O inferno começou. — 05
Por seis anos, escondi meus sentimentos. Seis longos anos tentando apagar os rastros do passado, reconstruindo uma nova história, uma nova vida, sem carregar o peso da culpa. Mas agora… agora ele estava aqui. O homem que um dia me prometeu o céu, mas que, no fim, me fez afundar no mar.
Meu coração martela no peito, e o ar me falta.
Isabel
— Não se aproxime, Benjamin. — Minha voz sai num sussurro aflito, mas firme.
Ele para, a respiração pesada, os olhos carregados de um misto de dor e surpresa.
beijamin
— Isabel, por favor… vamos conversar. — A voz dele é baixa, quase suplicante. — Você sumiu há seis anos e agora, quando finalmente te encontro, você quer me mandar embora?
Seus ombros largos parecem ter perdido a força. As sobrancelhas unidas numa expressão sofrida me fazem desviar o olhar.
Isabel
— Não temos o que conversar, Benjamin. — Meu tom vacila, mas eu continuo. — Como pode ver, eu mudei. Tenho uma nova vida, um marido…
Mas antes que eu termine, ele me corta, e sua voz carrega uma certeza que me faz congelar.
beijamin
— … e um filho. Eu o vi.
Meu estômago revira. Meu peito aperta.
beijamin
— O nosso bebê é ele, Isabel?
O medo se instala de vez. Levo a mão ao peito, tentando conter o tremor dos meus dedos.
Isabel
— Não. — Digo rápido demais. — Não é. Ele é filho de Filipe, meu marido. Nosso bebê… — Engulo seco. — Nosso bebê morreu em meu ventre.
Benjamin não reage de imediato. Apenas me observa, com aqueles olhos profundos que um dia me fizeram acreditar em promessas impossíveis. Então, ele balança a cabeça lentamente.
beijamin
— Eu não acredito. — Sua voz sai rouca, embargada. — Não consigo acreditar. Ele não se parece em nada com aquele homem. Por favor, Isabel… me diga a verdade. Me diga.
Isabel
— Eu não lhe devo satisfação alguma, Benjamin.
Dou um passo para trás, tentando me afastar, mas ele move o corpo sutilmente e bloqueia a passagem. Meu coração dispara ainda mais.
Isabel
— Por favor… me deixe sair. — Minha voz treme. — Tenho medo do que possa acontecer. Só… só me deixe ir.
Ele cerra o maxilar, o peito subindo e descendo depressa, como se estivesse tentando segurar as palavras que realmente queria dizer. Mas então, ele solta um suspiro carregado e dá um passo à frente.
beijamin
— Você não vai sair daqui antes de me falar tudo o que me deve.
Sinto um arrepio subir pela espinha.
beijamin
— Você sumiu naquela noite… na noite em que devíamos fugir juntos. — A voz dele é um misto de dor e rancor. — Eu te prometi que daria uma vida boa para você e para o nosso filho. Eu lutei por isso, Isabel. Consegui riqueza, construí tudo do zero. Sou dono de várias perfumarias agora. Fiz tudo isso por nós, por um sonho nosso. O sonho que eu construí… pra você… e para o nosso filho.
As palavras dele me atingem como um soco no estômago. Ele estende a mão e segura a minha, e meu coração vacila. Meu peito aperta. Mordo o canto do lábio, sentindo as lágrimas queimarem meus olhos.
Isabel
— Você… você conseguiu? — Minha voz sai fraca, quase inaudível.
Lágrimas me ameaçam quando as lembranças do passado invadem minha mente. O garoto sonhador que um dia se ajoelhava diante da minha barriga, contando suas ideias sobre um império de perfumes. O mesmo garoto que jurou que nos tiraria daquela cidade, que nos daria um recomeço.
Eu acreditei nele. Mas meus pais… não.
beijamin
— Eu consegui, Isabel. — Ele murmura, apertando mais minha mão. — Consegui tudo. Tudo para provar que seus pais nunca deveriam ter te tirado de mim… nunca deveriam ter me arrancado o direito de ser pai.
Minha garganta fecha. Eu quero afastá-lo, quero dizer a ele que vá embora, que desapareça novamente da minha vida… mas antes que eu reaja, Benjamin me puxa para um abraço apertado.
Tento resistir. Tento. Mas meus braços agem antes que minha mente processe, e, de repente, estou agarrada a ele, minhas mãos entrelaçadas em suas costas, segurando-o como se o tempo pudesse parar ali.
Ele me aperta forte, a respiração quente contra meu pescoço.
Por um instante, apenas um instante, deixo minhas lágrimas caírem.
Mas então, a porta do banheiro se escancara. O som da madeira batendo contra a parede faz meu corpo estremecer, e aquele momento frágil e proibido se desfaz no ar como fumaça.
Filipe como uma fera entra.
Ele nos encara, os olhos arregalados, a respiração pesada. Por um segundo, tudo fica em silêncio. Mas apenas por um segundo
Num rompante de fúria, Filipe avança e agarra Benjamin pelo colarinho do terno, puxando-o com violência para longe de mim.
Filipe
— Seu desgraçado! — O rugido dele ecoa pelo banheiro.
Isabel
— Filipe, não! — Grito, mas minha voz não o alcança.
O primeiro soco atinge Benjamin com força, jogando sua cabeça para trás. Ele cambaleia, mas não revida. Apenas mantém os punhos cerrados ao lado do corpo, como se estivesse se contendo.
Filipe
— Seu filho da puta! — Filipe vocifera, avançando novamente. — O que acha que tá fazendo, hein? Tentando seduzir uma mulher casada?
Outro golpe. O estalo seco do punho contra a pele faz meu coração saltar. Levo as mãos à boca, horrorizada.
Isabel
— Pelo amor de Deus, Filipe, para!
Os Jeffersons aparecem na porta, assustados. O senhor Jefferson e seus empregados correm para segurar Filipe, afastando-o de Benjamin antes que ele o espanque ainda mais.
Meu corpo se move sozinho. Caio de joelhos ao lado de Benjamin, segurando seu rosto com as mãos trêmulas. Seu lábio está cortado, um filete de sangue escorre pelo queixo, e uma marca arroxeada já começa a se formar em sua bochecha.
Isabel
— Meu Deus… — Murmuro, os olhos marejados.
Levanto o olhar e encontro seus olhos faiscando de ódio. Seu rosto está vermelho, a mandíbula travada. Ele se solta dos homens que o seguram e avança até mim, agarrando meu braço com brutalidade.
Filipe
— Isabel! — O grito de Filipe me atinge como um chicote.
Filipe
— Você tá se abaixando pra esse canalha?!
Isabel
— Me solta, Filipe! — Tento me soltar, mas seu aperto se intensifica.
Filipe
— Você tá se jogando aos pés desse vagabundo? Na frente de todo mundo? — Sua voz sai ríspida, carregada de fúria e humilhação.
Meus olhos se movem rapidamente pela sala, vendo os olhares chocados das pessoas ao redor. Murmúrios se espalham. O escândalo já começou.
Então, um pequeno soluço chama minha atenção.
Meu filho está encolhido perto da porta, os olhinhos arregalados e assustados. O garotinho mal respira, apertando as mãozinhas contra o peito, como se quisesse desaparecer.
Ao me ver sendo puxada por Filipe, Wendy se mexe de súbito, correndo atrás de nós.
A dor que me atravessa nesse momento não vem de Filipe, nem de Benjamin.
Vem dos olhinhos tristes do meu filho.
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