A Chegada dos Detetives

Capítulo 5

A Chegada dos Detetives

(Presente)

O sol mal rompia as nuvens carregadas quando Júlia acordou, a cabeça pesada e os olhos ardendo de preocupação. A noite havia sido povoada por sonhos inquietos: flashes do rosto de Bianca, o som abafado de risadas infantis, o cheiro de queimado que parecia impregnar até mesmo a realidade. Sentia-se exausta, mas determinada. O medo que se instalara com o bilhete anônimo não se transformara em paralisia, e sim em urgência.

Ainda de pijama, ela se sentou diante do computador e fez uma lista de perguntas para levar à delegacia. Precisava, de alguma forma, participar da investigação oficial. Não era só uma questão de justiça para Fátima, mas também uma última chance de fechar a ferida aberta desde o sumiço de Bianca.

Pouco depois das nove, Carolina ligou.

— Júlia, o delegado Rogério quer te ouvir. Você pode ir agora?

— Já estou indo. — respondeu, calçando os tênis e pegando o diário de Bianca.

O prédio da delegacia era discreto, mas o burburinho em torno da morte da psicóloga havia atraído jornalistas e curiosos. Júlia reconheceu alguns rostos conhecidos e evitou cumprimentá-los, querendo evitar perguntas para as quais ainda não tinha resposta.

Foi recebida por um agente, que a levou até uma sala de paredes bege e móveis antigos. O delegado Rogério estava lá, acompanhado da inspetora Helena Vargas, uma mulher de olhar atento e semblante fechado. Rogério cumprimentou Júlia com um aceno.

— Agradeço por ter vindo tão rápido, Júlia. Sente-se, por favor.

Ela obedeceu, sentindo o coração martelar contra o peito.

A inspetora iniciou o interrogatório de forma formal, mas sem hostilidade.

— Você tinha alguma relação pessoal com a doutora Fátima?

— Não exatamente. Eu sabia que ela atendia casos difíceis, inclusive de pessoas que podiam estar relacionadas ao desaparecimento da minha irmã, Bianca. Ontem, vi meu nome e o dela em anotações na casa da doutora. Acho que ela estava investigando algo importante.

O delegado Rogério inclinou-se para frente, cruzando as mãos.

— O que exatamente viu nas anotações?

— Uma referência a um paciente chamado Daniel, e um recado sobre investigar o vínculo dele com o caso da minha irmã. Também havia outros nomes, mas não consegui memorizar todos.

Helena anotava tudo, o olhar fixo em Júlia.

— Você já ouviu falar de alguém ameaçando a doutora Fátima?

Júlia hesitou, pensando no bilhete da noite anterior.

— Recebi um aviso anônimo para parar de investigar. Isso chegou ontem à noite, depois que voltei da casa dela.

Ela colocou o bilhete sobre a mesa. Os investigadores leram em silêncio.

— Isso é grave, Júlia. — disse Rogério. — Alguém está tentando intimidar você. E, possivelmente, tentou calar Fátima antes.

— Vocês já têm algum suspeito?

O delegado suspirou.

— Ainda estamos coletando depoimentos dos pacientes e familiares. A doutora Fátima era reservada, mas mantinha registros detalhados de cada caso. Por enquanto, todos são suspeitos, inclusive pessoas próximas a ela.

Júlia sentiu o peso daquelas palavras.

— Eu preciso ver esses registros. Talvez consiga identificar conexões que passem despercebidas à polícia.

Helena franziu a testa.

— Isso é responsabilidade da polícia. Mas, considerando seu envolvimento pessoal e a ameaça que recebeu, talvez possamos colaborar. Você conhece melhor do que ninguém o caso da sua irmã.

Ela deslizou uma pasta na direção de Júlia.

— Estes são os nomes dos últimos pacientes de Fátima. Alguns já foram ouvidos, outros não. Veja se algo te chama atenção.

Júlia folheou a lista rapidamente. Daniel, Clara, Samuel, Helena, Ana… Um frio percorreu sua espinha ao ver o nome Clara, que também estava no diário de Bianca, mencionado como uma amiga da escola.

— Clara estudou com Bianca — murmurou, mais para si do que para os policiais.

— O que você disse? — perguntou Rogério.

— Clara, da lista. Ela era colega da Bianca. E Daniel… Ele também aparece em anotações do diário da minha irmã.

Os investigadores trocaram olhares.

— Vamos ouvir Daniel novamente esta tarde. E Clara está marcada para amanhã. Se lembrar de qualquer outra ligação, nos avise.

Júlia agradeceu, mas antes de sair, Helena a deteve:

— Tome cuidado. Não ande sozinha à noite, e qualquer coisa estranha, nos avise imediatamente.

Na saída, Júlia cruzou com Samuel, um homem de trinta e poucos anos, cabelo ralo e olhar inquieto. Ele parecia nervoso, evitando contato visual. Júlia registrou mentalmente o rosto dele, mas seguiu seu caminho.

Ao chegar em casa, ligou para Carolina e compartilhou as novidades.

— Preciso encontrar a Clara. — disse. — Ela pode saber mais do que imagina.

— Eu ajudo. Vou ver se descubro o endereço dela.

Enquanto aguardava a resposta da amiga, Júlia analisou novamente o diário de Bianca. Uma frase lhe chamou atenção:

“Clara me disse que o Daniel esconde coisas no porão da escola. Ela tem medo dele.”

O quebra-cabeça começava a tomar forma, ainda que cada peça encaixada trouxesse consigo novas dúvidas e perigos. Júlia sentiu-se próxima de algo grande demais para ser enfrentado sozinha. Mas não recuaria. Pela primeira vez em anos, sentia esperança — e também a responsabilidade de dar voz não apenas à sua dor, mas à de todos que, como Bianca, haviam sido silenciados.

Naquela noite, antes de dormir, Júlia olhou o celular e encontrou uma mensagem desconhecida:

“Você está mais perto do que pensa. Cuidado com quem confia.”

O medo voltou, mas havia também uma estranha sensação de propósito. Júlia sabia: só existia um caminho, e era para frente. A investigação estava apenas começando, e o passado, finalmente, começava a responder.

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