Capítulo 4 – O Show Business...

Os arranha-céus de Nova York brilhavam sob o pôr do sol, tingindo os vidros espelhados com tons dourados e rosados. Eu estava no alto do meu prédio em Manhattan, observando a cidade pela janela panorâmica. Era uma daquelas visões que faziam qualquer um se sentir no topo do mundo. Mas, naquela hora, o que realmente me fazia sentir vivo era a imagem de Anne no meu celular — uma selfie tímida, com aquele sorriso que desmontava todas as minhas defesas.

Segurei o aparelho com firmeza, como se aquilo pudesse me aproximar dela. Meu coração acelerava de um jeito estranho. Não era como na noite de uma estreia, nem como ao assinar um contrato milionário. Era algo mais puro. Mais verdadeiro.

— Você está mesmo apaixonado por essa brasileira? — a voz de Mike soou atrás de mim. Ele estava largado na poltrona de couro, girando o gelo no copo de whisky como se isso fosse lhe trazer alguma resposta.

Me virei devagar, um meio sorriso escapando dos meus lábios.

— Não é só paixão, Mike. É diferente. A Anne… ela é real. Não vive em função de likes ou fama. Ela me vê além dos tapetes vermelhos.

Ele riu, meio cínico, e tomou um gole.

— Você sempre teve esse gosto peculiar. Um galã em ascensão, CEO de uma das maiores produtoras de conteúdo do país, futuro protagonista da série mais aguardada do ano… e quer se envolver com uma moça do interior do Brasil?

— Quero conhecê-la — respondi. — De verdade.

Mike me olhou daquele jeito cético dele, o mesmo olhar que usava quando achava que eu estava prestes a jogar tudo fora.

— Você tem ideia de quantas mulheres vão se jogar aos seus pés quando essa série estrear? O mundo inteiro vai querer um pedaço de você, Linn. Está mesmo pronto pra abrir mão disso por alguém que nem faz parte desse universo?

Voltei meu olhar para a cidade. As luzes começavam a se acender. Mas tudo me parecia pequeno.

— Eu não quero alguém desse universo. Quero alguém que me lembre de quem eu sou de verdade.

Silêncio. Achei que ele ia rir de novo. Mas o que veio foi bem pior.

— E ela sabe de Greta?

Aquele nome caiu como uma pedra no meio do meu peito. A mandíbula travou. Apertei o celular com mais força do que precisava.

— Greta ficou no passado — murmurei, tentando soar firme. Mas até eu percebi que minha voz fraquejou.

Mike se levantou e deixou o copo vazio na mesa de centro. Antes de sair, me lançou um olhar que misturava aviso e preocupação.

— O passado, Linn... sempre dá um jeito de bater à porta. E quando ele entra, nunca vem sozinho.

Assim que ele saiu, o silêncio da cobertura se tornou ensurdecedor. Sentei no sofá, encostei a cabeça nas costas do estofado e encarei o teto por alguns segundos. Depois desbloqueei o celular. A imagem de Anne ainda estava lá. Aqueles olhos doces, aquele sorriso que parecia dizer mais que mil palavras.

— Me espera... — sussurrei.

Passei a mão pelos cabelos, cansado. Não era o cansaço de quem trabalhou demais, mas o de quem carrega um peso invisível. Eu me sentia dois homens ao mesmo tempo: o que o mundo via e o que só ela conseguia enxergar. E, pela primeira vez, eu queria ser só esse último.

Deslizei o dedo pela tela e abri o chat com ela. As mensagens eram simples — falas do dia a dia, emojis, bobagens. Mas pra mim, cada palavra dela era uma âncora.

Anne não me tratava como uma estrela. Me tratava como alguém real. Como... Linn. Só Linn.

Mas Greta... o fantasma dela ainda rondava. Não por sentimento, não por saudade, mas pelo estrago que tudo poderia causar. E se vazasse? E se Anne descobrisse da pior forma?

Fui até a cozinha, servi um copo de água, mas nem estava com sede. Era só uma tentativa de organizar os pensamentos. Eu queria contar tudo a ela. Queria ser honesto. Mas tinha medo. Medo de perdê-la.

O celular vibrou. Uma mensagem dela. “Boa noite, Linn. Estou ouvindo uma música que me lembra você.”

Sorri. Um sorriso bobo, automático, que escapou antes que eu percebesse. Respondi com um coração — algo que raramente fazia — e perguntei: “Qual música?” Ela mandou o link. Uma canção suave, com violão e uma voz feminina cantando sobre amor à distância. Dei play. E deixei que a música tomasse o apartamento.

Fechei os olhos. E, por um momento, imaginei como seria tê-la aqui. De verdade. Não numa tela, não num sonho distante. Mas aqui. Comigo.

Voltei ao sofá, joguei o corpo com peso e encarei o teto mais uma vez. Os compromissos do dia seguinte passaram pela minha mente como um borrão. Gravações. Reuniões. Entrevistas. Tudo aquilo parecia sem sentido.

Peguei o celular. Escrevi uma mensagem para o Mike:

“Quero um voo reservado para o Brasil no próximo sábado. Nada público. Só eu e o piloto. Resolve isso pra mim.”

Sabia que ia contra tudo. Contra os contratos, os cronogramas, os compromissos. Mas não me importava. Esperar mais podia significar perdê-la. E eu... eu não estava disposto a correr esse risco.

Deixei o celular sobre a mesa e cobri o rosto com as mãos. Meu peito apertava, como se estivesse prestes a transbordar. Eu nunca havia me sentido tão vulnerável. Mas também nunca havia sentido algo tão real.

Me levantei devagar e fui até o piano. Passei os dedos pelas teclas, sem tocar. A melodia estava dentro de mim, mas ainda presa. E quando finalmente pressionei algumas notas, uma música suave e sem nome começou a preencher o espaço. Cada acorde era uma tentativa de dizer o que as palavras não conseguiam.

“Me espera, eu estou tentando...” era o que cada nota queria gritar.

Os olhos marejaram, mas pisquei forte. Não podia chorar. Não agora.

Anne era a única mulher que eu não queria impressionar. Eu queria... pertencer. Queria que ela visse quem eu era no escuro, longe das câmeras, sem maquiagem emocional. Só eu.

Uma lembrança veio como um raio: Greta, gritando, magoada. “Você sempre escolhe o que brilha mais!” Ela tinha razão, naquela época. Mas Anne... Anne não brilhava como ouro. Ela brilhava como o luar. Serena. Constante. Real.

Abri o e-mail da minha assessoria de imprensa e ignorei tudo. Datas, compromissos, exigências. Não adiantava nada ter tudo, se por dentro eu estivesse vazio.

A campainha tocou. Me assustei. Por um segundo, quase esperei que fosse Anne. Que loucura. Era só mais um entregador com algo que eu provavelmente nem lembrava de ter comprado.

Deixei a caixa sobre a mesa e voltei à foto dela. Pijama, cabelo preso de qualquer jeito, sem maquiagem. E aquele sorriso... o sorriso que me dava vontade de lutar. De mudar. De ser melhor.

Passei a mão pelo peito. E sussurrei, quase como uma oração:

— Se for preciso contar tudo... eu conto. Mas vou até o fim com você, Anne. Mesmo que o mundo inteiro vire contra mim.

Respirei fundo. Uma, duas, três vezes. De olhos fechados, tentei acalmar a correnteza dentro de mim. O peito apertado pedia urgência, mas minha mente exigia estratégia. Eu não podia me mover por impulso. Havia contratos a cumprir, reuniões importantes, a estreia da série... O mundo lá fora me esperava com garras afiadas. Eu era Linn Hawthorne — o nome em alta, a aposta da temporada, o CEO que não podia vacilar.

Peguei o celular mais uma vez. Meus dedos pairaram sobre a mensagem que eu tinha quase enviado a Mike. “Quero um voo reservado para o Brasil…” Apaguei palavra por palavra. Uma pontada atravessou meu peito, como se cada letra deletada me afastasse mais dela. Mas era preciso. Não agora.

Em vez disso, digitei outra mensagem, mais curta, mais fria:

“Cancela a passagem. Vou cumprir tudo aqui primeiro. Depois resolvemos o resto.”

O “resto” era ela. Era tudo. Mas eu sabia que, por mais que doesse, ainda não era a hora. Não com as verdades que escondo debaixo da pele. Não enquanto Greta for um fantasma que ainda ronda minha porta.

Anne era luz demais pra isso. Ela não merecia ser colocada sob os holofotes do meu passado quebrado. Ainda não.

Suspirei, deixando o corpo cair no sofá mais uma vez. Meus olhos fixos no teto como se ele tivesse respostas. Como se algum canto daquele apartamento pudesse me dizer se estou certo ou apenas sendo covarde.

Vou cumprir a agenda, sorrir para as câmeras, dar entrevistas ensaiadas, assinar contratos com a firmeza de quem sabe o que quer. Vou estrear essa série e fazer o mundo inteiro se curvar — porque é isso que esperam de mim. Porque é isso que sempre fiz bem.

Mas depois... depois eu vou atrás dela. Depois, quando a poeira baixar, quando tudo estiver no lugar, eu vou encontrar Anne. E vou sentir com ela. Sentir tudo que venho tentando adiar.

Porque sei que nenhum prêmio, nenhuma manchete, nenhum tapete vermelho vale o calor de sua mão na minha. Nenhuma glória faz sentido se, no fim, eu voltar para uma casa silenciosa, com saudade dela vibrando no ar.

Mas até lá…

Vou esconder Greta.

Vou esconder o que me quebrou.

E torcer pra que, quando o momento certo chegar, Anne ainda esteja lá.

Me esperando.

No dias que se seguiram, em uma manhã de gravações, eu respirei fundo antes de digitar. Estava no camarim, sozinho. Lá fora, o burburinho da equipe ajustando as luzes, checando câmeras, ensaiando falas. Mas aqui dentro... só silêncio. E ela, na minha mente.

— A série estreia semana que vem. Queria que você visse aí do Brasil. Significaria muito pra mim — escrevi, hesitando antes de enviar.

O coração deu uma leve acelerada assim que vi a mensagem sendo visualizada. E então, o áudio dela chegou. A voz doce da Anne atravessou meus fones como um abraço.

— Claro que eu vou ver! — disse ela, cheia de entusiasmo. — Tô ansiosa pra te assistir. Já avisei até a Mia que vamos fazer uma sessão especial aqui em casa só pra isso. Vai ser lindo te ver fazendo o que ama.

Sorri sem nem perceber. Ela sempre tinha esse efeito em mim. Me fazia sentir mais leve, mais inteiro.

— É uma história especial... — digitei, os dedos deslizando com mais naturalidade. — Fala sobre um homem indígena que volta às suas origens, tentando entender o passado da própria família. No meio disso, ele conhece uma turista que tá pesquisando sobre as lendas das montanhas Apalaches. Ela vê nele mais do que ele mesmo enxerga.

Fiquei olhando para a tela, esperando. O tempo que ela demorou para responder foi o suficiente pra minha mente começar a criar mil cenários. Mas quando a mensagem chegou, respirei aliviado.

— Uau… parece intenso. Profundo — escreveu ela. — Acho bonito quando uma história toca as raízes de alguém. Essa mistura de culturas, de memórias… deve ter sido um trabalho bem pessoal pra você, né?

Meu peito apertou. Era como se ela soubesse.

— Foi, sim — respondi. — Tem muito de mim ali. Muito do que eu escondo. Muito do que tento entender.

Vi os três pontinhos surgirem e sumirem algumas vezes. Até que a mensagem veio, como um sussurro na alma:

— Você tem um passado bonito, mesmo com as sombras. E essa série parece ser um reflexo disso. Eu admiro sua coragem. E… espero que um dia você sinta que pode me mostrar tudo, até o que dói.

Fechei os olhos.

Ela não me cobrava nada. Não exigia explicações. Apenas se colocava ali, firme, serena. Como se dissesse: quando estiver pronto, eu vou estar aqui.

E naquele instante, tive certeza. Anne era a mulher certa pra mim. Não porque me idealizava, mas porque via até o que eu tentava esconder… e ainda assim, ficava.

Mesmo a milhares de quilômetros de distância, ela era o único lugar onde eu queria estar.

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