Capítulo - Vozes na Escoridão

Vozes na Escuridão

Passei o resto da manhã andando pela mansão, tentando ignorar a sensação constante de ser observada. Cada quadro antigo, cada espelho empoeirado parecia esconder olhos invisíveis. A madeira do assoalho rangia sob meus pés, e as correntes de ar gelado que surgiam do nada me faziam estremecer. Eu me dizia que era apenas imaginação, mas o nó apertado no meu estômago dizia o contrário.

Atravessei uma galeria longa e mal iluminada. As pinturas nas paredes mostravam rostos de antepassados que pareciam me seguir com o olhar. A maioria deles era tão pálida e severa que eu mal conseguia encará-los por muito tempo. A mansão parecia congelada no tempo, presa em memórias que se recusavam a morrer. Cada sala que eu explorava parecia sussurrar segredos que não estavam prontos para serem revelados.

Na sala de música, encontrei um piano de cauda coberto por um lençol branco. Parte de mim quis levantar o tecido e ver o que havia ali, mas outra parte — mais prudente — me conteve. Instinto. Algo me dizia que certas coisas deveriam permanecer intocadas. Meu reflexo no espelho atrás do piano parecia distorcido, como se o vidro estivesse vibrando, respirando.

Quando o relógio da entrada soou três badaladas pesadas, voltei para a cozinha, onde Dorian, para minha surpresa, estava. Ele lavava as mãos na pia, os punhos molhados até metade dos antebraços. Seu rosto estava tenso, o maxilar cerrado. Notei uma mancha escura na manga da camisa, e por um instante, a pergunta queimou na ponta da minha língua.

Ele ergueu os olhos para mim, frios e controlados.

— Você... se machucou? — perguntei, tentando soar casual, mas minha voz soou mais frágil do que eu gostaria.

— Pequenos acidentes. — respondeu, secamente, como se não fosse nada.

Antes que eu pudesse insistir, ele desligou a torneira com força e saiu da cozinha, deixando um rastro de silêncio e tensão.

Fiquei ali por alguns segundos, encarando a porta por onde ele desaparecera. Havia algo nele que me intrigava — um tipo de dor que ele escondia tão bem quanto seus segredos.

Suspirei, frustrada. Peguei uma maçã da fruteira e mordi com força, tentando afogar minha curiosidade crescente. Era impossível ignorar que Dorian sabia mais do que dizia. E que, de alguma forma, eu já fazia parte disso.

À noite, depois de um jantar silencioso — onde trocamos no máximo três palavras —, recolhi-me ao meu quarto. A escuridão parecia mais densa ali, como se a casa absorvesse toda a luz. Apaguei o abajur e me deitei, esperando o sono que não veio.

Foi então que ouvi.

Um sussurro.

Fraco. Quase inaudível. Como se uma voz antiga soprasse dentro do próprio quarto. O som parecia vir de dentro das paredes.

Sentei na cama, o coração disparado, os olhos tentando perfurar a escuridão. O som parecia se repetir, mais nítido agora.

— Volte... — murmurava a voz.

Engoli em seco. Levantei devagar, com as pernas tremendo, e caminhei até o espelho no canto do quarto. Meu reflexo parecia errado — distorcido, fragmentado.

Por um instante, vi uma sombra movendo-se atrás de mim.

Gelei.

Virei rapidamente, mas o quarto estava vazio. O silêncio era tão absoluto que meu próprio respirar parecia um grito.

Voltei para a cama, puxando as cobertas até o queixo, incapaz de tirar os olhos do espelho agora inerte. Sabia, no fundo, que aquilo não era imaginação.

A mansão tinha segredos antigos.

E Dorian...

Dorian era a chave para eles.

Parte de mim queria fugir.

Mas outra parte queria descobrir cada maldito segredo, nem que isso me destruísse.

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