Meu passado em minha porta — 04
A noite havia caído, trazendo consigo o brilho suave da lua que entrava pelas janelas do casarão. No quarto de Wendy, o menino balançava os pequenos pés no ar enquanto sua babá penteava seus cabelos com um gel espesso e brilhante, alisando os fios teimosos. Ele fazia caretas a cada toque do pente e, vez ou outra, passava o dedinho na cabeça, curioso com a textura pegajosa
Isabel
— Ele já está pronto? — A voz de Isabel soou do outro lado do quarto.
Ela entrou e, ao ver o pequeno homenzinho vestido em um smoking branco, com uma gravatinha borboleta perfeitamente ajustada, abriu um sorriso caloroso.
Isabel vestia um deslumbrante vestido verde-esmeralda, justo ao corpo, coberto de pedrarias que reluziam sob a luz do abajur. As mangas longas davam-lhe um ar elegante, e suas costas eram cobertas até a metade, deixando uma pequena fenda que revelava um toque de pele. Seus cabelos estavam presos em um coque alto, com alguns fios soltos, conferindo-lhe um ar de sofisticação natural.
Isabel
— Você está lindo, meu pequeno. — Ela disse, aproximando-se do filho, que imediatamente abriu os braços, ansioso por um abraço.
Wendy enlaçou o pescoço da mãe e aspirou fundo, inalando o perfume doce e familiar dela.
Wendy
— Você está muito bela e cheirosa, mamãe. — O menino murmurou, satisfeito, antes de pular da cama e segurar a mão dela, pronto para sair do quarto. Mas antes, virou-se e acenou para a babá. — Obrigado, senhorita.
A mulher sorriu e ajeitou um fio solto do cabelo dele antes de vê-los partir.
Ao descerem as escadas, encontraram Filipe parado no salão, de frente para a porta. Ele vestia um terno impecável, o olhar sério de sempre. No entanto, quando seus olhos pousaram sobre a esposa e o filho, algo nele mudou. Um sorriso discreto surgiu em seus lábios, e Isabel sentiu um leve estranhamento, mas aceitou aquele gesto sem questionar.
Filipe aproximou-se do filho e, para a surpresa de todos, pegou-o no colo, fitando-o com admiração.
Filipe
— Você está lindo, meu filho. — Ele disse, com uma suavidade rara.
Wendy piscou, surpreso. “Meu filho.” Aquilo aqueceu seu coração, mas também plantou um medo sutil. Seria passageiro? Amanhã ele voltaria a ser apenas "o moleque"? Seu pequeno sorriso vacilou, e, antes que pudesse se apegar àquele momento, estendeu as mãozinhas para a mãe. Isabel o pegou no colo sem hesitar.
Filipe não reagiu, apenas ajeitou a lapela do terno e seguiu para a porta. Logo depois, Isabel e Wendy o acompanharam até o carro.
A casa dos Jeffersons estava animada, com taças de vinho sendo erguidas em brindes e risadas ecoando pelos salões bem iluminados. Filipe conversava animadamente com o anfitrião, enquanto Isabel havia se retirado para o banheiro.
Wendy, por sua vez, estava encolhido no sofá, espremido entre as gêmeas Jefferson, que insistiam em cutucá-lo e cochichar coisas que ele não queria ouvir.
A campainha soou, e a senhorita Colen Jefferson foi atender. Assim que abriu a porta, um sorriso alargou-se em seu rosto.
Srt Jefferson.
— Ora, ora, Fico feliz que veio! — Exclamou, dando passagem para um homem alto e elegante, que entrou ajeitando o terno com um movimento refinado.
Ela o conduziu até o centro da sala, onde todos se reuniam. Seu marido sorriu ao vê-lo, mas Filipe franziu ligeiramente a testa, confuso.
Srt Jefferson.
— Meu caro Filipe, mil perdões por não ter avisado sobre mais um convidado. Nosso querido amigo estava de passagem na cidade, então decidimos chamá-lo para nos acompanhar esta noite. — Explicou, satisfeita.
O recém-chegado estendeu a mão para Filipe, seu sorriso educado e gentil.
beijamin
— Prazer, Benjamin, senhor.
Antes que Filipe pudesse responder, um estrondo cortou a conversa. Todos se viraram assustados para a origem do barulho.
Isabel havia deixado cair sua taça.
O vinho tingia o tapete branco como uma mancha de escândalo, mas ninguém parecia notar isso. Todos os olhares estavam fixos nela, que permanecia imóvel, pálida, olhos arregalados, fixos em Benjamin.
O homem a olhou de volta, e seu peito inflou como se o ar tivesse lhe faltado de repente. Sua respiração tornou-se irregular, os olhos carregados de algo intenso, algo inconfessável.
Filipe correu para Isabel, assim como os Jeffersons.
Filipe
— Você está bem, meu amor? — Filipe segurou-a pelos ombros, a preocupação evidente em sua expressão.
Ela apenas assentiu, engolindo em seco, incapaz de encontrar palavras.
Benjamin deu um passo à frente, como se instintivamente quisesse se aproximar, mas, no mesmo instante, Isabel recuou, juntando as mãos e forçando um sorriso tenso.
Isabel
— Eu… só preciso ir ao banheiro.
E saiu rapidamente, deixando Filipe ainda mais confuso.
Do outro lado da sala, Wendy apareceu correndo e puxou o terno do pai.
Wendy
— Papai, onde está a mamãe?
Filipe, sem tirar os olhos do corredor por onde Isabel havia sumido, respondeu distraído.
Filipe
— Ela está no banheiro, filho. Volte a brincar.
O menino baixou os olhinhos e virou-se, caminhando devagar
Benjamin, no entanto, não conseguiu tirar os olhos da criança.
beijamin
— Se me dão licença, vou ao banheiro. — Murmurou, antes de desaparecer pelo mesmo corredor que Isabel.
Filipe observou sua saída, um desconforto crescente dentro de si. Tomou um longo gole de vinho antes de voltar a atenção aos Jeffersons, tentando dissipar a sensação de que algo estava terrivelmente fora do lugar.
Isabel jogava água no rosto, tentando afastar o peso que a esmagava. As gotas escorreram pela pele, mas não apagaram o frio que subia por sua espinha.
Ela se virou bruscamente, vendo Benjamin entrar e fechá-la atrás de si, certificando-se de que ninguém estava por perto.
beijamin
— Isabel… — Sua voz saiu suave, mas carregada de emoção.
Ela ficou imóvel, os olhos ainda arregalados.
beijamin
— Você.. — Ele deu um passo à frente. — Como eu te procurei… por todo lugar…
A dor e a saudade transbordavam em suas palavras, mas antes que pudesse se aproximar mais, Isabel deu um passo para trás.
O passado que ela tanto temia havia acabado de bater à sua porta.
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