Notas de Sangue e Sedução

Notas de Sangue e Sedução

o caderno

O Colégio Saint Raven nunca pareceu como um lugar comum. Suas torres góticas, janelas com arcos imponentes e o vento cortante que parecia sempre assobiar pelas fendas da escola davam-lhe uma atmosfera de mistério, como se o próprio ambiente fosse imune ao tempo. Lá, todos seguiam um código não escrito: perfeição. Mas por trás dessa fachada impecável, algo estava podre. Algo que só os mais ousados conseguiam perceber.

Adriele, sempre a aluna perfeita, estava acostumada a ser invisível. Ela não se destacava. Não queria se destacar. Seus dias passavam entre as páginas dos livros e os corredores sem vida, um cenário monótono que se estendia até onde seus olhos podiam alcançar. Mas, naquela noite, o destino parecia querer mudar tudo.

A chuva, que havia começado com uma leve garoa, agora caía forte, martelando o telhado com uma intensidade que parecia gritar por socorro. O som das gotas batendo nas janelas ecoava como um murmúrio que se misturava ao silêncio de uma escola quase deserta. As aulas já tinham acabado há mais de uma hora, e as únicas pessoas no prédio eram os professores que ainda trabalhavam em seus escritórios e alguns alunos perdidos em suas obrigações. O resto da escola parecia enterrado em uma solidão que parecia estar à espera de algo. Ou alguém.

Adriele sentiu o peso da detenção ainda pendurado sobre ela. Não era a primeira vez que se metia em problemas. Ela, que sempre teve uma postura irrepreensível, acabara se envolvendo em uma briga com uma colega. A professora de literatura havia sido irônica demais ao comentar sua redação, e ela, sem pensar, a desafiou com palavras que queimavam na língua.

Ela olhou para o relógio. A detenção já estava terminando, mas algo dentro dela a impedia de sair. Algo que dizia para ela permanecer. Sentia uma inquietação crescente, como se o colégio estivesse respirando com ela. Como se houvesse algo... à espreita. Ou talvez fosse o medo disfarçado de curiosidade. De qualquer forma, seus pés a conduziram, sem que ela soubesse como, até o corredor mais vazio da escola.

O corredor estava em total silêncio, exceto pelo som distante da chuva. As luzes piscavam esporadicamente, criando sombras que pareciam se mover de maneira própria. À medida que caminhAva, o cheiro de mofo e velho ficava mais forte, misturado com algo mais... algo metálico. Adriele franziu a testa, mas continuou andando. Ela sabia onde estava indo. O armário 237, seu armário. O lugar onde, talvez, encontrasse um pouco de paz. Ou, quem sabe, algo mais.

Ao chegar diante do armário, ela fez um movimento automático, girando o cadeado, mas a chave não estava em seu bolso. Ela já sabia o que isso significava. Era o momento. Sem pensar duas vezes, ela forçou a abertura do armário. Quando a porta rangeu, um cheiro forte, quase sufocante, se espalhou pelo ar. O caderno estava lá. Encostado nas prateleiras de metal, ele parecia esperar por ela.

A capa do caderno era preta, suja e desgastada. Quando Adriele o pegou, percebeu que estava mais quente do que o esperado. Algo estava errado. O nome dela estava rabiscado à mão na capa, em letras trêmulas, quase como se alguém estivesse em pânico enquanto escrevia. E então, ela sentiu a ponta dos dedos encharcadas. Quando olhou, viu que não era tinta. Era sangue.

O impacto foi instantâneo. Um arrepio percorreu sua espinha, e seus olhos rapidamente percorreram as páginas, ávidos por respostas. O que ela encontrou foi uma confusão de palavras, rabiscos, símbolos estranhos, mas algo se destacava. Algo que parecia gritar em sua mente. No meio do caos, uma frase estava bem legível, escrita de forma a ser um soco no estômago:

“Você não é quem pensa que é. E ele já sabe.”

O sangue estava fresco. Era inegável. Ela não tinha dúvida. Seu estômago se revirou, mas algo ainda a puxava. Algo que a impedia de largar o caderno, de sair correndo. Ela sabia que havia algo mais ali. Algo que deveria descobrir.

Foi então que ela ouviu.

O som dos passos ecoando atrás de si, suaves, mas inconfundíveis. O ar pareceu se condensar em torno dela. Ela não precisava olhar para saber quem era. Ele estava ali. Samy.

O garoto mais temido de Saint Raven. Ele era um mistério, uma sombra que parecia flutuar pela escola, sempre tão distante e, ao mesmo tempo, presente. Os olhos de Samy eram como buracos negros — penetrantes, gelados, impossível de desviar o olhar. Não era um bom sinal. Não para ela.

Adriele engoliu em seco, segurando o caderno com força. Quando ela se virou, seus olhos se encontraram com os dele, e foi como se o tempo tivesse desacelerado. Samy estava ali, no final do corredor, apoiado contra a parede, com a jaqueta de couro preta, a expressão desinteressada de sempre, mas havia algo mais. Havia algo nos seus olhos. Algo que a fez sentir como se estivesse sendo observada, estudada.

— Demorou para encontrar, anjo — ele disse, a voz baixa, quase um sussurro. Cada palavra soava como se fosse uma promessa obscura. — Agora o jogo começa.

Adriele sentiu a adrenalina disparar. Ela deveria correr, gritar, fazer qualquer coisa. Mas, inexplicavelmente, seus pés estavam fixos no lugar. O medo deveria tê-la paralisado, mas havia algo mais. Algo que a atraía, algo que a fazia querer saber mais. Samy tinha aquele poder sobre ela. E ela odiava isso. Ou talvez amasse. Não sabia mais.

Ele deu um passo à frente, e a presença dele se tornou ainda mais opressiva. Ela tentou se afastar, mas seus músculos estavam tensos demais para reagir. Samy deu um sorriso torto, algo quase divertido.

— Não se preocupe, anjo. Isso vai ser mais interessante do que você imagina. Agora você sabe o que ninguém mais sabe. Ou melhor... sabe um pouco do que está por vir.

Adriele engoliu em seco. O caderno estava pesado em suas mãos, mas ela não conseguia largá-lo. O jogo começava e, pela primeira vez, ela sabia que não tinha controle nenhum. Ela era apenas uma peça, em um tabuleiro onde as regras eram desconhecidas, mas o risco era certo.

O sorriso de Samy desapareceu lentamente. Ele virou-se, começando a se afastar, e sua última palavra foi uma sentença.

— Boa sorte, anjo.

E então, ele desapareceu nas sombras. E Adriele, com o caderno ainda nas mãos, sentiu que sua vida nunca mais seria a mesma.

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