O Almoço com o Diabo

Eu passei a noite em claro.

Cada vez que fechava os olhos, via o rosto dele. Lorenzo Mancini. A forma como ele entrou naquela sala médica como se tivesse direito. Como ele olhou para mim. Como ele falava do bebê como meu filho, e não nosso filho.

Ele era um homem acostumado a mandar. A decidir. E, pior, a ser obedecido.

Mas eu não era do tipo que se dobrava. Mesmo tremendo por dentro, eu me recusava a recuar.

Só que havia algo nele que me fazia hesitar. Não era só medo... Era o fato de que ele acreditava. Acreditava mesmo que tinha o direito sobre mim. Que eu era dele. E isso era o mais assustador.

Quando o relógio bateu meio-dia em ponto, a campainha tocou.

Pulei no sofá, o coração disparado.

Eu sabia que ele viria. Ele disse que me buscaria para o almoço. Mas mesmo assim… meu corpo reagiu como se estivesse diante do próprio diabo.

Respirei fundo, andei até a porta e abri.

Lorenzo estava ali. Camisa escura, mangas dobradas nos antebraços, relógio de ouro. O cabelo penteado com precisão, e aquele olhar que parecia atravessar minha alma.

Atrás dele, um carro preto de vidro escuro. E um motorista esperando com a porta aberta.

— Você realmente veio — murmurei, surpresa com meu próprio tom.

— Eu disse que viria.

— Eu disse que não iria.

— E eu disse que você não tem escolha.

— Lorenzo...

— Giulia. — Ele me interrompeu, com aquela voz firme, baixa. — É só um almoço.

— Nada com você é só alguma coisa.

Ele deu um leve sorriso. Era quase... bonito. Se não fosse tão sombrio.

— Vem comigo. Você precisa comer. E precisamos conversar.

Olhei para ele. Depois para a rua. E por fim para dentro de casa, onde eu poderia continuar fingindo que aquilo tudo não estava acontecendo.

Mas não estava segura ali. Nem fora. Nem em lugar nenhum.

— Se eu for... vai ser num restaurante público. Com gente. Luz do dia.

— Eu não preciso te sequestrar. Se quisesse, já teria feito isso.

— Eu sei. É por isso que eu vou. Pra evitar que chegue nesse ponto.

Ele assentiu uma única vez. Depois se afastou para que eu passasse. Caminhei até o carro com as pernas bambas e entrei.

O motorista fechou a porta, e Lorenzo sentou ao meu lado logo em seguida. Ficamos em silêncio durante o trajeto. Ele não me tocava. Não me olhava diretamente. Mas sua presença enchia o carro, sufocava, queimava.

Chegamos a um restaurante discreto, de fachada de pedra. Nada de luxo escancarado. Mas havia sofisticação no ar. E discrição demais. Um lugar feito para quem não queria ser visto.

Assim que entramos, o maître nos reconheceu de imediato.

— Senhor Mancini. Mesa reservada. Por aqui.

Claro que ele tinha uma mesa. Claro que todos ali sabiam quem ele era.

Nos sentamos em uma área privada, cercada por cortinas de linho, longe dos olhares curiosos.

— Pedi que servissem frutos do mar — ele disse, abrindo o guardanapo com naturalidade. — Você pode comer?

— Eu não tenho apetite — murmurei, tensa. — Não sei como você consegue comer no meio disso tudo.

— Porque eu aprendi que, quando o mundo está desabando, você precisa estar mais firme do que nunca.

— Eu não sou parte do seu mundo.

— Mas o que você carrega é.

— De novo isso — retruquei, cruzando os braços. — Você quer o bebê. Eu entendi. Mas me obrigar a casar com você?! Isso é medieval!

— Eu sou um homem da velha guarda.

— Você é um tirano.

— E você é teimosa.

— Você esperava o quê? Que eu aceitasse esse absurdo de braços abertos?

Ele ficou em silêncio por alguns segundos. Depois se inclinou sobre a mesa.

— Giulia, você quer proteger esse bebê tanto quanto eu. Mas ao contrário de você, eu tenho inimigos. Gente que me odeia. Gente que faria qualquer coisa pra me atingir.

— E o que isso tem a ver comigo?

— Que se você continuar sozinha, eles vão usar você pra me atingir. Você é o elo fraco. O alvo mais fácil. E se algo acontecer com esse bebê, Giulia... eu destruo o mundo.

Arrepios percorreram meu corpo inteiro.

Ele não estava blefando.

— Eu sei me proteger — sussurrei.

— Não. Você sabe sobreviver. É diferente. Eu quero garantir que você viva. Com meu sobrenome, minha casa, minha segurança. E se isso significa te forçar a usar um anel... que assim seja.

— Você acha que casamento é isso? Uma sentença?

— Não. É proteção com vantagens.

— Que tipo de vantagens?

— Eu durmo sabendo que ninguém vai te tocar. E você dorme... sabendo que está viva.

As entradas chegaram. Ostras frescas, salada caprese, suco de laranja natural.

Tudo delicado. Tudo bonito. Tão irônico, considerando a guerra silenciosa naquela mesa.

— Você tem uma forma peculiar de proteger alguém, Lorenzo.

— Eu sou um homem peculiar.

Peguei um garfo, mexi na salada. Não comi.

— E se eu disser não no altar? — perguntei, encarando-o.

Ele sorriu. Devagar.

— Então eu digo sim por você. E depois te levo pra casa de qualquer forma.

— Isso é sequestro.

— Não. Isso é casamento.

Soltei uma risada amarga.

— Você é um lunático.

— Talvez. Mas um lunático com poder.

Terminei meu suco em silêncio. Ele comeu sem pressa, com a elegância de quem está acostumado a almoçar enquanto resolve negócios sujos.

Quando a conta foi paga — com um simples aceno de cabeça para o gerente — ele se levantou e estendeu a mão.

— Vamos.

— Pra onde?

— Te deixo em casa. Mais tarde vão entregar seu vestido.

— Meu quê?

— Vestido de noiva.

Engoli em seco.

— Você acha que isso é real?

— É real. Amanhã, Giulia, você será minha esposa. E ninguém vai impedir.

Fui até o carro em silêncio. Ele abriu a porta. Entrei. E encarei o vidro escuro, vendo meu próprio reflexo.

Eu parecia calma.

Mas por dentro, eu estava em colapso.

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Comments

Claudia

Claudia

se ela apenas fosse realista veria o quanto de verdade tem nem tudo que ele falou, ela sabe se defender do que se ela nem tem noção dos perigos que corre!?!?!? ele pode assegurar a vida dela e do bebê. ela tá sendo uma teimosa burra!! poderia ser uma mulher/mãe inteligente.

2025-05-09

1

Marina lopes

Marina lopes

ela não tem família ,não tem fotos

2025-04-27

1

Dulce Gama

Dulce Gama

meu Deus será que ele colocou segurança pra ela jesus cristinho tomara que esses demônios não peguem ela 🌹🌹🌹🌹🎁🎁🎁🎁👍👍👍👍👍❤️❤️❤️❤️❤️🌟🌟🌟🌟🌟

2025-04-21

0

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