ASTOLPHRRYA

Prólogo – Entre o Fim e o Começo

Há um instante de silêncio entre a morte e o despertar.

Um vazio suspenso no tempo.

É ali, entre o último suspiro e o primeiro pensamento, que a alma se pergunta:

"E se eu ainda estivesse vivo?"

Este capítulo não começa com heróis em glória, nem com monstros à espreita.

Começa com um som.

Um bip.

Como o eco de uma vida que deveria ter acabado.

Aqui, o real e o impossível se entrelaçam.

Akira Tsukihara acorda não em seu mundo... mas em algum outro.

Sem cicatrizes. Sem respostas.

Apenas o silêncio — e uma vila estranha, onde o tempo parece andar de forma diferente.

Este capítulo é o ponto onde o leitor começa a escorregar para o desconhecido junto do protagonista.

Não há certezas, apenas perguntas.

E, a cada página, o som do mundo antigo se apaga... dando lugar ao novo.

Mas cuidado.

Nem tudo o que parece acolhedor é seguro.

E, às vezes, o verdadeiro perigo se esconde nas noites calmas.

Nos passos que não deveriam ecoar.

Nos nomes que ninguém conhece

boa leitura.

CAPÍTULO 2: ASTOLPHRRYA

Bip... bip... bip...

Um som agudo rompia o silêncio, repetitivo e distante, como um eco vindo de outro mundo.

Akira abriu os olhos com dificuldade. Tudo estava embaçado, a luz dançava pelas bordas da visão. Tentou se mover, mas o corpo não obedecia. Sentia-se pesado, como se tivesse atravessado um abismo.

Bip... bip...

— "Estou... em um hospital?" — foi o primeiro pensamento que surgiu. Mas algo estava errado.

Não havia máquinas. Nenhum visor. Nenhum cabo preso ao corpo.

A única coisa ao redor era uma pequena cama de madeira, colchas rústicas e paredes de pedra. Pela janela, entrava uma brisa leve, carregada com o cheiro de terra molhada, flores silvestres e... sons de animais — bois, cavalos.

E, mesmo assim, o som continuava.

Bip...

E então, parou.

A mente de Akira girava em espiral. Imagens voltavam em flashes: o assalto, o grito da mulher, o impacto, o tiro... a dor. Ele se lembrava de tudo com nitidez.

A porta rangeu. Alguém entrou.

Uma jovem.

Cabelos loiros e longos, presos por uma fita simples. Suas roupas eram feitas de tecido cru, mas limpas e bem cuidadas. Havia serenidade em seu olhar. Aproximou-se, observando-o com curiosidade.

— Você... acordou — disse ela com voz leve, expressão neutra.

Akira tentou se sentar, mas uma pontada aguda na cabeça o fez recuar.

— Tenha calma. Você estava com febre e acabou de acordar — ela se aproximou devagar, colocando um pano úmido sobre sua testa.

Ele a observou, confuso.

— Onde eu estou...? Eu... pensei que tivesse morrido.

— Às vezes, a sensação é essa... em Astolphrrya.

Silêncio.

— Astolphrrya...? O que está acontecendo?

— você parece confuso. Encontrei você caído num beco da cidade. Tentei acordá-lo, mas não respondia.

Akira olhou em volta, sentindo que algo não se encaixava. Nada ali parecia moderno. Nenhum sinal de tecnologia. Nenhuma pista de que ainda estivesse no mesmo mundo.

— Eu não conheço esse lugar... nem esse nome... — murmurou. — e Quem é você?

— Estamos na nação de Astolphirrya. E eu me chamo Colete. Se não se importar, posso te fazer uma pergunta?

Akira assentiu, mesmo com tudo parecendo absurdo.

— De onde você é? Nunca vi você por aqui, nem na vila, nem na cidade.

— Eu... sou de nova York.

Colete franziu levemente o cenho.

— Não conheço esse lugar... — disse, pensativa. Observou-o em silêncio por alguns segundos, como se processasse aquilo.

De repente, Akira sentiu um cheiro estranho no ar.

— Você está sentindo isso? parece que tem algo queimado...

Colete ergueu o rosto, farejando.

— Ah, não... — murmurou, e se levantou de repente. — Fique aqui e descanse. Sua febre ainda está alta.

Saiu rapidamente, sem esperar resposta.

— Isso é um sonho...? — murmurou Akira para si mesmo. — Eu morri... tenho certeza que morri.

Levou a mão ao local onde fora atingido, mas não havia nada. Nenhum ferimento. Nenhuma cicatriz.

Ficou ali, sozinho, com o eco do bip ainda pairando na mente como uma lembrança do que aconteceu.

— Não pode ser... Mas eu... Astolphirrya? Nunca ouvi esse nome antes... e ela também não conhece o lugar de onde vim...

O cansaço o venceu. Seus olhos pesavam como se puxados por correntes invisíveis.

— Acho que... vou descansar mais um pouco...

Akira adormeceu. Um sono pesado, como se tivesse atravessado mundos.

 

Algum tempo depois...

O som da faca cortando legumes ecoava repetidamente na pequena cozinha. Era quase hipnótico. Colete estava concentrada, preparando algo que exalava um cheiro simples, mas acolhedor. Seus movimentos eram calmos, como parte de uma rotina serena.

Depois de alimentar os animais no quintal — algumas galinhas, um porquinho e um cão de pelagem grossa que a seguia como sombra — ela voltou para dentro.

E lá estava ele.

De pé, parado à entrada da cozinha, como se guiado pelo cheiro do almoço. Akira e Colete se entreolharam por um momento em silêncio.

— Pode se sentar — disse ela, com um leve sorriso.

Na cozinha, a luz do sol atravessava a janela, aquecendo a mesa de madeira. Colete serviu um prato diante dele: arroz, carne cozida e legumes frescos, tudo com aparência simples, porém cuidadosamente arrumado.

— Já está se sentindo melhor, Akira? — perguntou, sentando à sua frente.

Ele encarou a comida por alguns segundos. Estranhamente familiar... e, ao mesmo tempo, completamente diferente.

— Ah... sim. Acho que sim. Mas... — hesitou, olhando ao redor, tentando compreender tudo. — Ainda estou meio confuso.

Colete inclinou a cabeça com gentileza.

— Tem algo incomodando você? Talvez eu tenha colocado comida demais no seu prato?

Akira soltou um riso fraco, mais por nervosismo do que por humor.

— Não é isso. É que... como você sabe meu nome? Eu não me lembro de ter dito.

Ela parou por um instante. Seus olhos se fixaram nele com suavidade.

— Eu fui... abençoada — respondeu com naturalidade. — Quando olho nos olhos de alguém, sei o nome dela. E mais... consigo sentir se é uma pessoa boa ou ruim, pela energia que carrega. Foi por isso que ajudei você.

— Abençoada...? — repetiu Akira, franzindo a testa. — Isso é... estranho. Que tipo de bênção é essa?

Colete apoiou os cotovelos sobre a mesa.

— Não sei explicar direito... é um dom natural. Todas as pessoas nascem com algum tipo de dom aqui.

— Você fala como se fosse algo normal...

— E é — respondeu com simplicidade.

O silêncio voltou a crescer entre eles. Mas não era desconfortável. Era um silêncio cheio de perguntas não feitas.

— Você não vai comer? — perguntou ela, olhando para ele.

— Ah... sim — respondeu Akira, pegando os talheres com certa hesitação.

Já anoitecia. O sol descia lentamente no horizonte, tingindo os céus com tons de laranja. As pessoas do vilarejo fechavam suas portas, como se a noite trouxesse consigo algo que não deveria ser visto. Até os animais das fazendas permaneciam quietos, recolhidos em seus abrigos.

— Parece que já está na hora... — sussurrou Colete, quase sem mover os lábios. — Por favor, entre. Você pode passar mais algumas noites aqui até se estabilizar... E, se ouvir sons estranhos, não se preocupe.

— Sons estranhos?

Colete levou Akira até o quarto onde ele havia despertado.

— Pode dormir aqui — disse ela, cada palavra baixa como um sussurro.

Akira não respondeu; apenas assentiu em silêncio, aceitando sua gentileza.

A noite parecia comum, mas Akira não conseguia dormir. Foi então que passos metálicos e secos soaram ao longe naquela noite silenciosa.

— Será que era disso que ela estava falando?...

Ele soltou um suspiro sutil.

— Qual é a dessa Colete? A expressão dela é sempre a mesma... E ainda por cima permitiu que um completo estranho dormisse aqui.

Os sons metálicos se aproximaram. Rangidos se seguiram, como se uma máquina de ferro se movesse pelo vilarejo. Pouco a pouco, os barulhos foram se afastando, até sumirem por completo.

— Acho melhor eu dormir agora... Afinal de contas, o que está acontecendo?

 

Na manhã seguinte, Akira acordou com o som distante de animais. O mesmo som repetitivo que ouvira antes de despertar no dia anterior. Mas, desta vez, cessou mais rápido — como um eco antigo perdendo força.

— Que estranho... Achei que... — Ele olhou ao redor. Era o mesmo quarto de antes. — Então não foi um sonho... Será que eu... Não. Isso é loucura. Ontem foi real.

Guiado pelo som familiar de faca cortando legumes, Akira seguiu até a cozinha. Colete estava lá, preparando o almoço bem cedo.

— Bom dia.

— Bom dia. Sente-se, só me dê um minuto e já vou servir seu café da manhã — disse ela, parando o que fazia. — Deve estar com muita fome. Você quase não comeu ontem.

— Ah... obrigado. Mas por que está me tratando tão bem assim? Sou um completo estranho e... eu não fiz nada por você — Akira disse, um pouco sem jeito.

— Não tem problema. Você não é uma pessoa ruim. E, normalmente, eu não recebo convidados...

Principalmente tão especiais.

— Especial...? — repetiu ele, surpreso.

— Como você mesmo disse ontem, você não é deste mundo. Não veio de fora da barreira, e também não parece ser um Reivindicar.

Akira, ainda confuso, franziu a testa.

— Do que ela tá falando? — murmurou para si mesmo.

Enquanto servia o café da manhã, Colete continuou:

— No passado, pessoas de fora surgiam com memórias de vidas passadas. Alguns diziam ter sido reis. Outros, heróis de mundos com tecnologias... embora eu nem saiba o que isso significa.

As palavras ecoaram na mente de Akira. Ele ficou em silêncio, perdido, como se a voz de Colete ficasse distante, abafada, como se viesse debaixo d’água.

— Akira... — chamou ela, preocupada.

— Hã?

— Está tudo bem com você? — Colete encostou a mão em sua testa. — Você ficou pálido de repente...

— Ah... eu estou bem...

— Você está com febre. Será que foi algo que comeu ontem? Eu vou levá-lo até a Meilin. Ela pode ajudar a baixar sua temperatura.

— Não precisa — protestou Akira. — Eu estou bem, eu...

Mas seu corpo vacilou, e uma dor aguda percorreu sua cabeça.

— Essa não... — disse Colete, com a expressão séria. — Eu vou levá-lo até ela.

O caminho até a casa de Meilin era estreito. A trilha serpenteava entre árvores altas, cujos galhos formavam um dossel de folhas verdes que filtravam a luz do sol. Akira se apoiava em Colete — algo estava errado. Sua visão turvava, e palavras estranhas sussurravam em sua mente como o vento entre as árvores.

— Por favor, não durma agora — implorou Colete, segurando-o firme. — Estamos quase chegando.

A casa da curandeira ficava um pouco afastada da vila. Era cercada por uma cerca feita de galhos trançados com fitas. Pequenos vasos de pedra com flores azuis exalavam um perfume doce, quase enjoativo.

Ao empurrar o portão, um sino preso à entrada soou com um tilintar suave e misterioso.

Sentada sobre uma almofada estava Meilin — cabelos longos e prateados, olhos verdes como folhas frescas.

Ela não ficou surpresa com a visita. Afinal, fora ela quem cuidara de Akira horas antes de ele acordar.

— Ele precisa de ajuda — disse Colete, apoiando Akira nos ombros.

— Deite-o ali — instruiu Meilin, com voz firme e suave.

Colete ajudou Akira a se deitar. Meilin lhe ofereceu uma bebida de cor âmbar e aroma amargo.

— Essa febre voltou de novo... — murmurou Meilin, colocando a mão sobre a testa dele.

Akira tentou perguntar algo, mas os sussurros voltaram. Um zumbido se formou logo depois, e sua mente mergulhou num silêncio profundo. Ele respirou aliviado, como se tivesse sido puxado subitamente para o sono.

— Você pode esperar lá fora — disse Meilin a Colete.

Do lado de fora, Colete esperava pacientemente. Sua expressão serena escondia uma leve preocupação nos olhos.

Pouco tempo depois, Akira saiu, respirando com mais facilidade.

— Como se sente agora? — perguntou Colete.

— Bem melhor... Me desculpe por dar tanto trabalho.

— Já está tudo certo com ele — disse Meilin, aproximando-se. — Mas, antes de irem embora, quero que beba isso daqui a quatro horas.

Ela entregou a Akira um pequeno frasco com o mesmo líquido de antes.

— Daqui a quatro horas — repetiu ele, hesitante. — Aí eu não sei... Isso não tem um gosto muito bom.

— Não é pra ter gosto bom — respondeu Meilin. — É pra te fazer melhorar.

— Acho que cheguei em boa hora — disse uma voz firme, chamando a atenção de todos.

Meilin ergueu os olhos e sorriu. — Alexsander...

O homem se aproximou com um aceno descontraído. Tinha pele morena, uma armadura reluzente e um espadão nas costas.

— Olá a todos. Olha só quem finalmente acordou!.

— Quem é esse...? — murmurou Akira, curioso.

Colete se virou para ele.

— Ele é Alexsander, um aventureiro que me ajudou a te trazer para a vila.

Alexsander estendeu a mão pegando a de Akira.

— Muito prazer em conhecê-lo. Cara, vou te contar: você não acordava por nada! Parecia até um bêbado da cidade. Mas e aí, como se sente?

— Me sinto bem melhor agora. Mas... espera, ela disse que você e um aventureiro?

Alexsander deu uma risada animada.

— Isso mesmo! Sou um aventureiro... Embora, ultimamente, eu não tenha me aventurado tanto e que não tem tido muitas missões assim.

Colete voltou-se para Akira.

— Por que você não se torna um aventureiro também? É uma forma de recomeçar... e ainda ganha algum dinheiro.

Akira coçou a nuca.

— Não parece uma má ideia. Mas como eu me torno um aventureiro?

Alexsander deu uma risada e bateu nas costas de Akira.

— Haha! Cola comigo que eu te ajudo com isso.

Meilin então olhou para Alexandre com curiosidade.

— Espera... o que veio fazer aqui?

— Vim trazer as ervas que você pediu. Lembra? Colhi na montanha, no ponto onde o sol bate mais forte. Por sorte, eu ando bastante por lá e lembrei de colhe–las — disse ele, entregando um pequeno saco de tecido a ela.

— Bom, agora preciso ir. Parece que os porcos selvagens estão sendo caçados de novo pelo pessoal da cidade.

Ele acenou para todos e partiu com confiança.

Meilin suspirou.

— Bom, acho que vou entrar. — Ela se virou para Colete. — Lembre ele de tomar o remédio daqui a quatro horas.

Colete apenas assentiu, mantendo a mesma expressão serena de sempre.

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