Ele Voltou

Acordei me sentindo... diferente.

Não sei explicar. Era como se o mundo estivesse mais silencioso, mas ao mesmo tempo mais vivo. Meu corpo ainda parecia o mesmo, mas eu sabia que algo dentro de mim já havia mudado para sempre.

Grávida. Eu estava grávida. De um bebê que eu achava impossível.

Toquei a barriga ainda reta com carinho. Não era visível, mas era real. O teste, o exame de sangue, o sorriso da médica, tudo ainda estava fresco na minha memória.

Eu só não sabia lidar com o outro detalhe. Com ele.

O homem que apareceu na minha casa dizendo que era o pai da criança.

Tudo nele parecia saído de um pesadelo disfarçado de sonho: bonito demais, frio demais, ameaçador demais. Disse que era dono de máfia, que a criança era dele, que eu me casaria com ele.

Tudo em mim gritava que aquilo não era real. Que aquilo era coisa de maluco. Ele deve ter desaparecido. Deve ter sido só um surto de algum doador desequilibrado. Talvez a clínica tenha falado demais. Talvez...

— Senhorita Giulia? — a recepcionista chamou, interrompendo minha linha de pensamento.

Levantei, apertando a bolsa contra o corpo e tentando ignorar o frio na barriga que nada tinha a ver com a gravidez. Entrei na salinha branca, ainda nervosa, tentando me convencer de que aquele capítulo estava encerrado.

— Doutora Helena está te esperando na sala dois, pode entrar direto — a moça disse com um sorriso simpático.

Assenti e caminhei até a porta indicada, respirei fundo e entrei. A médica já estava ali, com a prancheta na mão e o jaleco impecável. Sorriu ao me ver.

— Giulia Ferrari, certo? Pronta para vermos esse bebezinho?

— Sim... — respondi com um sorriso nervoso. — Primeira consulta...

— Vai ser especial — ela disse, se aproximando da cadeira de exames. — Pode se sentar ali e depois vamos fazer uma ultrassonografia de rotina.

Antes que eu pudesse me mover, a porta se abriu atrás de mim.

Meu coração quase parou.

Era ele.

Lorenzo Mancini.

Vestido de preto, como da primeira vez. Tão impecável quanto assustador.

— O que você está fazendo aqui? — perguntei, me levantando de supetão.

Ele apenas me encarou com aquela calma irritante.

— Vim acompanhar o exame do meu filho.

A médica olhou de um para o outro, visivelmente surpresa, mas sem dizer nada. Apenas sorriu e sinalizou para a maca.

— Ah... então o pai veio junto. Que bom. Pode se sentar aqui do lado dela, senhor...

— Mancini — ele respondeu, olhando fixamente pra mim. — Lorenzo Mancini.

Sentei na maca com o coração na garganta. Aquilo não estava acontecendo. Ele não tinha desaparecido. Ele não era um maluco de passagem. Ele estava ali. E estava falando com a médica. Como se fosse... pai. Como se aquilo fosse normal.

— Você não pode entrar assim, sabia? — sussurrei entre os dentes.

— Posso sim. Meu nome está na ficha. Eu paguei essa consulta.

— O quê?!

A médica sorriu, tentando descontrair.

— Bom, é bom ver um pai presente. Hoje em dia isso é raro.

Eu queria gritar. Queria sair correndo daquela sala. Mas o olhar dele... havia algo que me mantinha no lugar. Medo? Talvez. Curiosidade? Um pouco. Mas havia mais. Um tipo de domínio silencioso que ele exalava com naturalidade. Como se o mundo girasse ao redor dele.

A médica preparou os aparelhos, colocou o gel no meu abdômen e encostou o transdutor na minha barriga. E então o som mais doce do universo preencheu a sala.

Tum-tum. Tum-tum. Tum-tum.

O coração do bebê.

Meus olhos se encheram de lágrimas. Olhei para a tela e vi aquele pequeno ponto piscando com vida.

— Aqui está ele — disse a médica com ternura. — Ou ela. Ainda é cedo pra saber o sexo. Mas temos aqui um bebê saudável. Dois meses de gestação. Tudo dentro do esperado.

— Dois meses... — murmurei.

Lorenzo olhava para a tela em silêncio. Sério. Intenso. Mas havia algo no fundo do olhar dele. Algo que eu não conseguia nomear.

— Você pode limpar o gel — disse a médica. — Vou imprimir as imagens e passar as orientações.

Ela saiu por um momento, nos deixando sozinhos. Eu peguei um lenço de papel e limpei a barriga, evitando olhar para ele.

— Você é louco — sussurrei. — Aparecer assim, sem avisar... invadir minha vida...

— Eu te avisei que voltaria — ele respondeu, como se fosse a coisa mais óbvia do mundo.

— Eu achei que você era só um psicopata surtado!

Ele se aproximou lentamente, me entregando um envelope.

— Aqui estão os papéis do cartório. A cerimônia civil será em dois dias. Você só precisa assinar.

— Você acha mesmo que eu vou me casar com você?!

— Não acho. Eu sei.

— Isso é maluquice!

Ele se inclinou, o rosto perto demais do meu.

— Pode chamar do que quiser. Mas você não tem escolha.

— Claro que eu tenho! — rebati, me levantando. — Eu sou livre! Você não manda em mim! Eu não sou uma propriedade sua!

Ele me olhou por um instante, depois deu de ombros.

— Mas o que você carrega é.

Fiquei sem ar por um segundo. Ele sabia como atingir com poucas palavras. Ele sabia como me fazer perder o chão.

A médica voltou com os papéis e o pendrive com as imagens do ultrassom. Me agradeceu, desejou felicidades e nos dispensou.

Saí da sala antes dele, sem nem olhar para trás. Eu queria correr. Me esconder. Fingir que nada daquilo estava acontecendo.

Mas ele veio atrás. Claro que veio.

— Giulia — chamou, firme. — Vamos almoçar.

— O quê?

— Um almoço. Não mordo. Ainda.

— Eu não almoço com desconhecidos.

Ele sorriu. Cínico.

— Em dois dias, serei seu marido. Acho que isso me tira da categoria de “desconhecido”.

— Isso é um absurdo!

— Eu sei — ele respondeu. — Mas é o que é.

Fiquei em silêncio por um momento. Ele estava mesmo levando aquilo até o fim. Ele ia me arrastar para um casamento, e ninguém ia impedi-lo. Nem a clínica. Nem a polícia. Ninguém.

— Eu não vou — respondi, firme.

— Então eu passo para te buscar em casa.

E foi embora. Como se tivesse encerrado um simples café com um conhecido.

E eu fiquei ali, parada na calçada da clínica, segurando o pendrive do meu bebê, o coração acelerado, e uma certeza queimando no peito.

Ele não era um delírio.

Ele era real.

E agora... ele era meu pesadelo.

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Comments

Sonia Bezerra

Sonia Bezerra

Não está terminado,Zé eu tivesse notado tinha esperado termina.

2025-04-14

0

Marli Batista

Marli Batista

Oh meu Deus que situação 😔😔😔😔

2025-04-14

0

Dulce Gama

Dulce Gama

lourenzo toma cuidado com Geovane e a filha dele eles vão aprontar com a Júlia ❤️❤️❤️❤️❤️👍👍👍👍👍🎁🎁🎁🎁🎁🌹🌹🌹🌹🌹

2025-04-21

0

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