que ele poderia aparecer na casa dos pais. Leonor, como sempre, acolhedora, não viu problema algum em conhecer “o rapaz que estava mexendo com a cabeça da filha”. Adam, por outro lado, manteve o olhar sóbrio e desconfiado.
Quando Gael chegou, com um vinho em uma mão e flores na outra, Leonor sorriu, mas Adam permaneceu sério.
— Boa tarde, senhor Valmont — cumprimentou Gael, estendendo a mão com educação e firmeza.
Adam o encarou, apertou a mão com a força exata para marcar presença, e respondeu, num tom que misturava cortesia e aviso:
— Boa tarde… Gael, não é?
Ele assentiu.
— Isso. Gael D’Angelo.
Adam estreitou ainda mais o olhar ao ouvir o sobrenome, como se aquilo acendesse uma fagulha antiga dentro dele… mas logo afastou o pensamento, achando que talvez fosse apenas paranoia. Leonor o puxou pelo braço, suavizando o ambiente, e logo os quatro estavam no jardim, conversando.
Enquanto Leonor e Isabella falavam sobre moda, Adam aproveitou a primeira oportunidade a sós com Gael, se aproximando e ficando lado a lado com ele, enquanto observavam as plantas que Leonor cuidava com tanto carinho.
— O que você quer com a minha filha? — perguntou, direto, sem rodeios.
Gael, sem se abalar, respirou fundo e respondeu com naturalidade:
— Gosto dela. Quero conhecê-la melhor… só isso.
Adam soltou um riso seco, descrente.
— Você não é o primeiro a dizer isso.
Gael manteve o olhar firme.
— Mas sou o único que está aqui agora.
Adam apertou os lábios, desconfortável. Algo naquele rapaz o incomodava. Não só pela ousadia, mas por uma sensação estranha, um déjà-vu que ele não conseguia explicar. Havia algo… familiar demais.
Leonor, percebendo a tensão, chamou os dois para a mesa.
— Venham! Vamos almoçar!
Durante o almoço, Gael foi cordial, educado, conversou sobre trabalho, viagens, livros… sabia como se portar, como conquistar. Isabella ria, relaxada, sem perceber a troca silenciosa de olhares entre o pai e o namorado.
Adam não conseguia relaxar.
Por fora, era um homem calmo e respeitoso. Por dentro… seus instintos gritavam.
Quando Gael se despediu, depois de mais algumas horas agradáveis, e Isabella o acompanhou até o portão, Adam ficou parado na varanda, observando.
Leonor se aproximou e tocou o ombro dele, sorrindo.
— Amor… ele parece um bom rapaz.
Adam não respondeu de imediato, apenas manteve o olhar fixo em Gael, que agora beijava a mão de Isabella antes de entrar no carro.
— Parece… — murmurou, quase para si mesmo. — Mas eu conheço muito bem esses “bons rapazes”.
Leonor franziu o cenho.
— Adam… você está vendo fantasmas.
Ele virou o rosto, fitando a esposa com uma expressão grave.
— Não, Leonor… estou vendo sinais.
E, embora ainda não soubesse, a verdade estava mais perto do que jamais poderia imaginar: Gael D’Angelo não era só um rapaz apaixonado… era também o filho daquele que, um dia, tentou destruir sua família.
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fim do capítulo
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