Verdades Veladas

Lucy acordou com o cheiro do chocolate quente e o som suave de uma playlist instrumental. Por um segundo, esqueceu que estava no meio de uma conspiração. O calor do cobertor, o aroma doce no ar e o som da chuva contra a janela criavam a ilusão de paz.

Mas então ela viu a foto.

A mesma que havia sido deixada em seu apartamento, agora repousando sobre o criado-mudo de Alex.

A ameaça era real. E estava perto demais.

— Trouxe com marshmallows, como prometido — disse Alex, entrando no quarto com duas canecas. — Dormiu um pouco?

— Um pouco. Mas a imagem daquela foto... está grudada na minha mente.

— E não vai sair tão cedo. Eles quiseram te assustar. Mostrar que têm acesso. Que estão no controle.

Lucy aceitou a caneca e o encarou.

— Mas você está mais calmo do que eu esperava.

Alex se sentou ao seu lado na cama, os olhos fixos nos dela.

— Porque estou acostumado com esse tipo de jogo. Só que agora... é diferente. Porque agora tem você no meio. E isso muda tudo.

Ela ficou em silêncio. O calor das palavras dele a envolveu mais que o cobertor.

— A gente precisa agir, Lucy. Antes que fique tarde demais.

**

Enquanto Alex transferia os arquivos das câmeras escondidas para o notebook, Lucy examinava um dos bilhetes deixados anteriormente — aquele do bilhete anônimo que dizia “Você sabe demais”. Ela o havia guardado, sem saber por quê. Agora parecia ser uma peça importante de um quebra-cabeça ainda mais sinistro.

— Isso aqui tem um cheiro químico estranho — disse ela, levando o papel ao nariz. — Como se tivesse sido impresso em algo além de papel comum.

Alex se virou para ela, curioso.

— Deixa eu ver.

Ele examinou o bilhete com uma pequena lanterna ultravioleta que tinha em seu kit de fotografia. As palavras impressas brilharam levemente sob a luz... mas havia mais.

— Espera... tem outra mensagem aqui. Uma escrita à mão com tinta invisível.

— O quê? — Lucy se aproximou, os olhos arregalados.

Alex ajustou a lanterna e leu em voz alta:

“Jardim da praça, sob o banco de ferro. Quarta, 20h.”

— Isso estava no bilhete esse tempo todo?

— Provavelmente. Escrito com uma tinta que só aparece com luz UV. É um recado escondido.

Lucy sentiu um arrepio.

— Você acha que é uma armadilha?

— Com certeza é um risco. Mas também pode ser alguém tentando ajudar. Alguém dentro do sistema... ou alguém que quer se livrar de culpa.

Ela mordeu o lábio.

— Vamos?

Alex hesitou por um segundo.

— Vamos.

**

Naquela noite, a praça estava quase deserta. O frio e a chuva fina afastavam os poucos que ainda ousavam passear por ali. Lucy e Alex chegaram juntos, com casacos escuros e gorros, tentando se misturar à penumbra.

— É esse o banco — sussurrou Alex, apontando para um assento de ferro com pintura descascada.

Ambos se aproximaram lentamente. Lucy se agachou primeiro, iluminando com a lanterna do celular por baixo do banco. Nada.

— Espera... tem algo aqui — disse ela, puxando uma pequena caixa metálica colada com fita adesiva.

Alex olhou ao redor, atento a qualquer movimento. Depois pegou a caixa e a escondeu sob o casaco.

— Vamos sair daqui. Rápido.

**

De volta ao apartamento dele, abriram a caixa com cuidado. Dentro, encontraram um pen drive e uma folha de papel dobrada ao meio.

No papel, uma única frase escrita à mão:

“Se vocês abrirem isso, vão entender o que está em jogo. Mas não poderão mais voltar atrás.”

Lucy engoliu em seco.

— Parece coisa de filme.

— Mas é real. E se tem algo aqui que pode nos dar vantagem, precisamos ver.

Ele conectou o pen drive no notebook.

Os arquivos começaram a abrir um por um: fotos de documentos, imagens de segurança com datas recentes, mapas de rotas, listas de nomes codificados. Entre eles, um arquivo de áudio nomeado como “Confissão”.

Alex deu play.

Uma voz masculina começou a falar, abafada por ruídos de fundo, mas clara o suficiente para ser compreendida.

— “O plano está em andamento. O apartamento 308 é apenas um dos pontos. Temos acesso às rotas de distribuição e aos nomes dos envolvidos no desvio. Eles não fazem ideia de que eu gravei tudo. Se algo acontecer comigo, isso precisa ir à imprensa. A verdade precisa sair.”

Lucy olhou para Alex, chocada.

— Ele estava denunciando alguém.

— E sabia que estava correndo perigo. Por isso deixou essas provas escondidas.

— Aquele apartamento... é só a ponta do iceberg, Alex.

— Sim. E agora a gente tem as provas de que eles mais temem.

**

Enquanto os dois analisavam os arquivos, o celular de Lucy vibrou. Era uma mensagem sem identificação:

“Vocês não deviam ter ido à praça.”

Ela mostrou o celular para Alex, que imediatamente desligou o notebook e tirou o pen drive.

— Isso confirma que estavam vigiando a praça. Têm olhos em todo lugar.

Lucy começou a andar de um lado para o outro.

— Eles vão vir atrás de nós. Agora mais do que nunca.

— Por isso a gente vai desaparecer por uns dias. Sair do radar.

— Como assim?

— Tenho um lugar fora da cidade. Isolado. Lá ninguém nos acha. A gente precisa de tempo pra entender todos os arquivos e planejar como expor isso.

Lucy hesitou.

— E minha loja? Meus compromissos?

— Por um dia ou dois, pode desaparecer. É sua vida que está em risco, Lucy.

Ela respirou fundo. Sabia que ele estava certo. Mas o peso de tudo caía sobre seus ombros como uma avalanche.

— Ok. Vamos.

**

No dia seguinte, bem cedo, pegaram a estrada em um carro alugado, com o pen drive escondido entre os forros do banco. Dirigiram por quase quatro horas até chegarem a uma cabana cercada por árvores, sem vizinhos, sem sinal de celular.

— Lugar discreto. Nunca usei meu nome aqui — explicou Alex, enquanto abria a porta com uma chave enferrujada.

— É... rústico — disse Lucy, olhando para o interior simples, mas acolhedor.

Ele sorriu.

— É seguro. E só isso importa agora.

Passaram o dia examinando os arquivos, cruzando dados, listando nomes e locais que apareciam nas imagens. Aos poucos, uma trama começou a se formar: uma rede de corrupção envolvendo empresas de fachada, políticos locais e um sistema de espionagem privada usado para chantagem.

— Isso aqui pode derrubar gente grande — disse Lucy, impressionada.

— E é por isso que estão dispostos a nos silenciar.

Naquela noite, sentaram-se em frente à lareira improvisada, envoltos em cobertores. A tensão ainda pairava no ar, mas havia uma sensação diferente entre eles. Algo mais profundo. Como se a verdade, apesar de perigosa, os tivesse unido.

— Nunca pensei que minha vida viraria isso — disse Lucy. — Eu só queria resolver uns problemas com o vizinho ranzinza.

Alex riu, virando-se para ela.

— E agora está fugindo com ele de criminosos internacionais.

— A vida realmente adora ironias.

Ele a puxou para perto, e dessa vez, o beijo foi mais longo. Mais calmo. Como se dissessem um ao outro, sem palavras, que tudo valia a pena.

Mesmo em meio ao caos, o amor deles florescia. No lugar mais improvável. Na hora mais perigosa.

E, mesmo que o amanhã fosse incerto, naquela noite, no meio do nada, Lucy soube que não estava mais sozinha.

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