Nomes Esquecidos
O céu de Korr Enai se movia como se estivesse vivo.
Não girava como os ponteiros de um relógio. Não dançava como nuvens ao vento. Ele pulsava, como um olho tentando lembrar o que viu no dia anterior.
As pedras do chão rangiam como dentes. O ar cheirava a metal e orvalho seco. Cada ruela da cidade parecia sussurrar um nome diferente — mas nenhum era o dele. E, mesmo assim, as portas se entreabriam quando ele passava. Como se soubessem.
A pena era leve, mas viva. Tão viva que às vezes parecia tremer na sua mão, como se quisesse escapar.
Seu coração batia forte. O silêncio da ausência de Eri fazia o mundo parecer mais... nítido. Mais cru.
Uma multidão cruzava a avenida central, com rostos cobertos por véus de seda preta. Carregavam livros abertos nas mãos. Choravam em silêncio.
Um velho gritava de uma varanda
O Esquecido retorna em círculos. Guardem seus nomes! Guardem seus nomes!"
Elías desviou. Não queria atrair olhares. Mas era tarde demais.
Do alto de uma torre dourada, um som metálico cortou o céu — como uma lâmina arranhando um espelho.
Então, silêncio.
E então... um rugido.
O chão tremeu.
Uma rachadura se abriu na rua à sua frente. Lenta, como uma ferida velha reabrindo.
Uma criatura emergiu — feita de cinzas compactas, com olhos brancos demais.
Era alta, magra, mas os braços se arrastavam como se carregassem peso demais.
Todos correram.
Mas Elías... congelou.
???
Você escreveu um nome novo... mas o seu eco ainda grita o antigo.
Elías recuou. A pena em sua mão ficou quente. Quase queimando.
Elías
O que você quer de mim?!
Elías
Eu nem sei por que eu tô aqui! Eu só... eu só acordei!
A criatura avançou.
Mas antes que pudesse tocá-lo, uma corrente de fogo cortou o ar — se contorcendo como um chicote em brasa entre os dois.
A criatura rugiu e recuou.
No alto de uma escadaria, um rapaz de roupas negras e capa vermelha olhava fixamente para Elías. Cabelo curto, olhos acesos, expressão tensa. Em sua mão, um grimório aberto. As páginas queimavam, mas não se consumiam.
Arthur
Você só podia ser o novo. Claro. Só os tolos andam por aqui sem selo de proteção.
Elías
Eu não sei quem você é, mas obrigado, eu acho...
Arthur
Cala a boca e corre.
O estranho desceu a escadaria em dois pulos, girando a mão para lançar outra chama que explodiu contra o monstro. Mas aquilo... regenerava. As cinzas se recompunham.
Arthur
Merda — murmurou Arthur, ofegante. — Eu... eu não vou conseguir vencer.
Eles correram juntos, atravessando ruelas estreitas, cruzando becos com gatos de olhos vítreos e portas que cantavam quando se fechavam, como se a cidade os observasse, viva, sussurrante.
Só pararam quando chegaram a um pátio afundado, cercado por colunas partidas e estátuas sem rosto.
Elías ofegante perguntou
Arthur
Uma lembrança rebelada.
Arthur
Algumas se recusam a morrer. Ficam presas nas cinzas da cidade.
Elías se encostou em uma parede, com medo nos olhos perguntou
Elías
Isso vai continuar acontecendo?
Elías
Essas coisas vão me seguir?
Arthur
E se continuar andando por aí feito um idiota, vai morrer antes de entender o que tá acontecendo.
Silêncio.
Algo dentro de Elías estalou, como um fio de vidro trincando por dentro.
Elías falou baixo, com a voz falhando entre raiva e mágoa
Elías
Eu não pedi pra estar aqui.
Ele cerrou os punhos, os olhos marejando
Elías
Eu só... morri, droga. Não era pra continuar depois disso. Não era pra... isso.
Arthur o olhou com atenção agora. Pela primeira vez, a raiva saiu dos olhos dele. Havia... reconhecimento?
O estranho se virou, os passos já se apagando na penumbra.
Elías
Como você sabe meu nome?
Arthur
Porque o meu... desapareceu quando você chegou.
E então, o estranho desapareceu pelas sombras.
Elías ficou sozinho no pátio. De novo.
Mas o medo... era outro agora. Não era mais o pânico bruto de antes — era um medo pesado, denso, cheio de consequência.
Ele se deixou cair no chão, ofegante, ainda com a pena apertada entre os dedos. O solo sob ele vibrava, como o batimento lento de um coração antigo. E, ao longe, a torre — aquela maldita torre — continuava ali. Silenciosa. Vigilante.
Elías
Eu não sei quem e você
Elías
Mas eu não vou fugir.
A pena brilhou. Discreta, mas viva.
E então, como se traçada a fogo, uma palavra surgiu riscada na palma da mão de Elías — ardendo, dizendo mais do que qualquer voz.
Mas vigiar o quê?
O monstro? A cidade? A si mesmo?
Ele esfregou a mão, tentando apagar o traço incandescente, mas a marca parecia parte da pele agora. Como um selo. Ou uma sentença.
O pátio estava silencioso demais.
As estátuas sem rosto pareciam observá-lo, mesmo sem olhos. As colunas partidas projetavam sombras tortas, como dedos apontando. E no ar… um cheiro de ferro velho e papel úmido.
Eri
O garoto que brinca com fogo?
Elías
Ele me salvou e depois me chamou de idiota.
Eri
Porque você é a peça nova no tabuleiro velho.
Eri
Isso sempre dói nos que estavam antes.
Elías fechou os olhos.
O corpo ainda tremia. O peso das coisas — nomes, cinzas, memórias que não eram suas — esmagava os ombros. Ele pensava no rosto do estranho. Rígido, tenso… mas não vazio. Havia algo ali. Algo quebrado. Igual a ele.
Eri
Era uma lembrança que doeu demais.
Eri
Alguém esqueceu ela. ou tentou esquecer.
Eri
E a cidade... transformou essa dor em forma.
Eri
Pra lembrar o que não devia ser esquecido.
Elías
Então... aquilo era uma dor?
Eri
De alguém que foi rasgado da história.
Eri
E quando você escreveu...
Eri
Você puxou esse grito de volta.
Elías
Porque escrevi o nome?
Eri
Toda vez que alguém escreve aqui, toca nas costuras do mundo.
Eri
Essas costuras guardam memórias.
Eri
E memórias... às vezes se recusam a dormir.
Elías permaneceu em silêncio.
Tudo ao redor parecia frágil agora — como se um nome dito da forma errada pudesse despedaçar a cidade inteira.
E o rosto da criatura... ainda ardia na memória. Doía lembrar.
Havia algo de inquietante ali — uma familiaridade distorcida, como um eco torto de humanidade, arrancado e mal refeito.
Comments
✿MISS SHY✿
a cada capítulo eu fico mais ansiosa pra saber o desfecho de onde tudo isso vai dar...
2025-04-23
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Stéfanie Santos
a final Elías vai se encontrar de novo com Arthur
2025-04-21
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